Essa mania de escrever parece ginástica. Depois que a gente embala vai ladeira abaixo. Mas quando dá uma parada técnica, para sair da inércia é um sufoco.
Várias razões me forçam a interromper a meta quinzenal. Incluindo, o que não foi o caso nessa parada forçada, a preguiça pura e simples.
Só pego no tranco pra descer o barranco. Falta de assunto? Ao contrário. Fico perdida nas inúmeras possibilidades que garimpei no período silencioso.
Vou acumulando numa gavetinha mental coisas que vejo, observo e sinto. Acontecimentos do cotidiano, fatos da vida e do mundo.
Quando arrumo tempo e disposição para botar as ideias no papel fico mais atrapalhada que a boneca Emília, personagem de Monteiro Lobato.
No primeiro livro ambientado no Sítio do Pica-pau Amarelo, “A Menina do Narizinho Arrebitado”, quando a boneca de pano feita por Tia Anastácia desanda a falar, após tomar uma pílula falante do Dr. Caramujo no Reino das Águas Claras, é um atropelo.
Uma mistureba de palavras e tolices daquela que vai ser uma das maiores “ideieiras” das aventuras infantis que embalaram gerações. Primeiro, nos livros. Depois, nos programas infantis das tardes ou manhãs na televisão.
Quem não conhece o Sítio do Pica-Pau Amarelo e seus personagens não sabe o que está perdendo!
Não estou dizendo, quer dizer, escrevendo que não é fácil sair da inércia criativa?
É uma ginástica de paciência puxar o freio de mão e não sair atropelando as linhas de forma desordenada, sem medidas ou critérios além da manha de deixar a caneta tentar escorregar pelo papel. Indo atrás de diálogos que mantenho com o Eu pensante que me habita, puxando os fios que bailam de dentro do compartimento aberto na minha (fértil) imaginação de geminiana.
E aí, vem mais um ponto em comum com a ginástica, não a mental, mas a física. Sabe quando, depois de um tempo parada, você volta a fazer exercício no tranco, sem medir os movimentos e se esquece que seus músculos não correspondem ao seu entusiasmo?
A sensação no dia seguinte é de que passou trator desgovernado sobre seu corpo. Todas as fibras e músculos reclamam. Especialmente quando você quer iniciar um movimento e… sair da inércia.
Já experimentou revisar um texto escrito após jogar um WD na fechadura, desempenar a tampa e abrir a caixinha de assuntos acumulados? Lé não bate com Cré que deixou penduradas muitas ideias lelés.
E dói a cada trecho da palavra escrita saber que ali, naquela barafunda com aparente falta de nexo, estão contidas tantas sensações, inspirações e reflexões mal distribuídas e quase perdidas no limbo da memória.
As que, em algum momento da pausa entre as crônicas devidas e não pagas, poderiam render relatos e textos que você, caro leitor, teria a oportunidade desfrutar. E, neles, reconhecer a capacidade da autora que lhe escreve tem de dar voltas em suas quase sempre inconstantes linhas…
Para fechar, mais uma comparação nesse exercício literário após a abertura da caixa quase de Pandora atulhada de ideias imaginantes: minha gavetinha mental é tipo bananeira, que está sempre dando cacho.
No começo só vemos aquele enorme coração. Mas, na medida em que se desenvolve, a gente descobre que o melhor está na penca repleta de frutas aguardando o tempo certo de amadurecer.
Enquanto espero o tempo certo de colher os frutos vou continuar editando as imagens do carnaval 2025.
Como todos que gostam da folia, acompanho, cheia de curiosidade, os anúncios dos enredos das escolas de samba do ano que vem, repletos de homenagens a diversas personalidades.
Criteriosamente vou mexendo o doce das fotos que registrei em março e estou agregando ao acervo carnavalerio.com. observando os frutos, agora bebês, da nova penca de bananas amadurecerem no pé.
PS: Ganhei de presente um texto lindo de Jejê do Quilombo da Lixeira, do Pasquim Cuiabano João Guato, intitulado “Valeria del Cueto, a Rainha das memórias do Samba”. Está no link para quem quiser saber o estímulo que recebi para, mais uma vez, sair da inércia.
Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Das séries “Parador Cuiabano” e “É carnaval” do SEM FIM…
Texto e foto: Valéria del Cueto