Os ex-prefeitos de Lucas do Rio Verde (354 km de Cuiabá), Marino Franz e Otaviano Pivetta, atualmente vice-governador de Mato Grosso, estão livres de uma ação de improbidade administrativa, na qual foram acusados pelo Ministério Público Estadual (MPE) de terem responsabilidade em fraudes a licitações praticadas por alguns servidores para beneficiar determinadas empresas participantes de licitações lançadas em 2004.
O juiz Cássio Luis Furim, da 1ª Vara Cível de Lucas do Rio Verde, rejeitou a ação contra os dois ex-gestores por falta de elementos mínimos que pudessem individualizar suas condutas.
A decisão já transitou em julgado e o Ministério Público sequer recorreu. Ou seja, concordou com o magistrado em relação à denúncia genérica contra Pivetta, Franz, outras sete pessoas e uma empresa. Por outro lado, o processo foi recebido contra 13 denunciados (pessoas e empresas). A ação foi ajuizada em 28 de dezembro de 2009.
Os fatos também foram investigados na esfera criminal pois alguns denunciados foram apontados como integrantes de uma organização criminosa que fraudava licitações para construção de casas populares em Lucas do Rio Verde. Conforme as acusações, o esquema teria começado quando Otaviano Pivetta era prefeito e continuado depois que seu mandato acabou e Marino Franz foi eleito para a função de chefe do Executivo Municipal.
Otaviano Pivetta e Marino Franz foram defendidos pelo advogado Valber Melo. A peça de defesa argumentou que o Ministério Público indicou detalhadamente que teria ocorrido ato de improbidade administrativa em procedimentos licitatórios, mas não apontou qualquer ato ao Marino Franz em tais procedimentos, atribuindo-lhe responsabilidade simplesmente por ser o gestor. Conforme sustentado pela defesa, o procedimento criminal instaurado foi arquivado por não haver o mínimo probatório quanto a Franz no tocante ao delito de fraude à licitação.
“Ao analisar o relatório da auditoria do Tribunal de Contas, temos que em momento algum há indicação de conduta improba dos prefeitos que se sucederam, quer seja, Otaviano Pivetta e Marino Franz. Cabe o registro de que o TCE esmiuçou os procedimentos licitatórios e o mesmo relatório que não apontou responsabilidade evidente dos gestores, apontou detalhadamente a colisão de interesses (secretário de Obras/engenheiro do Município) sócio de empresas participantes de certames, documentos escritos à mão com dados repetidos posteriormente em propostas, ausência de documentos obrigatórios, vazamento e combinação de valores, descrição equivocada de objeto, etc. Desta forma, temos uma auditoria detalhista que não descreve atos destacados de ilicitude atribuíveis aos requeridos que foram prefeitos com relação aos procedimentos licitatórios (Tomada de Preços 06/04 e 09/04; Pregão Presencial 03/04 e Carta Convite 03/05 e 26/05)”, escreveu o juiz em trecho da decisão.
Observou que o próprio promotor de Justiça que atou no caso confirmou tratar-se de ato ocorrido na gestão anterior. “Temos que o requerido Marino José Franz não pode ser responsabilizado ou mesmo envolvido em situação que ocorreu em momento em que tal pessoa não tinha qualquer relação com a administração pública. Tal requerido não era no ano de 2004 o prefeito municipal (tomou posse em 2005), não tinha qualquer cargo público ou mesmo participou, ainda como particular, de qualquer evento relacionado aos atos anteriores à sua posse (ao menos não há qualquer indicação nos autos)”, escreveu o magistrado.
Em relação a Otaviano Pivetta, o Ministério Público sustentou que houve falta de controle interno da administração e conhecimento a respeito das ilicitudes. A defesa de Pivetta também rebateu o MPE afirmando que a imputação se deu de forma muito genérica e retórica e não apontou qualquer ato de ação ou omissão concretamente de responsabilidade do ex-prefeito, hoje vice-governador do Estado.
“Ao analisar a petição inicial e a documentação juntada, temos que não há qualquer elemento sólido para sustentar o recebimento da petição inicial de improbidade quanto a tal requerido. Veja-se que o Ministério Público foi bastante cuidadoso e detalhista na apuração dos fatos e juntada de elementos de prova, mas neste ponto, limitou-se de fato a afirmar que ato de improbidade ocorreu por falta de controle administrativo e por omissão (tinha conhecimento da improbidade)".
Segundo o magistrado, existe um corpo técnico na Prefeitura para lidar com as licitações, de modo que não se pode responsabilizar o prefeito da época por ter ocorrido eventual situação de improbidade praticada por outros servidores e terceiros, ainda que no âmbito da gestão. "Assim, não havendo fundamento relevante, não é razoável que o requerido seja compelido a responder ação de improbidade pela simples ocorrência de ser o prefeito na época e por ser em última análise, o controlador do município”.
Quanto ao argumento de que Pivetta sabia de eventual improbidade em contratos licitatórios, o magistrado afirmou não haver nos autos qualquer indicação razoável de que tal teria ocorrido. "Cabe aqui o registro que o Ministério Público juntou mais de 800 documentos e áudios e gravações (cerca de 11 horas de mídia) e, ainda assim, neste ponto não há elementos que indicassem que o requerido tivesse participado de alguma forma ou ainda, que tivesse ciência do malfeito e tivesse anuído por meio da inação".
Quanto a falta de controle, a petição inicial narra a existência de conluio entre o próprio secretário de Obras, uma servidora pública e as empresas participantes. “Ou seja, mesmo se cercando da fiscalização formal da comissão de licitação e do parecer jurídico, não é razoável imputar ao gestor municipal o conchavo entre os participantes e membros integrantes da administração pública”, escreveu o juiz ressaltando que o servidor responsável por fiscalizar é apontado como mentor do esquema (na época, o secretário de Obras/engenheiro do Município).
Segundo o magistrado, não é possível ao gestor geral ter controle absoluto acerca da conduta eventualmente mal intencionada de quem faz parte da Administração Pública. "Seria necessária a rara capacidade de perscrutar corações e mentes, característica reservada para a onisciência. Em resumo, não há elementos mínimos para o seguimento da ação de improbidade com relação a Otaviano Olavo Pivetta”, escreveu o juiz na decisão de 28 de maio de 2021.
Lista de nomes
A ação de improbidade foi rejeitada contra os seguintes nomes: Otaviano Olavo Pivetta, Marino José Franz, Eliseu Sávio Diniz, Claudia Manfrin de Melo, Luciano Wirzbick, Alen Daiana Paludo, Eberton Vestena dos Santos, Jessica Regina Wohlemberg, Silvio Crespi de Oliveira e a empresa Parizotto Materiais para Construção Ltda (Construnorte Construtora Ltda).
Na outra ponta, viraram réus os seguintes denunciados: Sandra Regina Petterson Moraga-ME (Mercantil Materiais de Construção), Mercantil Construtora (representada por Helio Hernesto Moraga), Moraga & Moraga Ltda (Moraga Materiais de Construção), Cézar Felix Valente Benitz-ME, Edifik Comércio de Materiais de Construção Ltda; (representada por Valdemir Moraga), Valdir Miquelin, Dirceu Camilo Cosma, Nadia Priester, Neivo José Basso-ME, J. F. Construções, Rafael de Castro Balizardo, Nadir Helena de Castro Balizardo e Carlos Francisco Balizardo.