O Senado promoveu sessão especial remota, nesta segunda-feira (27), para o lançamento da obra inédita no país Vozes do Brasil: a linguagem política na Independência (1820-1824). O livro reúne 20 panfletos publicados entre 1820 e 1824, conhecidos como panfletos da Independência, que foram impressos, na época, no Brasil e em Portugal. O material pertence a Biblioteca Oliveira Lima, da Universidade Católica da América, em Washington, nos Estados Unidos. A reunião também foi destinada a celebrar o 199ª aniversário de independência do país, celebrado em 2021.
O requerimento para que a sessão pudesse ser realizada foi de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), coordenador da Comissão Especial Curadora destinada a elaborar e viabilizar a execução das comemorações em torno do tema "O Senado Federal e os 200 anos da Independência do Brasil".
Na abertura da sessão, o senador disse que os arquivos de Oliveira Lima foram entregues à Universidade de Washington ainda na década de 1920 e, após cem anos, esses documentos voltam ao Brasil, para que os brasileiros possam entender como foi esse processo de formação da sua independência.
Randolfe Rodrigues classificou o lançamento da obra como uma apresentação da "certidão de nascimento" do país, e afirmou que este é o evento mais importante a menos de um ano das comemorações do bicentenário de independência.
— O nosso 199º aniversário da independência, às vésperas do bicentenário, deveria ser celebrado para que nós refletíssemos sobre o País a que chegamos, as conquistas que tivemos, a República, a democracia. O 199º aniversário, que antecede o bicentenário, não deveria servir para pedir o banimento da nossa democracia; não deveria servir para pedir o fechamento das instituições do Estado democrático de direito, Congresso, Supremo Tribunal Federal; não deveria servir para fazer apologia a restaurações autoritárias. O 199º aniversário deveria servir para nós refletirmos e pensarmos que nação somos e qual nação nós queremos daqui a cem anos, quando estivermos no nosso terceiro centenário como Nação independente. O nosso 199º aniversário deveria servir para celebrar, para refletir, mas principalmente para celebrar as conquistas — afirmou Randolfe, que presidiu a sessão especial.
O parlamentar salientou que a realização da obra só foi possível graças aos esforços da diretora da Biblioteca Oliveira Lima, Nathalia Henrich, que também participou da sessão solene.
A Obra
Nathália Henrich destacou em sua fala que o livro servirá não apenas aos especialistas que não podem se deslocar até Washington pessoalmente, para visitar e consultar a coleção, mas também aos professores, estudantes e público em geral.
Ela disse que as autoras da obra, as professoras Heloísa Starling e Marcela Telles de Lima, realizaram uma seleção criteriosa dos documentos do acervo da Oliveira Lima Library, com um objetivo em mente:
— Elas disseram que o sentimento que permeava a obra era o de ouvir as vozes dos brasileiros que lutaram pela liberdade no País. As vozes foram muitas e foram variadas, expressaram um projeto de País, ideias sobre Governo e política, assim como conceitos muito mais difusos como soberania, igualdade, liberdade e representação, e a preocupação em trazer essas vozes que permaneceram tanto tempo caladas, já que esses textos até hoje não haviam sido republicados para o grande público, e eles voltam ao Brasil — explicou.
Nathalia Henrich acredita que as diversas instituições envolvidas no lançamento estão cumprindo com seu papel cívico de promover o conhecimento, acercar o público brasileiro não apenas de documentos que são fonte para a história do país, mas também enriquecido da pesquisa séria e rigorosa que acompanha.
— Nós concretizamos assim o desejo do nosso fundador, o historiador e diplomata Manuel de Oliveira Lima, quando decidiu doar sua biblioteca à Universidade Católica da América, aqui em Washington, e criar um espaço de difusão do conhecimento sobre a história e sobre a cultura do Brasil nos Estados Unidos, que irradiaria de volta para o Brasil e também iluminaria o mundo — ressaltou em sua fala na sessão solene.
A diretora da biblioteca Oliveira Lima ressaltou a importância da obra para o Brasil em meio ao momento de crise política e de pandemia.
— Vivendo uma tragédia humanitária em que há crises políticas e crises institucionais tamanhas, parecia até que falar do passado era um exercício vão, fútil, quando o presente é urgente e o futuro é permeado pela incerteza. Mas eu creio que o conhecimento, em especial o conhecimento histórico, que vem sendo tão maltratado no debate público, nunca foi tão importante como neste exato momento em que nós lutamos contra a epidemia ainda do covid-19, é importante lembrar, mas, ao mesmo tempo, travamos uma batalha contra a epidemia de desinformação que tantos danos tem gerado no nosso País -, observou.
Histórias da época
Heloísa Sterling, professora da Universidade Federal de Minas Gerais e uma das autoras da obra, lembrou em sua fala durante a sessão que os panfletos reunidos na obra mostram que, na efervescência daqueles anos, eles eram materiais acessíveis a todos.
— Você pode surpreender a cidade inteira numa única manhã. Você vai lá, prega o panfleto com cera de abelha na parede e na porta de uma residência, nos lugares de maior circulação de pessoas, mas os panfletos também podem ser distribuídos de mão em mão. E, numa sociedade como a brasileira em que largas parcelas da população eram pouco instruídas ou nem mesmo letradas, os panfletos davam a volta aos obstáculos e baixavam os grandes temas da conjuntura ao nível das ruas. Eles eram lidos em voz alta também na porta das igrejas, nas lojas, nas tabernas, nas casas de alcouce, que são os prostíbulos, nas reuniões públicas, nas praças. Olha que legal: um grande debate sobre as visões e os projetos de Brasil — lembrou a professora.
Para o jornalista e escritor Eduardo Bueno, membro da Comissão Especial Curadora do Senado, uma celebração da independência dessa grandeza não é feita só pelo Poder Executivo, Legislativo e Judiciário.
— É feita por nós da sociedade civil, por nós! Nós somos agentes históricos. Nós temos que exercer a nossa cidadania e nós, nós, que temos essa responsabilidade. Já que estamos nesta Comissão, nós temos a obrigação de fazer com que isso chegue aos alunos e chegue com uma história libertária, uma história envolvente, uma história que apaixone e uma história que leve à reflexão, porque o único jeito de construir um país menos injusto do que este é com o conhecimento – salientou em seu discurso.
Também fizeram uso da palavra o presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos, Francis Bogossian e o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Ildeu Moreira. A sessão contou com a presença virtual de senadores e da Diretora-Geral do Senado Federal, Ilana Trombka, que também compõe a Comissão Especial.
Os textos foram disponibilizados, em formato facsimilar, ao Senado por meio do acordo de parceria com a Biblioteca Oliveira Lima. O acordo de colaboração foi firmado em evento on-line no último dia 17 de agosto, a partir da iniciativa da Comissão Especial Curadora.
O livro será vendido na Livraria do Senado, por R$ 32.00