Mais de dois meses após uma decisão judicial, Bernardo Betega de Assis, de sete anos, que sofre de um grave tipo de epilepsia, continua sem poder contar com o canabidiol para conter as suas crises de convulsão. De acordo com a mãe do menino, Susicler de Fátima Betega, uma liminar foi expedida no dia 4 de novembro do ano passado, determinando que os governos estadual e municipal pagassem o tratamento do garoto. Porém, até agora, a família, que é de Sorocaba (SP), vive a aflição de não poder contar com o medicamento no tratamento do garoto. "Já se passaram mais de dois meses e até agora não recebemos o remédio".
Por meio de nota, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo explica que, de fato, recebeu a notificação judicial sobre o caso do menino em novembro, mas a prescrição médica que indica o medicamento, procedimento imprescindível para iniciar a compra, foi entregue apenas no dia 19 de dezembro. "Assim que o documento foi entregue, a pasta iniciou o processo de compra do medicamento canabidiol. Informamos que o juiz responsável está ciente da necessidade de cerca de 90 dias para a compra e entrega do medicamento", explicou a secretaria estadual.
A Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo também ressaltou que, por se tratar de um medicamento importado, o processo de aquisição requer o cumprimento de uma série de etapas para viabilizar a compra, como desembaraço alfandegário por parte da Receita Federal.
O canabidiol foi retirado da lista de substâncias de uso proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no último dia 14 de janeiro, durante uma reunião em Brasília. Com a decisão, abriu-se o caminho para que a comercialização de medicamentos com a substância seja facilitada no país. Antes, a venda do produto com a substância, classificada como proibida, era vetada. Agora, as empresas interessadas poderão produzir e vender derivados de canabidiol após a obtenção de um registro da Anvisa.
Mas, mesmo antes desta decisão, a mãe de Bernardo alega que já tinha autorização do orgão para a compra do medicamento no exterior, o que ainda não aconteceu. "Eu fico aflita, porque enquanto isso meu filho tem crise todo dia, dez por dia, porque o remédio que ele toma não muda o quadro dele. Todos os remédios disponíveis para o caso, ele já usou, mas não funcionaram. Esse remédio [o canabidiol] é a nossa última tentativa para controlar as crises", desabafa a mãe.
A liminar também determina que o Estado cumprisse a determinação em 15 dias (a partir da data da expedição do documento, realizado no dia 4 de novembro de 2014). Caso contrário, estaria passível de multa de R$ 500 ao dia. "E mesmo depois de mais de dois meses, eu não tomei conhecimento de nenhum pagamento de multa. Parece que nada foi feito e eu tenho a cópia do processo em mãos, que mostra a determinação judicial para a compra do remédio."
Diante da demora para receber o medicamento, Sucicler foi na semana passada (dia 16), no Fórum da cidade de Sorocaba pedir ajuda e, segundo ela, o Estado foi novamente notificado para que cumprisse a determinação em um prazo de 24 horas. O que, mesmo depois de uma semana, não aconteceu. "Eu não sei mais o que fazer. Eu já tenho tudo em mãos. Já tenho a autorização da Anvisa, receita e relatório médico, com todas as informações do histórico do Bernardo. Tudo está certo, eles [Estado] têm em mãos toda a documentação necessária para comprar o remédio fora do país", frisa a mãe.
De acordo com a prescrição médica, Bernado passaria a ingerir, inicialmente, uma grama por dia do canabidiol. Cada bisnaga do medicamento contém 10 gramas, com custa aproximado de US$ 550 cada, valor que a família não disponibiliza para fazer a compra sem ajuda do governo. "Esse é o valor somente para dez dias, mas o tratamento mensal ficaria em torno de R$ 4.200, não tenho como comprar. Se tivesse, agora com a decisão da Anvisa, já teria comprado pelo menos para o primeiro mês, mas não é o caso."
A mãe ainda teme que, depois que a primeira remessa do medicamento seja entregue, a família ainda precise conviver com a medo de que não venha mais. "Eu fico com medo que todo mês seja uma luta para conseguir o remédio. Que todo mês eu precise entrar em contato com a Defensoria Pública, ir ao Fórum da cidade, para reclamar que, para o próximo mês, não tem mais remédio. Não quero iniciar o tratamento e parar ele assim. Não é justo com o Bernando", ressalta Susicler.
Entenda o caso
Bernardo foi diagnosticado com epilepsia ainda pequeno. Segundo a mãe, vários tratamentos já foram usados para tentar amenizar a chamada Síndrome de Lennox-Gastaut, que causa atrasos no desenvolvimento neurológico do menino. Bernardo também tem hematomas pelo corpo, porque cai muito devido aos espasmos.
A conquista da liminar é fruto de muita insistência. Até por conta disso, ela aconselha as demais mães a não desistir caso precisem de um tratamento semelhante para seus filhos. "Recebi vários nãos antes de conseguir o pagamento do remédio. É preciso pesquisar muito, porque os direitos dos deficientes não são muito divulgados. Depois que cheguei na Defensoria é que tomei conhecimento desta possibilidade", finaliza.
Fonte: G1