Opinião

Trilhando caminhos do Sul com Mário Juruna

Na ‘Semana dos Povos Indígenas’ há muito a refletir em poucos dias. Ainda bem que temos o ano inteiro para nos aproximarmos e reconhecermos os conhecimentos ancestrais dos povos originários. Digo isso porque podem nos orientar (hum, não seria encorajar?) a dar um ‘giro decolonial’, isto é, um repensar à formas de pensamento da modernidade/colonialidade para que possamos prosseguir nos caminhos do Sul. Estar no Sul, em estado de reconhecimento da diversidade epistêmica além do capitalismo global.


Voltando à ‘Semana dos Povos Indígenas’, com Mário Juruna e seu gravador. Ultimamente, é grande o número de políticos flagrados em gravações comprometedoras, situação que vem se tornando corriqueira no cenário brasileiro, quando, por descuido, passam a ser envolvidos em gravações utilizadas como prova contra eles. Gravar conversas de políticos, ainda que com equipamentos ocultados, faz lembrar Mário Juruna (1943-2002), que aprendeu a falar a língua portuguesa aos 18 anos de idade.  Ao contrário dos tempos atuais, o gravador de Juruna, adquirido em Cuiabá, sempre estava à vista do entrevistado. Nunca às escondidas.

Nascido na aldeia Namakura, localizada na então denominada Reserva São Marcos, Mato Grosso, o líder da etnia A’uwe ou Xavante filiou-se ao Partido Democrático Trabalhista, tornando-se o primeiro deputado federal indígena no Brasil em 1982, com 31 mil votos dos eleitores do Rio de Janeiro. Mas, foi na década de 1970, em Brasília, antes mesmo de se tornar deputado federal, de gravador na mão, que percorreu gabinetes da Fundação Nacional do Índio e do Ministério do Interior a reivindicar a demarcação de terras indígenas. Sobre seu hábito de gravar falas, alegava que era ‘para registrar tudo o que o branco diz’ e, assim, comprovar que as autoridades, quase sempre, não se preocupavam em cumprir com a palavra. Em entrevista ao Pasquim, Mário Juruna disse ter comprado o ‘gravador porque branco faz muita promessa. Depois esquece tudo’. Seu gravador passou a ser um comprovador de mentiras. O resultado das urnas, que percorreu o Brasil e o mundo, conduziu Juruna ao Planalto e, depois de muita luta, criou a Comissão Permanente do Índio no Congresso Nacional, o que deu à política indigenista um reconhecimento oficial dentro da casa legislativa.

Anna Maria Ribeiro Costa

About Author

Anna é doutora em História, etnógrafa e filatelista e semanalmente escreve a coluna Terra Brasilis no Circuito Mato Grosso.

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