A Advocacia-Geral da União (AGU) afirmou que a Lei Estadual nº 12.197/2023, conhecida como “Transporte Zero”, causará sérios prejuízos aos pescadores artesanais de Mato Grosso e, por isso, pediu que o Supremo Tribunal Federal (STF) anule a norma.
O parecer foi acostado no último dia 3 nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n° 7471, de autoria do partido Movimento Democrático Brasileiro, que pleiteou pela derrubada da lei. A norma foi sancionada pelo governador Mauro Mendes com o objetivo de combater a pesca predatória nos rios do Estado. Com isso, proibiu o transporte, comércio e armazenamento de peixes dos rios estaduais pelo período de cinco anos, a partir do dia 1º de janeiro de 2024.
Para a AGU, a ação merece prosperar, tendo em vista que o “Transporte Zero” viola dispositivos da Constituição Federal e invade a competência da União, que tem o poder de editar normas gerais sobre a pesca.
No documento, o órgão citou a Lei nº 11.959/2009, que delimita a esfera de competência dos Estados e do Distrito Federal, no que diz respeito ao ordenamento da atividade pesqueira em seus territórios. Porém, pertence ao Ministério da Pesca e Aquicultura a execução da formulação e normatização da política nacional sobre a questão.
“A legislação apresentada acima demonstra que o ordenamento jurídico brasileiro confere à União uma posição de protagonismo na regulação da atividade pesqueira, condição essa que, na prática, assume valor de verdadeira privatividade quanto a alguns aspectos”.
A Advocacia-Geral da União enfatizou, ainda, que o ordenamento pesqueiro deve considerar as peculiaridades e as necessidades dos pescadores artesanais, de subsistência e da aquicultura familiar, para garantir sua permanência e continuidade. Todavia, a lei de Mato Grosso prevê restrições desproporcionais, causando prejuízos à essa categoria, além de que afronta o princípio da dignidade da pessoa humana e da liberdade do exercício profissional e dos direitos culturais, comprometendo até a própria proteção do meio ambiente, conforme a AGU.
“Especificamente no que diz respeito ao período de severas limitações impostas pelo artigo 5º da lei impugnada, “que acrescenta a Seção I ao Capítulo IV – Das Modalidades de Pesca da Lei nº 9.096, de 16 de janeiro de 2009, com a inclusão dos arts. 19-A e 19-B, e seus respectivos parágrafos”, os subsídios encaminhados pelo Ministério da Pesca e Aquicultura destacam que a proibição de pesca comercial no Estado por um período de cinco anos acarreta impactos significativos nos aspectos socioeconômicos da região, especialmente a categoria dos pescadores e pescadoras artesanais”.
“Dessa maneira, torna-se evidente a necessidade de buscar uma harmonização, na medida do possível, das variáveis que compõem o conceito de desenvolvimento sustentável, o que não foi observado pelo legislador estadual. (…) Registre-se, mais uma vez, que a legislação sob invectiva atinge, de forma substancial, a atividade pesqueira no Estado do Mato Grosso, com graves restrições que podem perdurar por até cinco anos”, completou o órgão.
Para a AGU, a fixação de prazos proibitivos temporários, como a época da Piracema, quando é vetada a pesca em lagos e rios, garante que as atividades pesqueiras no estado sejam realizadas de maneira sustentável. Desta forma, não justifica a imposição de uma medida mais drástica.
“Como se percebe, a lei estadual impugnada, ao impor restrições desproporcionais aos direitos fundamentais dos pescadores, compromete o âmago de sua dignidade, e quiçá sua própria existência, o que constitui razão suficiente para o reconhecimento da sua inconstitucionalidade”, encerrou o parecer.
O processo tem como o ministro André Mendonça como relator. Após a manifestação da Procuradoria-Geral da República, a Corte do STF deve marcar o julgamento para decidir se irá suspender ou não os efeitos da lei.