Economia

Copom eleva Selic em 1,5 ponto, para 7,75%, maior alta desde fim do governo FHC

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou a taxa básica (Selic) em 1,50 ponto percentual, a 7,75% ao ano, nesta quarta-feira (27). No comunicado, a autoridade monetária sinalizou nova elevação de mesma magnitude na próxima reunião, em dezembro, para 9,25% ao ano.

A taxa é a maior em quatro anos, quando atingiu 7,50% em outubro de 2017.

Esta é a maior alta desde dezembro de 2002, fim do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Na ocasião, os juros subiram 3 pontos percentuais -de 22% para 25% ao ano.

O comitê disse considerar o ritmo de 1,5 ponto percentual por reunião adequado para levar a inflação à meta, mas disse que o nível final da taxa deve "avançar ainda mais no território contracionista". Com isso, a autoridade monetária indica que o patamar final da Selic deve ser maior que o esperado, mas sem especificar qual seria.

O Copom afirmou que, "diante da deterioração no balanço de riscos e do aumento de suas projeções, esse ritmo de ajuste é o mais adequado para garantir a convergência da inflação para as metas no horizonte relevante".

"Neste momento, o cenário básico e o balanço de riscos do Copom indicam ser apropriado que o ciclo de aperto monetário avance ainda mais no território contracionista [patamar mais elevado de juros]", ressaltou.

A elevação desta quarta é maior que a indicada pelo BC na reunião anterior, em setembro, quando sinalizou que subiria novamente a Selic em 1 ponto percentual. O presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, e diretores reiteraram em eventos dos quais participaram ao longo das últimas semanas que o plano era manter esse ritmo nas decisões seguintes.

Diante da manobra do governo para driblar o teto de gastos na semana passada, no entanto, o BC teve que mudar a postura para tentar levar a inflação de 2022 e 2023 à meta.

A decisão veio em linha com as projeções do mercado. Na semana passada, economistas revisaram as expectativas para a decisão desta quarta e passaram a esperar uma resposta mais agressiva da autoridade monetária diante da elevação do risco fiscal.

A maior parte dos economistas consultados pela Bloomberg projetava elevação de 1,5 ponto percentual.

As revisões ocorreram após o governo e seus aliados no Congresso inserirem, na última quinta-feira (21), na PEC (proposta de emenda à Constituição) que adia o pagamento de precatórios uma mudança na regra de correção do teto de gastos que, na prática, expande o limite das despesas federais.

A manobra tem como objetivo abrir espaço orçamentário e turbinar o Auxílio Brasil, programa social que vai substituir o Bolsa Família.

O ruído em torno de uma possível mudança de regime fiscal elevou o chamado o prêmio de risco à curva de juros, custo adicionado para cobrir eventuais impactos, e afetou as expectativas para a inflação.

O Copom destacou no texto o peso do risco fiscal nas expectativas de inflação.

"Apesar do desempenho mais positivo das contas públicas, o Comitê avalia que recentes questionamentos em relação ao arcabouço fiscal elevaram o risco de desancoragem das expectativas de inflação, aumentando a assimetria altista no balanço de riscos. Isso implica maior probabilidade de trajetórias para inflação acima do projetado de acordo com o cenário básico", disse.

Segundo o BC, o ritmo de aperto monetário é suficiente para levar a inflação à meta no horizonte relevante, para quando o comitê entende que a política monetária faz efeito. Atualmente, o período engloba 2022 e 2023.

O Copom enfatizou ainda que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar o cumprimento da meta de inflação e "dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária".

Para este ano, há consenso no mercado e no BC de que a inflação deve estourar a meta fixada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional) em 3,75% -com 1,5 ponto percentual de tolerância para cima e para baixo.

De acordo com o relatório Focus do BC desta semana, em que são coletadas projeções do mercado, os economistas consultados revisaram mais uma vez para cima as expectativas para a inflação de 2021, agora para 8,96%, 3,71 pontos percentuais acima do teto da meta. No boletim anterior, as expectativas estavam em 8,69%.

Hoje, o Copom já mira o controle de preços de 2022 e 2023, com metas de 3,5% e 3,25%, respectivamente.

Para 2022, as projeções também aumentaram para 4,40%, ante 4,18% da pesquisa anterior. Para 2023, as estimativas, que seguiam estáveis em 3,25%, aumentaram pela primeira vez, para 3,27%.

As projeções do BC para inflação são de 9,5% para 2021, 4,1% para 2022 e 3,1% para 2023. A análise foi feita com a taxa de juros da pesquisa Focus e taxa de câmbio partindo de US$ 5,60.

De acordo com a pesquisa, a taxa básica deve encerrar este ano em 8,75% e chegar a 9,75% ao longo de 2022, terminando o ano em 9,50%. Em 2023, a expectativa é que a Selic se reduza para 7%.

"Nesse cenário, as projeções para a inflação de preços administrados são de 17,1% para 2021, 5,2% para 2022 e 5,1% para 2023. Adota-se a hipótese de bandeiras tarifárias 'escassez hídrica' em dezembro de 2021 e 'vermelha patamar 2' em dezembro de 2022 e dezembro de 2023", disse o comunicado.
O comitê reiterou que, em seu cenário básico para a inflação, permanecem fatores de risco tanto para cima e quanto para baixo.

"Por um lado, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento recente nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário básico", ponderou.

"Por outro lado, novos prolongamentos das políticas fiscais de resposta à pandemia que pressionem a demanda agregada e piorem a trajetória fiscal podem elevar os prêmios de risco do país", afirmou.

A escalada de preços no país começou no fim do ano passado decorrente de uma série de choques, como mudança na demanda por alimentos na pandemia, problemas em safras com chuvas e geadas, elevação nos preços das commodities acompanhada de desvalorização do real, e agora a crise hídrica, que encareceu a conta de luz do brasileiro.

O BC pontuou que a inflação ao consumidor continua elevada. "A alta dos preços veio acima do esperado, liderada pelos componentes mais voláteis, mas observam-se também pressões adicionais nos itens associados à inflação subjacente", disse.

"As diversas medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta para a inflação", colocou.
Segundo economistas, o risco fiscal tem agravado a situação e passou a ser o principal fator para a elevação das expectativas de 2022 e 2023.

Em setembro, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) alcançou dois dígitos no acumulado de 12 meses, com 10,25%.

O economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, concorda que o ritmo é suficiente para levar a inflação à meta. "O Copom destacou a piora nos preços dos ativos, nos riscos fiscais e a consequente elevação do juro neutro. De maneira similar reforçou o compromisso com a meta de inflação", afirmou.

Para ele, a Selic deve alcançar dois dígitos em 2022, bem acima da estimativa atual de juro neutro, aquele que não aquece nem contrai a economia, que está em torno de 7,5%.

"O BC deve elevar a Selic em 1,5 ponto percentual em mais três reuniões, além de uma alta de 1 ponto e, em seguida, outra de 0,25. Depois, deve iniciar o ciclo de baixa, com redução 0,5 ponto, encerrando 2022 em 11%", projetou.
João Beck, economista e sócio da assessoria de investimentos BRA, disse que o comunicado foi mais objetivo que os anteriores.

"No balanço de riscos, o BC aponta exatamente a perda da âncora fiscal como motivo não só para uma elevação de 1,5 ponto mas também para mais uma alta de mesma magnitude em dezembro", destacou.

"Entendemos que, a despeito da responsabilidade fiscal ser fundamental para a ancoragem das expectativas, parte da inflação atual está sendo impulsionada por choques de oferta. Sendo assim, pode ser prematura a visão de uma relação mecânica, automática e imediata dos atuais ruídos políticos sobre a demanda agregada, que exijam um choque de juros desproporcional para contê-la", afirmou o economista-chefe da Órama Investimentos, Alexandre Espirito Santo.

Na visão do analista, movimentos mais acentuados de alta provocariam desaquecimento da atividade "Além disso, poder trazer o espectro da dominância fiscal. Nesse sentido, a elevação de 1,5 ponto percentual ser adequada para as condições de momento", disse.

Marilia Fontes, sócia da casa de análise Nord Research, ressaltou que as novas projeções do BC para a inflação mostra que o BC teria que levar a Selic acima de 9,75% para alcançar a meta em 2022, mas que precisaria fazer um ciclo de queda depois para chegar ao objetivo em 2023.

O controle da inflação é a principal atribuição da autoridade monetária. Para isso, o BC define a meta da taxa básica de juros.

Quando a inflação está alta, o Copom sobe os juros com o objetivo de reduzir o estímulo na atividade econômica, o que diminui o consumo e equilibra os preços. Caso contrário, o BC pode reduzir juros para estimular a economia.

Em agosto do ano passado, a Selic alcançou o menor nível da história, de 2% ao ano, como resposta à crise gerada pela pandemia de Covid-19. A taxa permaneceu no patamar até março deste ano, quando o BC iniciou o ciclo de alta.

Em junho, a Selic voltou ao patamar em que estava até 18 de março de 2020 (4,25%), quando o Copom começou a cortá-la em reação aos efeitos da crise sanitária sobre a economia.

Em relação à atividade econômica, o BC disse apenas que indicadores divulgados desde a última reunião mostram uma evolução ligeiramente abaixo da esperada.

No cenário externo, segundo a autarquia, "o ambiente tem se tornado menos favorável e a reação dos bancos centrais frente à maior persistência da inflação deve levar a um cenário mais desafiador para economias emergentes".

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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