Novos documentos da Operação Zelotes mostram conexões de parlamentares e funcionários do governo com o suposto esquema de compra de decisões do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e de pagamento de propina na edição de medidas provisórias (MP).
Os investigadores buscam provas sobre os “colaboradores”, que teriam ajudado a aprovar MPs para favorecer empresas do setor automotivo.
E-mails usados como prova na operação mostram que, em dezembro de 2009, o ex-gerente de assuntos institucionais da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e atual secretário-executivo do Ministério do Turismo, Alberto Alves, manda os parabéns para o lobista Alexandre Paes Santos, preso nesta segunda-feira (26).
A Câmara dos Deputados tinha aprovado a medida provisória 471, que prorrogou incentivos fiscais por 5 anos.
Na mensagem, Alves pergunta para Alexandre se ainda dava para "intrujar" – o que, na interpretação da polícia, significaria que ele tentasse incluir a emenda que eles fizeram, dando a entender que a medida provisória foi formatada "sob encomenda".
Em outro e-mail, Paes responde que não conseguiu incluir a mudança, porque era necessário que alguém "abanasse o rabo", e "ninguém se mexeu". Segundo os investigadores, a alteração na medida provisória poderia beneficiar a montadora Caoa, mas como a empresa não sinalizou que iria pagar por isso, a tentativa não deu certo.
Em um e-mail de 29 de dezembro de 2009 com o assunto "atenção parlamentares", o ex-conselheiro do Carf, José Ricardo da Silva, fala com o sócio Eduardo Gonçalves Valadão:
"Não consegui falar com os parlamentares. Quando eu voltar, diga a eles que faremos toda a prestação de contas com os devidos acertos com diferenças a serem repassadas". Sobre os pagamentos, Silva diz que não é conveniente que "os acertos sejam feitos sempre de imediato, já que as receitas e as retiradas devem obedecer um fluxo normal, pertinente com as atividades do escritório". Caso contrário, "as prestações de serviços serão de difícil justificativa".
'Sanha de cobrança'
Segundo a Polícia Federal, o e-mail mostra como a quadrilha agia para aplacar o que os investigadores chamam de "sanha" de cobrança dos parlamentares.
Ainda no fim de 2009, a medida provisória 471 foi aprovada na Câmara. Três meses depois, no Senado. Em seguida, virou lei.
O relator da medida provisória na Câmara, deputado José carlos Aleluia (DEM) negou ter participado de qualquer esquema e acusou o Planalto. "A negociata foi feita dentro do Palácio do Planalto, na Casa Civil e ao que parece envolvendo outros ministérios".
O vice-líder do governo na Câmara, deputado Paulo Teixeira (PT), rebateu a declaração de Aleluia. "Ele disse que ele não participou e ele era o relator. Depois ele disse que houve uma negociata. Se ele souber alguma coisa, é bom que ele diga quem participou de negociata para que seja tudo esclarecido", disse o deputado petista.
Casa Civil
Os investigadores da Operação Zelotes ainda buscam provas sobre a ligação da Casa Civil com o esquema, mas já sabem que lobistas tinham acesso a Erenice Guerra, que foi secretária-executiva e ministra da pasta.
Em um e-mail obtido pela operação, o lobista Alexandre Paes Santos pede para sua secretária ligar para Erenice. "Veja o horário que ela quer viajar para São Paulo e voltar para Brasília". Na mensagem, Paes diz que a despesa será da Rumo, uma das empresas do investigado Eduardo Valadão.
A Anfavea declarou que desconhece qualquer envolvimento de Alberto Alves nas atividades investigadas na Operação Zelotes.
Alberto Alves diz que deixou a Anfavea há mais de três anos e que quando ocupou a gerência de assuntos institucionais acompanhava o debate de matérias de interesse do setor automotivo no Congresso "por obrigação profissional".
O advogado do Grupo Caoa disse que a empresa jamais fez parte de qualquer tratativa para alterar ilicitamente uma medida provisória.
A defesa de Erenice Guerra não quis comentar as investigações antes de ter acesso aos autos. A Casa Civil declarou que não comenta investigações em andamento.
A reportagem não conseguiu contato com as defesas de Alexandre Paes Santos, Eduardo Valadão e José Ricardo da Silva.
Fonte: G1