A proposta do governo de unificar PIS e Cofins e, no lugar, colocar a Contribuição de Bens e Serviços (CBS), não prevê mudança na carga tributária medida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) do país, mas redistribui o peso dos impostos entre os setores produtivos — o que não agrada a todos.
A chiadeira entre empresários, comerciantes e especialistas aumentou depois que o ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou a primeira fase de sua proposta de reforma tributária ao Congresso na terça-feira.
Entenda os três pontos que geraram mais polêmica:
Serviços
O processo de unificação dos impostos federais cobrados sobre consumo prevê uma alíquota única máxima de 12% para todos os contribuintes. Isso significa que prestadores de serviços com lucro presumido, usado com mais frequência por pequenas e médias empresas, comércio em geral, academias, empresas de software, serão os mais onerados, já que pagam hoje uma alíquota de PIS e Cofins de 3,65%.
A da indústria atualmente é de 9,25%, mas o setor poderá recuperar parte com créditos de gastos feitos com bens e serviços, como matéria-prima, energia elétrica, embalagens etc.
Com o argumento de que “se todos pagam impostos, todos pagam menos”, o governo justifica o aumento dizendo que, no futuro, a economia ganhará como um todo com a reforma, o que beneficiará também o setor. Mas especialistas reclamam que, num primeiro momento, as empresas vão sofrer:
“Sem dúvida, vai ficar mais apertado para quem presta serviço se a regra for aprovada como está, o que, nos melhores casos, significa que haverá menos dinheiro para o empresário distribuir ou reinvestir no negócio”, diz Fagner Souza, sócio de serviços tributários da Mazars.
Esse cenário, segundo o advogado poderá aumentar a informalidade no curto ou médio prazo: “Se você for jogar 100% na regra do jogo, pode ser que fique inviável para muita gente”, diz.
Mão de obra
Um dos argumentos para a alta na alíquota de serviços é que é um setor que pode funcionar com poucos custos fixos, não é como a indústria que precisa comprar insumos, máquinas e etc para funcionar. O problema é que, muitos prestadores de serviços têm gastos fixos importantes com folha de pagamento, o que pode estimular — ainda mais — a contratação de pessoas jurídicas.
“O CBS permite que as empresas deduzam gastos com serviços. O que é mais vantajoso nesse cenário? Contratar um PJ e ganhar créditos sobre o que é pago a ele ou um funcionário a quem se paga salário, vale transporte, férias etc?”, questiona Souza.
O plano de Guedes é que esse desequilíbrio que pode ser gerado num primeiro momento seja resolvido numa quarta fase de sua reforma tributária, ainda sem prazo para ser entregue aos parlamentares, com um imposto sobre pagamentos, o que remete à extinta e controversa CPMF, criada como “imposto do cheque” nos 90.
“Em tese, esse imposto sobre pagamentos pretendido servirá para desonerar a folha, para que o custo de empregar fique menor. Só que, ao mesmo tempo que desonera as empresas, passa a diferença para o consumidor pagar nas transações financeiras”, diz Souza.
“Não temos nem certeza se será possível chegar na quarta fase do plano de Guedes. Só a primeira parte pode levar um ano para ser aprovada. O governo pode sair e a gente nunca ver essa ‘compensação'”, diz Douglas Herrero, do Instituto Brasileiro de Gestão e Planejamento Tributário (IBGPT).
Bancos
Pela proposta de Guedes, as instituições financeiras continuam entre os beneficiados por regimes especiais de impostos, embora tenham tido aumento na alíquota sobre sua receita bruta de 4,65% para 5,9%.
A justificativa do governo é que o setor não poderá gerar ou se apropriar de créditos tributários. Essa característica da cadeia financeira, no entanto, também se aplicaria à de serviços, que precisam de insumos tanto quanto as instituições, dizem os críticos.
“O sistema bancário brasileiro é um dos mais seguros do mundo, isso ficou claro na crise financeira de 2008, e teoricamente não precisaria ser beneficiados, pois já têm um bom lucro”, diz Herrero.
Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF) e um dos mentores da proposta em análise pelos parlamentares. explica que exista uma maior dificuldade de tributar serviços financeiros (especialmente o spread) pelo regime não cumulativo, o que pode explicar o fato de as instituições continuarem nessa forma de tributação. No entanto, há países que tributam os serviços cobrados na forma de tarifas e comissões pelo regime não cumulativo.