Política

Ao menos 17 pessoas tiveram sigilo telefônico quebrado em decisões

Dos 44 nomes que aparecem em pedido de quebra de sigilo telefônico em ações que tratam sobre tráfico de drogas, venda de armas de fogo e receptação de veículos, ao menos 17 pessoas não tinham qualquer envolvimento real com os crimes investigados. São políticos, advogados, médicos, jornalistas, servidores públicos e outros, que teriam tido seus números grampeados erronêamente, com a autorização judicial da Comarca de Cáceres em 2014.

Conforme documentos publicados pelo site Mídia News, as autorizações foram concedidas entre outubro de 2014 e julho e 2015 pelo juiz Jorge Alexandre Martins Ferreira, por meio de três decisões. Na primeira lista de telefones grampeados contém mais nomes de pessoas sem qualquer aparente ligação com os crimes investigados do que de suspeitos reais. São seis de 18.

Aparecem na lista os nomes do jornalista José Marcondes “Muvuca”; a ex-funcionária da Secretaria de Infraestrutura e Logística (Sinfra), Tatiane Sangalli (apontada como namorada do ex-secretário-chefe da Casa Civil, Paulo Taques); os advogados Bathilde Jorge Moraes Abdalla e José Patrocínio (dois números interceptados deste último); a assessora do vereador por Cuiabá Adevair Cabral, Michelle Cecília da Silva; Vinicyus Correia Hugueney, filho do Clovito Hugueney, morto em 2015.

Os telefones de pessoas com suspeita real de crimes seriam de quatro policiais militares, de um estelionatário, de um advogado que atuaria como consultor ambiental. Outros quatro não têm identificação dos donos das linhas.

As interceptações estão sendo investigadas em crime conhecido como “barriga de aluguel”, no qual nomes de pessoas são juntados em lista com outros nomes, sem qualquer suspeita, para rastrear as conversas.

No caso das centrais de escutas supostamente existentes desde 2014 pela Polícia Militar seriam ouvir pessoas do interesse do governo estadual, com objetivo política. De acordo com o advogado José do Patrocínio, ex-consultor jurídico de coligação partida, nas eleições de 2014,  encabeçada por Lúdio Cabral, o objetivo do governo seria saber de  ações do grupo durante a campanha.

Conforme o advogado, os grampos foram feitos por pessoas ligadas ao governador Pedro Taques.

Indícios apontam que as escutas eram coordenadas pela Companhia da Polícia Ambiental, do 22º Batalhão da PM, em Cáceres. Três policiais militares teriam tido acesso às escutas colhidas em centrais. O esquema envolveria, além de outras pessoas, os cabos Gerson Luiz Ferreira e Clayton Dorileo Rosa de Barros, e a sargento Andrea Pereira de Moura Cardoso. Juízes, advogados, empresários e jornalistas e políticos teriam sido grampeados pela Polícia Militar.

Os envolvimentos dos PMs são apontados em denúncia realizada pelo ex-secretário de Estado de Segurança Pública (Sesp), o promotor de Justiça Mauro Zaque, à Procuradoria Geral da República – trechos do documento foram divulgados pelo site O Livre. 

Os militares foram nomeados para a Casa Militar entre julho e outubro de 2016, cerca de um ano após a suposta conversa entre Zaque e o o governador Pedro Taques (PSDB), em que o então ex-secretário teria revelado a arapongagem no Estado ao tucano.

Prorrogações judiciais

Os documentos publicados pelo MídiaNews pontuam que o juiz dá a autorização de escutas em março de 2015 sob justificativa de que a medida estaria surtindo efeitos sobre o investigados. Num trecho, o magistrado afirma que “os alvos estão evitando toda forma falar ao telefone, deixando clarividente que estão sendo objeto de investigação, alguns chegaram a mencionar que estão sendo grampeados”.

A suspeita era que policiais da Companhia Militar Ambiental estariam usando meios do Poder Público para transporte e distribuição de “substâncias ilícitas”. Parte do produto estaria, à época, depositado em fazendas em áreas rurais no interior de Mato Grosso, de onde os militares recolhiam e faziam a distribuição.

São citados na lista de interceptações autorizadas Eduardo Gomes Silva Filho, advogado do PRB e assessor do deputado estadual Wagner Ramos (PSD); a jornalista Larissa Malheiros Batista, ex-servidora comissionada da Prefeitura de Várzea Grande; e o assessor especial da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), Romeu Rodrigues da Silva.

Em junho de 2015, o mesmo juiz concedeu a prorrogação dos grampos devido à “veracidade de parte da denúncia”.

Desta vez aparecem na lista de grampeados os nomes do Carlinhos e Gisele Bergamasco, ex-servidores na Assembleia Legislativa que apareceram na lista anterior; Mário Edmundo Costa Marques, apontado “segurança/capanga” da fazenda; e Kely Arcanjo Ribeiro Zen, filha do ex-bicheiro João Arcanjo Ribeiro.

TJ/MT adota medidas

Após a suposta prática de "barriga de aluguel", que teria levado o magistrado ao erro, o presidente do  Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), desembargador Rui Ramos, por meio da Corregedoria-Geral de Justiça, determinou que juízes da esfera criminal apresentem informações sobre decisões tomadas entre 2014 e 2017, que envolvam pedido de quebra de sigilo telefônico. 

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Reinaldo Fernandes

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