Um desejo repentino de voltar para casa. Mas não para o local onde mora hoje com a filha e dois netos. Voltar para o lar de infância, onde dona Maria Amália Ribeiro de Campos, de 87 anos, cresceu feliz. Foi assim que a tecnóloga da informação Christiane Ribeiro Nogueira, de Sorocaba (SP), percebeu na avó os primeiros sinais de um problema degenerativo e que não tem cura: a Doença de Alzheimer.
"O primeiro sintoma foi o esquecimento dos dias. Ela começou a afirmar que todo dia era uma data comemorativa: carnaval, Natal, Finados e aniversário", lembra a jovem de 27 anos.
Diagnosticada pelos médicos em 2013, a doença transformou não só a vida de dona Maria Amália, mas também a de Christiane. Desde então, ela se mudou para a casa da avó e abriu mão de atividades comuns a alguém da sua idade. A jovem deixou de frequentar a academia e não se lembra quando foi a última vez em que viajou. Até o forró, que era uma grande paixão, ficou de escanteio. Tudo para se dedicar à avó, que precisa de atenção constante em atividades diárias como banho e alimentação. A única hora do dia em que as duas não estão juntas é quando Christiane trabalha – e de onde tira o salário que ajuda a pagar o tratamento do Alzheimer.
Neste domingo (26), quando foi celebrado o Dia dos Avós, a neta acordou cedo e se preparou para passar o dia exatamente como passa todos os outros: na companhia de dona Maria Amália. Assim que levanta da cama, Chris dá banho na avó e, durante a semana, a leva para uma casa de repouso. Quando sai do trabalho, vai direto buscá-la e as duas passam a tarde toda juntas assistindo à televisão. "Nós jantamos e, às vezes, vamos ao shopping ou à casa da minha irmã. Depois dormimos na mesma cama", conta.
Aos sábados, Christiane aproveita a folga do emprego para ficar o dia todo em casa com a avó e, no domingo, conta com a ajuda da mãe. "Quando ela está muito irritada, saímos para comer pastel, porque todos os dias ela sente vontade. Na verdade, ela não se recorda que comeu no dia anterior."
Já que a Doença de Alzheimer não tem cura, o tratamento consiste em tomar remédios que possam retardá-la. "Aprendi a lidar com a doença, mas, na verdade, vejo que ela não fere o doente e, sim, o cuidador. Ela não sabe o que está acontecendo, porque o Alzheimer está sempre mudando de estágio. É horrível não poder fazer nada, a não ser esperar", lamenta.
Para a família, é bastante estressante ter que responder sempre às mesmas perguntas e ouvir as mesmas histórias. Se o cuidador não tiver paciência, explica a neta, é muito difícil lidar com a situação. "Ela já está dando sinais de esquecimento dos netos. Às vezes me vê como criança e, em outras, não sabe nem quem eu sou."
'Um Dia de Alzheimer'
Com o objetivo de ajudar outras pessoas que passam pela mesma situação, Christiane decidiu criar uma página especial no Facebook: "Um Dia de Alzheimer". No ar há dois meses, a comunidade traz esclarecimentos sobre o Alzheimer, dicas para os cuidadores e registros dos momentos passados com dona Maria Amália. "Afinal, não precisamos ver só o lado negativo da doença. Eu passo os dias com ela sempre me divertindo", acredita a jovem.
Em meio aos cuidados diários, a relação entre a neta e a avó se tornou mais íntima. "Eu a considero como uma filha. Para mim, ela representa uma grande guerreira, pois sofreu muito e esteve sempre de pé, firme para continuar as lutas que a vida nos guarda, sem reclamar de nada."
Ela conta que a avó teve uma infância atribulada, chegando a passar fome. Depois se casou e teve um filho com deficiência mental, que viveu pouco. Além do filho, Maria Amália também perdeu o marido e os irmãos. "Acredito que para herdar o céu temos que entrar como pequeninos. E é assim que ela irá entrar, porque a doença leva a pessoa a regredir até chegar à posição de feto", completa Christiane.
Fonte: G1