A ONG britânica Reprieve acredita que o Brasil pode ajudar o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, a cumprir uma de suas principais promessas de campanha, feitas ainda na disputa por seu primeiro mandato (2008-12): fechar a notória prisão de Guantánamo, usada pelas autoridades americanas desde 2002 para conter suspeitos de terrorismo e alvo de intensas campanhas de entidades de defesa dos direitos humanos, por conta de evidências de tortura e outros maus-tratos.
Para isso, Brasília teria que aceitar receber parte dos 52 prisioneiros já inocentados pelas autoridades americanas – no total, 116 prisioneiros ainda estão em Guantánamo.
A Reprieve encabeça um grupo de entidades que enviou recentemente uma carta a Obama pedindo que tocasse no assunto com a presidente Dilma Rousseff durante sua visita aos Estados Unidos.
Oficialmente, a posição brasileira tem sido de não aceitar detentos, mas ONGs como a Reprieve acreditam que a reaproximação entre Brasília e Washington, marcada pela visita de Dilma, possa marcar uma mudança de pensamento.
"Estamos falando de pessoas que simplesmente querem tentar reencontrar algum tipo de normalidade, começar uma vida nova. E que continuam presas mesmo sem terem cometido crime algum", afirma a advogada americana Corrie Crider, uma das diretoras da Reprieve e que tem 10 clientes na notória prisão.
Greve de fome
A inocência de 52 dos 116 prisioneiros de Guantánamo foi estabelecida após um processo que exigiu pareceres unânimes das seis agências federais de segurança do país, mas tanto autoridades americanas quanto ONGs consideram que os prisioneiros, a maioria deles de nacionalidade iemenita e síria, correm risco de vida se repatriados para seus países de origem.
Diversos países do mundo já receberam detentos inocentados, mas na América do Sul apenas o Uruguai aceitou dar abrigo.
Embora Guantánamo seja um problema criado pelas autoridades americanas (e ela cita especificamente a administração do ex-presidente George W. Bush, sob cujas ordens o centro de detenção foi criado), sua resolução é de interesse mundial.
"O Brasil não tem culpa pela existência de Guantánamo, mas além de poder ajudar por uma questão de unanimidade, o país tem de pensar em como a existência de Guantánamo é usada para alimentar o extremismo ao redor do mundo", explicou Crider, em entrevista por telefone à BBC Brasil.
"Além disso, o Brasil tem recebido refugiados do Haiti e de outros países nos últimos anos. Não estamos falando de uma grande quantidade de ex-detentos, mas sim de um grupo de indivíduos que passou por coisas horríveis, foi inocentado e ainda segue no cárcere".
Ela cita o caso de Samir Mukbel, um iemenita preso em Guantánamo há 12 anos e que desde 2013 faz greve de fome.
"Se o Uruguai, com território e população bem menores que o Brasil, pode aceitar detentos, por que não o Brasil? Seria um gesto humanitário e bastante simbólico", completa a advogada.
Crider diz não estar preocupada com as recentes manifestações de intolerância a imigrantes e refugiados no Brasil, como os protestos contra vinda de médicos cubanos e as críticas à chegada dos haitianos em mídias sociais. Advogada confia no trabalho que a Reprieve realiza com apoio da ONU para realocar ex-detentos, e que inclui acompanhamento psicológico.
Fonte: BBC BRASIL