Cultura

Redeiras da Família Lemes são mestres da cultura homenageadas em filme e exposição

A arte de produzir redes, tradição entre as mulheres da Família Lemes, que vivem em Limpo Grande, em Várzea Grande, será contada em filme e exposição. A beleza e o colorido das redes feitas de forma totalmente artesanal em tear vertical despertou o apreço e a curiosidade da cineasta Tati Mendes. Ela homenageia cinco mulheres que há mais de 50 anos se dedicam a esta arte no projeto “Redeiras – Tecendo cultura com arte e tradição”, contemplado no Edital Conexão Mestres da Cultura – Marília Beatriz de Figueiredo Leite, realizado pela Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer (Secel-MT).

A partir de 20 de abril (terça-feira), o público poderá conhecer um pouco da história das homenageadas e da produção das redes, em uma exposição de fotos feitas pela própria Tati Mendes.  A exposição instalada na entrada do Sesc Arsenal, em Cuiabá, seguirá depois para o Limpo Grande. O filme, com data de estreia marcada para 20 de maio, irá trazer em detalhes todo o processo de produção das redes. O filme será exibido no Sesc Arsenal e também em Limpo Grande.

As homenageadas

Tati Mendes conheceu a redeira Eva Lemes de França, quando produziu a série “O Pantanal e Outros Bichos”, no qual reuniram diversas artes manuais ainda produzidas na região entre Cuiabá e o Pantanal. Na ocasião, ela encomendou duas redes para compor o cenário das gravações. “Assim conheci Eva e aos poucos fui conhecendo e me apaixonando pela história de sua família”, conta Tati.

 

A matriarca da família, Francisca Maria de França, conhecida como Dona Chiquinha do Limpo Grande, aprendeu a arte do tear com uma de suas tias. Eva e as irmãs Gonçalina Lemes da Silva, Dulce Lemes Moreira, Lourdes Lemes de França, e Edina Lemes de França, contam que foi por observarem atentamente o trabalho da mãe e na tentativa e erro, é que aprenderam a tecer.

Elas começaram fazendo redinhas para as bonecas e mais tarde fizeram disso um ofício e passaram a contribuir com a renda familiar quando vendiam as redes, assim como a maioria das redeiras do Limpo Grande. A comunidade tem a tecelagem como uma das principais fontes de renda.

“Conviver com a beleza dos motivos e a sensibilidade das combinações de cores, num movimento contínuo e repetitivo para ver o resultado parece uma tarefa simples e depois de alguns anos, até corriqueira, mas é no convívio e na partilha de espaços, histórias e gráficos, que estas mulheres se desenham, criam filhos, casam, sustentam suas famílias. Percebe-se que elas falam por meio da arte”, enaltece Tati Mendes.

Tradição

Na comunidade Limpo Grande, as redes são feitas por mulheres há mais de quatro gerações. A produção da rede cuiabana conserva a técnica do tear vertical, herança da cultura indígena.

“Manter a tradição é a ordem dessas mulheres, por capricho ou necessidade, não importa. O que importa é o quanto essa resistência representa para a cultura de um povo, o quanto nos ensina de resiliência, o quanto valoriza sua comunidade, o quanto contribui para o fortalecimento do patrimônio cultural imaterial do Estado de Mato Grosso”, ressalta Tati Mendes.

A arte de fabricar redes é atribuída aos índios Guanás (etnia Chané-Guaná), que inicialmente usavam fibras de tucum para sua confecção e segundo historiadores, foram as mulheres dos colonos que passaram a usar o algodão como fibra, desfiando-o e fazendo as linhas com as mãos.

Mais tarde, passaram a tingí-los, com tintas naturais e foi certamente pela herança portuguesa que os motivos, desenhos, varandas e franjas foram integrados, criando assim, a arte das magníficas redes que se diferenciam pela urdidura em teares verticais.

Os motivos que são lavrados replicam flores e animais do Pantanal, mas a contagem e a distribuição das cores remetem aos pontos usados na técnica do bordado do ponto de cruz, o que confirma a intersecção portuguesa na arte das redes cuiabanas.

Novelar, urdir, tecer, passar o liço, lavrar, trançar. Essas são algumas das expressões que também encantaram a cineasta, que relata como as redeiras usam esse vocabulário todo próprio, para realizar cada uma das etapas do trabalho.

“É uma arte impressionante não apenas pela beleza, mas pela destreza, pela paciência e pela atenção que toma da artesã copiar os gráficos e transpô-los para o tear e uma tradição que precisa ser vista, estimulada e mantida, porque é um trabalho de valor simbólico ímpar”, conclui Tati Mendes.

 

Redação

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