Olinda Altomare Opinião

Entre Ritos e Esperanças, a Psicologia do Recomeço

Há, no limiar de cada novo ano, um movimento silencioso que se repete na alma humana.

Como quem abre uma janela depois de um longo inverno, as pessoas sentem a necessidade quase instintiva de renovar as esperanças, reorganizar os sonhos e redesenhar o futuro com linhas mais suaves. Não se trata apenas de virar a página do calendário, mas de um gesto simbólico de recomeço, profundamente humano e psicológico.

Os ritos que acompanham essa passagem, como vestir determinadas cores, pular ondas, acender velas, formular desejos em silêncio, não são simples superstições: são linguagem da alma. Funcionam como pontes entre o que foi vivido e o que se deseja viver. Ao repetir esses gestos, o indivíduo comunica a si mesmo que ainda acredita, que não desistiu de esperar, que o amanhã pode ser melhor do que o ontem.

Olhando do ponto de vista psicológico, esses rituais organizam o caos interno, dando forma ao abstrato, oferecendo contorno às angústias e transformando desejos difusos em intenções conscientes.

Quando alguém busca sorte, dinheiro, saúde ou amor, na verdade está pedindo equilíbrio, segurança, vitalidade e pertencimento. São nomes diferentes para uma mesma busca: a de sentido e continuidade.

Planejar o novo ano é, assim, um ato de coragem. É admitir que o futuro é incerto, mas ainda assim digno de ser sonhado. É reconhecer as próprias fragilidades sem abrir mão da esperança. O plano não garante o resultado, mas sustenta o caminhar. Ele é bússola, não destino.

Esses ritos de passagem revelam algo essencial: o ser humano precisa acreditar que pode recomeçar. Precisa de marcos simbólicos que autorizem o perdão de si mesmo, a reconstrução dos afetos e a retomada dos projetos interrompidos.

 O ano novo oferece essa licença poética à existência.

E, talvez, a maior promessa não esteja na sorte, no dinheiro, na saúde ou no amor em si, mas na capacidade de, mais uma vez, levantar os olhos, respirar fundo e dizer, mesmo em silêncio: ainda há tempo. Ainda há caminhos. Ainda há esperança.

Feliz 2026 para todos.

Olinda Altomare é magistrada em Cuiabá e cinéfila inveterada, tema que compartilha com os leitores do Circuito Mato Grosso, como colaboradora especial. @aeternalente

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Olinda Altomare é magistrada em Cuiabá e cinéfila inveterada, tema que compartilha com os leitores do Circuito Mato Grosso, como colaboradora especial.

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