Os morcegos dormem 20 horas por dia. As girafas e elefantes, quatro. Os humanos, com sorte, oito horas. Mas o que, afinal, determina o quanto um mamífero precisa dormir? A neurocientista Suzana Herculano-Houzel conseguiu chegar a uma resposta para essa pergunta universal a partir do cruzamento de dados do cérebro de 24 espécies de mamíferos, coletados durante dez anos em seu laboratório na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), com um banco de dados sobre o sono em diferentes animais. O resultado do estudo foi publicado nesta quarta-feira (23) na respeitada revista científica Proceedings of The Royal Society B.
Segundo a pesquisa, o número de horas de sono diminui universalmente entre mamíferos de acordo com a quantidade de neurônios por área do córtex cerebral. Quanto menor esta razão, menos um animal precisa dormir. Ao ganhar mais neurônios, os animais dormem menos e sobra mais tempo para se alimentar e obter mais energia, o que permite um crescimento maior do corpo na evolução.
"Esta é a primeira vez que alguém chega a uma explicação simples que relaciona o crescimento e evolução dos mamíferos com a quantidade de sono. Conseguimos uma hipótese fisiológica com um mecanismo plausível para responder a essa dúvida", afirma a pesquisadora. "Foi essa regra que permitiu que a gente estivesse aqui, senão, ainda seríamos toupeiras, com cérebros pequenos e dormindo a maior parte do dia", brinca Suzana.
A evolução das espécies de mamíferos com mais neurônios no córtex cerebral diminuiu a necessidade de se dormir tanto, e com isso, cresceram as oportunidades de alimentação – levando a corpos maiores. A capacidade de sustentar um corpo maior, com ainda mais neurônios no córtex, cria uma espiral ascendente que explica por que os mamíferos vão se tornando cada vez maiores na evolução.
Por que os bebês dormem muito?
A pesquisa pode explicar, ainda, por que os bebês dormem muito. "Quando você é pequeno, você tem uma densidade elevada de neurônios em um córtex pequeno e, por isso, dorme muito. Agora podemos dizer que os primeiros mamíferos na história evolutiva deviam dormir a maior parte do tempo e, por isso, só podiam ter corpos pequenos", explica Suzana.
O sono longo dos bebês é causado pelo próprio desenvolvimento do cérebro. Ao nascer, há uma alta densidade de neurônios e pequena superfície cortical (já que o cérebro ainda está crescendo). Conforme o cérebro amadurece, os neurônios crescem e a densidade por área cai, e os bebês passam a ficar mais tempo acordados e a comer mais. Com isso, o corpo cresce, o cérebro também, e o bebê passa a dormir ainda menos – até que o cérebro e o sono se estabilizam.
O exemplo pode ser verificado com ratos filhotes: eles dormem 95% do dia ao nascerem, mas duas semanas depois o sono é estabilizado para cerca de 12 horas por dia.
Fonte: UOL