Como é público e notório, o acúmulo das funções de cobrador e motorista na pessoa deste último acarreta graves consequências, não somente para a saúde do trabalhador, por conta do estresse a que é exposto, mas do perigo decorrente, porque não é possível dirigir e cobrar ao mesmo tempo.
A dupla função de motorista e cobrador acarreta problemas que ultrapassam o mero interesse individual e patrimonial do motorista e do cobrador, porquanto, como também é público e notório, as doenças e acidentes de trabalho trazem consequências para os trabalhadores e para a sociedade, haja vista, no caso dos ônibus, que transeuntes e outros motoristas são atingidos pelos acidentes de trânsito que ocorrem no dia a dia, alguns gravíssimos, como todos sabem. No artigo Os riscos à saúde do motorista profissional, Dirceu Rodrigues Alves Júnior (médico e diretor da Abramet – Associação Brasileira de Medicina de Tráfego) elenca algumas doenças que a profissão de motorista pode acarretar, como as elencadas a seguir, pelos múltiplos riscos a que está exposto o profissional que dirige ônibus:
O ruído produzido pela máquina tem como consequência zumbido, perda auditiva e surdez. A vibração de corpo inteiro decorrente de efeitos dinâmicos, ajustes, falta de manutenção, vias com problemas estruturais, pode produzir perda do equilíbrio, lentidão de reflexos, taquicardia, vasoconstricção, alterações na liberação de enzimas e hormônios, provoca dor localizada e difusa, cefaleia, mal-estar, tonturas, alterações da frequência e amplitude respiratória, falta de concentração, distúrbio visual e gastrintestinal, cinetose, degeneração de tecido neuromuscular e articular, desmineralização óssea e alterações cardiocirculatórias. As temperaturas elevadas e pouco toleradas pelo organismo provocam fadiga, perdas líquidas e de sais minerais e levam a distúrbios cardiocirculatórios, irritabilidade, torpor, sonolência, perda da concentração e reflexos etc. A exposição aos gases, vapores e poeiras concorre para o surgimento de doenças respiratórias, circulatórias, da pele, dos olhos, chegando à insuficiência respiratória e ao câncer. A postura, os movimentos repetitivos e o tempo de exposição nessa atividade concorre para o aparecimento das doenças osteoarticulares e neuromusculares, além dos riscos de acidentes de trânsito. Acresça-se a isso o acúmulo de funções de cobrador e motorista!
A máquina fixa dentro da fábrica é perigosa, como sabemos, mas pode ser controlada com sensores que a desligam automaticamente, prevenindo acidentes, enquanto que um veículo, um ônibus, por ser uma máquina móvel sobre rodas e não ter o mesmo controle, apresenta múltiplas preocupações, porque envolvem motoristas, usuários, cargas, condição mecânica, pedestres, violência urbana, tempo de deslocamento, condição da via e muitos outros fatores, ou seja, envolve a sociedade, e não apenas o motorista. A questão, como se vê, é de ordem púbica, porque ultrapassa os meros interesses das partes envolvidas (trabalhadores e empresários).
Cônscios de suas responsabilidades na defesa de todos os trabalhadores da categoria (cobradores e motoristas, sócios e não sócios do sindicato), os sindicatos de rodoviários devem continuar empreendendo esforços para impedir que se concretize a ameaça e pretensão dos empresários de ônibus do Brasil de acabarem com a função de cobrador e passá-la para o motorista, de forma acumulada com a já desgastante função de dirigir ônibus que exerce.
Os sindicatos devem apoiar o Projeto de Lei 2.163/2003-A, já aprovado na Câmara dos Deputados, cujo artigo 1º diz: “É proibido às empresas públicas e/ou privadas, concessionárias de atividades de serviços de transporte coletivo rodoviário exclusivamente urbano e nas regiões metropolitanas, incumbir aos motoristas dos referidos veículos a atribuição, simultânea, de motorista e cobrador de passagens dos referidos transportes coletivos”.
Sobre a dupla função de cobrador e motorista, assim se manifestou o TST:
"As funções de motoristas e trocador são absolutamente distintas, afirmou o relator do recurso na Turma, desembargador convocado Cláudio Couce. No seu entendimento a acumulação dessas funções "importa sobrecarga, superexploração, desemprego dos trocadores e, pior, risco para os passageiros, pois é comum o motorista dirigir e cuidar do troco ao mesmo tempo" (Processo RR-67-15.2012.5.01.0511).
Fonte: Conjur