Em fotos publicadas nas redes sociais, vestindo uniformes da corporação, eles mostram cartazes pedindo "menos cadeias e mais escolas". Segundo os policiais, o objetivo é romper estereótipos e gerar uma "discussão diferenciada" entre os próprios agentes de segurança pública.
Os criadores dizem que a iniciativa é independente e não reflete necessariamente a posição da corporação. Procurada, a Polícia Civil de Minas Gerais disse "respeitar a liberdade de expressão, como prevê a Constituição".
A campanha surge como resposta à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que tenta reduzir de 18 para 16 anos a idade a partir da qual infratores passariam a ser julgados como adultos.
Favorável à redução da maioridade penal, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), criou uma comissão especial que terá 40 sessões para para discutir a PEC.
Após este período, se considerada viável, a pauta também precisará ser avaliada em plenário.
Para o investigador Leandro César, um dos criadores da campanha, o posicionamento contrário à redução da maioridade penal reforça sua "responsabilidade social enquanto policial".
"Somos garantidores do direitos. Sob nosso ponto de vista, a tentativa de reduzir a maioridade penal vai resultar em um encarceramento em massa de uma classe que já é assolada pela desigualdade social", diz. "Não quero me tornar uma ferramenta pra isso", completa.
O investigador Fernando Marliere, também à frente iniciativa, lembra que todos os oficiais têm aulas de Direitos Humanos dentro das academias de polícia.
"Normalmente isso é visto como "bla bla blá", como besteira. Mas esse posicionamento é essencial pra quebrar o paradigma de polícia violenta, de polícia que não faz seu serviço de investigação e apela para a truculência", diz.
Repercussão
Segundo os envolvidos na campanha, as fotos geraram debate entre policiais de diferentes Estados pelo Facebook.
"Teve outros policiais defendendo a redução. Usaram aquele argumento do 'tá com dó, leva para casa'. Esse é o discurso mais raso que tem", critica Marliere. "O Estado não pode se omitir de suas obrigações com saúde, educação, cidadania, e deixar tudo isso a cargo da segurança pública."
Também houve quem concordasse com a campanha. "Vi gente dizendo que o Estado vai se tornar mais omisso ainda se colocar esses adolescentes em cadeias superlotadas", afirma.
Para o investigador Leandro César, as sanções impostas a jovens que cometem infrações não são efetivas. "O que ocorre aqui na maioria das vezes é a prestação de serviços comunitários. Isso às vezes expõe o adolescente perante a comunidade", afirma.
Marliere conta que, em operações de busca e apreensão que envolvem menores, costuma encontrar famílias desestruturadas e lares sob condições precárias de luz e saneamento.
"Muitas vezes são garotos que não têm pais, ou têm parentes viciados. A assistência social não chega nesses lares, só chega quando esses jovens cometem crimes graves. O problema é que aí já é tarde", diz.
"O que vemos aqui em Ouro Preto, como na maioria dos lugares, é que as medidas socioeducativas não são eficazes e os adolescentes perdem a oportunidade de se ressocializarem", afirma Leandro César.
O investigador Marliere lembra do caso de um menor de idade com diversas passagens pela delegacia por brigas, tráfico e desordem.
"Ele era liberado por ser menor e nunca nenhum trabalho social foi realizado na casa dele. Ele nunca foi encaminhado a uma pena alternativa. Um dia, numa briga em um bar, quebrou uma garrafa e passou no pescoço de um cara. Foi uma tentativa de homicídio. Aí botaram ele em uma instituição", conta. "Tarde demais."
Fonte: BBC BRASIL