Política

Delações em Mato Grosso já reverteram R$ 71,8 milhões aos cofres

Dezesseis delações premiadas já foram homologadas pelo Ministério Público do Estado (MPE) e o Tribunal de Justiça por meio de acordo envolvendo o ex-governador Silval Barbosa (PMDB). São pedidos de integrantes de esquemas de corrupção do Poder Público, cujas operações começaram a ser deflagradas em 2015.

A informação é da 14ª Promotoria de Justiça Criminal e Defesa do Patrimônio Público, comandada pela promotora Ana Cristina Bardusco. Todos os acordos são referentes a atividades ilegais em que o Silval Barbosa aparece com um dos chefes de desvio. Os nomes dos delatores e os conteúdos desses acordos não foram divulgados.

Essas 16 delações já geraram o recolhimento de R$ 26,9 milhões em dinheiro como parte do acordo, além de tomada de imóveis que somam R$ 45 milhões. No total, elas derivam de 46 inquéritos policiais de investigação e geraram quatro ações penais.

Silval Barbosa assumiu o governo de Mato Grosso em 2010 no cargo de vice-governador após o titular do cargo, Blairo Maggi, se afastar para disputar vaga no Senado. No mesmo ano, foi eleito para o governo, onde permaneceu até 2014. As investigações deflagradas pelo Ministério Público do Estado correspondem a esquemas supostamente montados nesse período.

Ele está preso provisoriamente desde setembro de 2015, ano em que a Delegacia Fazendária (Defaz) e o Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos (CIRA), ligado ao MPE, deflagraram a Operação Sodoma I. Também pela operação foram presos os ex-secretários estaduais Pedro Nadaf (Indústria e Comércio e Casa Civil) e Marcel de Cursi (Fazenda).

Conforme a polícia, os investigados teriam montado um esquema de corrupção e lavagem de dinheiro, em 2013 e 2014, nos serviços de concessão de incentivos fiscais pelo Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso (Prodeic). O grupo cobraria de empresários o pagamento de propinas para dar continuidade a contratos de serviços com o Estado. O ministério disse ter confirmado o pagamento de R$ 2,9 milhões em propina.

Seis meses mais tarde, Silval Barbosa voltaria a ter novo mandato de prisão decretado na terceira fase da Operação Sodoma. Além dele, o ex-secretário de Administração, Pedro Elias Domingos de Mello, e o ex-chefe de gabinete, Silvio Cézar Correa de Araújo. O delegado da Defaz, Lindomar Tófolli, afirmou à época que o desdobramento da operação comprovou a anuência do ex-governador no recebimento de propina pelo alto escalão de sua gestão como propinas para manutenção de contratos.

Em fevereiro de 2016, Silval Barbosa voltou a aparecer em investigações do MPE, desta vez na Operação Seven, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco). Foi identificada a formação de um grupo no primeiro escalão do governo que desviou R$ 7 milhões com compra de terreno. O esquema seria liberado pelo ex-governador Silval Barbosa, o ex-secretário Pedro Nadaf e o ex-procurador do Estado Francisco Gomes de Andrade Lima Filho.

Segundo o Gaeco, as investigações começaram quando o Estado fez pedido para a aquisição de um terreno em zona rural, que seria acrescida ao Parque Estadual Águas do Cuiabá. O processo de compra teria passado por vários órgãos estaduais, como a Secretaria de Meio Ambiente (Sema) e de Administração (extinta SAD), Casa Civil e Instituto de Terras de Mato Grosso (Intermat), nos quais foi avaliado por técnicos como aprovado. No entanto, a investigação descobriu que a área já pertencia ao Estado. O terreno mede 721 hectares e foi vendido por R$ 4 milhões.

Em fevereiro de 2017, novas descobertas na Operação Sodoma I levaram a pedido de outro pedido de prisão do ex-governador. As empresas Marmeleiro Auto Posto Ltda e Saga Comércio Serviço Tecnológico e Informática Ltda teriam pago propina de ao menos R$ 7 milhões para a organização criminosa supostamente liderada por Silval entre 2011 e 2014. Neste período, as duas empresas receberam aproximadamente R$ 300 milhões em contratos com o governo de Barbosa.

A primeira investigação em que Silval Barbosa aparece implicado foi deflagrada em novembro de 2013 pela Polícia Federal juntamente com o Ministério Público Federal de Mato Grosso (MPF-MT). A operação Ararath apurava indícios de crimes de lavagem de dinheiro no país. Movimentações de factoring e outras empresas ligadas ao sistema financeiro eram analisadas desde 2011.

Delação faz avançar investigação, mas não é novo modelo processual

O advogado Gustavo Badaró, que é de São Paulo e ministrou palestra esta semana em Cuiabá sobre delação premiada, afirma que a documentação de provas colhidas por delações bem acordadas possibilita avanço na investigação a demais integrantes de organização criminosa, irrompendo o fator tempo no processo judicial.

“Há investigações hoje que são muito bem documentadas. Diferentes de investigações de antigamente em que certos crimes se dependiam de prova testemunhais, hoje as interceptações telefônicas, quebra de sigilo de e-mail, muitas vezes quando a investigação chega a um indivíduo já há provas e elementos muito fortes contra essas pessoas. As chances de condenação são muito grandes”.

Badaró afirma que a partir de delações os órgãos de investigação podem ter acesso a elementos incriminatórios, para os quais, antes, as chances de coleta eram pouco prováveis.

“A delação, quando é bem feita, ela contribui para a descoberta de certos crimes em casos que têm ameaça a testemunhas, destruição de provas e pacto de silêncio entre os integrantes, e sem a delação dificilmente esses crimes seriam descobertos. Beneficiar pessoas com redução de pena é um preço que a sociedade paga para descobrir, punir e fazer cessar as práticas criminosas”.

Porém, ele aponta para o “exagero” no número de acordos firmados pela Justiça brasileira. Ele critica o uso indiscriminado das delações para “facilitar” o processo de investigação.

“Me parece, em um primeiro momento, acomodação. Eu vejo nas operações um certo exagero no número de delações. Não imagino, daqui para frente, processo penal sem delação premiada, mas ela também não pode ser utilizada simplesmente como uma alternativa mais fácil, mais eficaz para punir qualquer pessoa. Ela é adequada para poucos crimes e não um novo modelo processual penal”.

Defesa nega, mas especulação sobre delação de Silval persiste

Uma possível delação do governador Silval Barbosa tem sido especulada nos bastidores de investigações com proporção de ampliação de investigação sobre crimes no Executivo de Mato Grosso. A defesa do ex-governador já negou a suposta assinatura de acordos por três vezes, argumentando que não há interesse no repasse de informações sobre os supostos grupos.  

Silval Barbosa é apontado pelo Ministério Público do Estado como o chefe de esquemas montados no Palácio Paiaguás, com pagamento de propina dentro de banheiro e em malas executivas em dinheiro vivo, além de recebimento de objeto de lavagem de dinheiro.

A cifra milionária em propina provisória aponta para valores acima de R$ 17 milhões, somando as quantias nas quatro ações estaduais a que responde. A organização criminosa envolveria ex-secretários de sua gestão, empresários, empreiteiras e servidores de segundo escalão.

Em abril, o ex-governador divulgou acordo de delação e afirma que fará confissões sobre as acusações que pesam contra ele. Depois de quase dois anos presos, ele afirmou que irá assumir suas responsabilidades, confessando “fatos pontuais”.

"Naqueles processos em que as acusações forem injustas, continuarei me defendendo e a postura de confessar determinados fatos não se confunde com delatar pessoas”.

A audiência prevista para terça-feira (16) foi reagendada para 5 de julho. A decisão é do juiz Luiz Tadeu Rodrigues, da 2ª Vara Criminal, substituto da juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado de Cuiabá, que está em licença médica.

Leia mais: Interrogatório de Silval é adiado para julho; expectativa é que ele confesse crimes

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Após Silval decidir confessar crimes, advogados deixam defesa

Reinaldo Fernandes

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