Dona de uma série de obras de linhas de transmissão de energia com atraso de mais de um ano e mergulhada em um processo de recuperação extrajudicial, a companhia espanhola Isolux tenta fechar a venda de seus ativos no Brasil com uma grande companhia de infraestrutura da Espanha, o Grupo Ferrovial.
A Isolux garante que a negociação, que teve início no último trimestre do ano passado, está em fase avançada de análise financeira e operacional (due dilligence), mas a empresa não conseguiu convencer a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de que a transação realmente vai para frente. Depois de aguardar por meses uma solução concreta, a Aneel tem defendido o cancelamento do leilão vencido pela Isolux e a retomada dos projetos, para que sejam novamente licitados em um leilão de transmissão ao longo deste ano.
Em 2015, a Isolux assumiu o compromisso de construir 686 quilômetros de linhas de transmissão em cidades do Pará e Rondônia, além de sete subestações de energia. Nada foi feito e, até hoje, a empresa sequer apresentou as “garantias de fiel cumprimento” das obras, documento indispensável para que os contratos sejam assinados. Ao todo, os espanhóis têm cinco contratos com obras atrasadas em relação ao cronograma. Um deles, que prevê a construção de uma linha de transmissão entre Taubaté (SP) e Nova Iguaçu (RJ), acumula mais de 1.200 dias de atraso.
Solução de mercado. A Isolux e o Grupo Ferrovial não quiseram comentar o assunto. O Estado apurou que as empresas seguem em negociação. No fim de dezembro, os grupos informaram à Aneel que buscam uma “solução de mercado” para os projetos de transmissão. Representantes da Ferrovial tiveram um encontro com agentes da agência para tratar do assunto, garantiram que já têm acordo com um agente financeiro e que estavam em contato com o BNDES para tentar preservar as condições de financiamento do contrato original.
Na Aneel, o entendimento é de que as empresas não apresentaram mais do que um pacote de promessas, sem qualquer sinal concreto de que a transação vai se concretizar. Em comunicado à agência, a Isolux afirmou que não há “motivo para a Aneel ignorar a iminência de medida passível de atender o interesse público”, porque a venda dos contratos para outra companhia “se apresenta como a opção mais célere e menos custosa”.
Quando a Isolux venceu o leilão de 2015, com investimentos estimados em R$ 1,5 bilhão, não houve outro interessado na oferta das linhas de transmissão, o que impede o governo de chamar o segundo colocado na licitação, obrigando a Aneel a fazer uma nova oferta dos projetos.
Justificativa. Ao discorrer sobre as dificuldades que enfrenta no País para contratar os seguros de seus projetos, papéis que o governo pode executar caso termos do contrato não sejam cumpridos, a Isolux culpou o imbróglio financeiro vivido pela espanhola Abengoa no País.
“A Isolux enfrentou dificuldades em obter garantias de fiel cumprimento no mercado de seguros para o segmento de transmissão, face ao pedido de recuperação judicial do Grupo Abengoa”, declarou a empresa à Aneel, acrescentando depois que essas dificuldades também se devem ao processo de recuperação extrajudicial da própria Isolux Engenharia, braço do Grupo Isolux. A Abengoa não comenta sua situação no País.
A empresa canadense Brookfield é uma das companhias que já chegaram a avaliar a aquisição dos ativos da Isolux no Brasil, mas paralisou as negociações no fim do ano passado.
Os projetos espanhóis de transmissão se tornaram um pesadelo para o governo brasileiro, que tem procurado alternativas para driblar os atrasos nas obras, principalmente aqueles de grande porte, como as da Abengoa. A empresa tem hoje 15 contratos de concessão firmados com o governo. Todos eles estão em processo de caducidade e sem previsão de serem concluídos. Desses contratos, nove já acumulam mais de 1.000 dias de atraso.
Na carteira de projetos da Abengoa está o chamado “linhão pré-Belo Monte”, projeto de 1.854 quilômetros de extensão, estimado em R$ 1,3 bilhão e que foi vencido no fim de 2012 pela empresa espanhola. A fiscalização da Aneel aponta que o projeto, que tinha de ser concluído em fevereiro deste ano, não tem mais uma data prevista para ser concluída. Já são mais de 1.100 dias de atraso em relação ao cronograma previsto em contrato.
Sem uma solução fácil para a situação, o governo também torce por uma “solução de mercado” para os projetos da Abengoa. Em novembro do ano passado, conforme revelou o Estado, a empresa Equatorial Energia e o banco BTG Pactual se uniram para comprar os ativos da empresa. O valor global oferecido pelos ativos, a preços de 2015, era de pouco mais de R$ 1 bilhão. À época, a Equatorial declarou que “está sempre atenta às oportunidades de mercado” e o BTG Pactual não comentou o assunto. Os ativos seguem nas mãos da Abengoa.
Fonte: Estadão