Cidades

Entregadores de pizza ficam 4 meses e 7 dias presos por engano

Dois entregadores de pizza ficaram 4 meses e 7 dias presos por engano no Centro de Detenção Provisória (CDP) da Vila Independência, na Zona Leste de São Paulo, acusados pelo roubo de uma motocicleta em 25 de abril deste ano. Diego Aparecido Cordeiro dos Santos e Douglas de Santana Vieira foram considerados os responsáveis pelo crime ocorrido na Zona Norte de São Paulo. Imagens de câmeras de segurança e uma multa tomada pelos ladrões com a moto roubada foram decisivas para que eles fossem inocentados.

Com essas informações no processo, o juiz Marcos Alexandre Coelho Zilli, da 15ª Vara Criminal da Barra Funda, em São Paulo, revogou a prisão preventiva dos dois e concedeu alvará de soltura. Em liberdade desde 1º de setembro, eles só pensam em voltar aos estudos, trabalhar e ficar todo tempo possível com suas famílias.

A reportagem do G1 acompanhou a saída deles do CDP da Vila Independência e o reencontro com parentes (veja vídeo acima). "Foram quatro meses sofrendo lá dentro sem ter feito nada de errado, mas foi feita a Justiça e deu tudo certo", disse Douglas.

Pouco mais de um mês em liberdade, Diego voltou a estudar e quer terminar o ensino médio. Douglas voltou a trabalhar e retomou o relacionamento com a namorada.

Credibilidade
Ele e o amigo Diego sempre disseram aos policiais militares e à Justiça que eram inocentes, mas seus depoimentos nunca foram considerados como verdadeiros. Em audiência na Justiça, relataram que receberam tapas e cusparadas dos policiais. A credibilidade e a liberdade deles vieram à tona quando o tio de Douglas começou a fazer uma investigação por conta própria. Ele encontrou as câmeras de segurança que filmaram os rapazes e também os assaltantes em momentos distintos.

Uma multa de excesso de velocidade foi registrada pela câmera do radar da prefeitura na Avenida Fuad Luftalla. Quem pilotava a moto roubada era um dos assaltantes. "A gente nunca teve essa índole de querer tirar as coisas dos outros. Nunca baixamos a cabeça para as necessidades. Voltar a respirar esse ar da liberdade é muito bom", disse Diego.

As imagens da câmera de segurança da região foram enviadas pela defesa de Diego e Douglas ao perito Ricardo Molina, que deve concluir um laudo sobre as imagens em 20 dias. Na análise feita por ele, que o G1 teve acesso, Molina mostra que os dois assaltantes aparecem em duas motos (uma delas roubada) e os dois amigos surgem minutos depois em outra moto.

Reconhecimento


Outro detalhe que comprova a inocência de Diego e Douglas, e que foi levada em consideração pelo juiz em sua decisão, é a mudança do depoimento da vítima. Os policiais militares e o Ministério Público consideram que a vítima havia feito o reconhecimento dos dois amigos com absoluta certeza, mas na audiência acabou voltando atrás e disse que não tinha como fazer o reconhecimento, já que os verdadeiros criminosos estavam de capacete e a dupla estava sem a proteção.

“Eles cometeram um único, que foi terem ficado perto de uma moto roubada. A moto tinha acabado de ser abandonada pelos verdadeiros assaltantes. Instantes depois, policiais militares chegaram o os prenderam como autores do roubo. Imagens de câmeras de segurança mostram que eles são inocentes e uma multa tomada pelos ladrões com a moto roubada indica o mesmo”, disse Ariel de Castro Alves, coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos de São Paulo, e que atuou na defesa dos dois.

Outra contradição dos policiais militares é que a vítima disse ter sido abordada por dois rapazes, sendo que um deles estava armado. Nenhuma arma foi apreendida com os entregadores de pizza.

“O vídeo mostra que a moto amarela (que foi roubada) passa primeiro às 06h28, com um ocupante de blusa azul e capacete preto. Ela é seguida por uma moto preta, com um ocupante de capacete vermelho. As duas passam pela Avenida Tomás Rabelo e Silva. A moto vermelha de Diego e Douglas passa no vídeo às 06h30, com os dois sem capacetes”, disse Alves.

Sem audiência de custódia
"Infelizmente, nesses casos, o Ministério Público só leva em conta a versão dos policiais, não levando em consideração as demais provas e as versões dos suspeitos. Por isso os casos de flagrantes forjados ou irregulares se tornaram tão comuns. Nesse caso, os acusados sequer foram submetidos a audiência de custódia logo após a prisão para serem ouvidos por um juiz", disse Francisco Lúcio França, advogado criminalista que atuou no processo e também membro do Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo.

Alves disse que Diego e Douglas não passaram por exame cautelar em audiência de custódia programada inicialmente para ser realizada no mesmo dia do “flagrante equivocado”. No entanto, ela foi adiada para dois dias após a prisão dos entregadores de pizza e nunca ocorreu, pois a prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva. Eles ficaram dois dias na carceragem do 72º Distrito Policial. “Os dois foram transferidos direto para o CDP, sem passar pela audiência de custódia.”

Outro lado
A defesa de Diego e Douglas informou que houve erro no registro da ocorrência, na prisão em flagrante e na denúncia feita pelo Ministério Público. “Muitas vezes vemos uma ocorrência, digamos assim, forjada e essas ocorrências acabam recebendo a homologação do Ministério Público”, disse Alves. O MP informou que vai analisar eventual cabimento de recurso da decisão do alvará de liberdade concedida aos dois.

Sobre a possibilidade de irregularidade na prisão feita pelos policiais militares e na investigação do caso, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo informou que o delegado Egídio Cobo, titular do 13º DP, disse que a prisão dos dois suspeitos foi feita com base no testemunho e no reconhecimento feito pela vítima, que apontou ambos como autores do roubo, em relato feito com detalhes das roupas e que apontou inclusive um deles como portador de arma de fogo. No momento da prisão, no entanto, nenhuma arma foi apreendida com os dois jovens.

Ainda de acordo com o delegado, a apresentação posterior de novas provas à Justiça não indica erro no procedimento policial, pois não havia elementos para comprovar a versão dos indiciados até o inquérito ser relatado.

Fonte: G1

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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