Mix diário

Dólar avança 1% com exterior e fiscal, mas recua mais de 2% na semana, Ibovespa cai 1,43%

O dólar encerrou a sessão desta sexta-feira, 8, em alta firme no mercado doméstico, alinhado à onda de valorização da moeda americana no exterior. O dia foi marcado por tombo das commodities, após decepção com estímulos na China, e sinais de que o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, vai adotar uma agenda mais protecionista.

Ao quadro externo desfavorável a divisas emergentes somou-se a cautela diante da expectativa pelo pacote de gastos em gestação no governo Lula, em meio a uma nova rodada de conversas no Palácio do Planalto entre o presidente e ministros. Parece estar em curso uma queda de braço entre a equipe econômica e os titulares de pastas sociais.

A leitura acima das expectativas do IPCA de outubro engrossa o caldo das apostas em uma taxa Selic ainda mais restritiva no fim do atual ciclo de alta. Na última quarta-feira, 6, ao elevar os juros de 10,75% e 11,25%, o Comitê de Política Monetária (Copom) afirmou que “uma política fiscal crível”, com “medidas estruturais” contribuiria para ancoragem das expectativas e “redução de prêmios de risco de ativos financeiros”.

Com máxima a R$ 5,7908, em sintonia com o ambiente externo, o dólar à vista fechou o dia em alta de 1,07%, cotado a R$ 5,7359. Na semana, a moeda americana acumulou desvalorização de 2,27%, em aparente correção e ajustes após ter atingido na sexta-feira passada, 1º, o segundo maior nível histórico nominal no fechamento (R$ 5,8694).

Apesar dos ruídos internos, o real apresentou hoje queda inferior a de seus pares latino-americanos, como os pesos mexicano e chileno. A moeda brasileira também encerra a semana com ganhos superiores a de outras divisas da região. Termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes, o índice DXY subiu cerca de 0,50% e voltou a superar os 105,000 pontos, com máxima aos 105,208 pontos à tarde.

O aumento do estresse no mercado global de moedas ao longo da segunda etapa de negócios foi atribuído a relatos de que Trump convidou Robert Lighthizer para se representante do Comércio dos EUA em seu segundo mandato. Lighthizer é conhecido por sua linha protecionista comercial.

A economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, ressalta que o dólar apresentou comportamento bem volátil no exterior ao longo desta semana, mas continua em níveis bem elevados mesmo após o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) cortar ontem os juros em 25 pontos-base, e uma reversão parcial das apostas especulativas pré-eleitorais.

“No cenário doméstico, o foco continua nas medidas relacionadas a corte de gastos. Até o momento não há uma resolução sólida, o que estressou o mercado”, afirma Damico, ponderando que, apesar disso, o real teve um desempenho superior a de seus pares, em parte pelo tom mais duro do Copom.

À tarde, o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, afirmou à CNN Brasil que Lula tem compromisso com o equilíbrio fiscal, mas não quer que os mais pobres arquem com o ajuste. “Para essa proteção social não faltará dinheiro”, disse Dias, que ontem, em nota, afirmou que não haveria cortes em “nenhum benefício” de quem tem direito ao Bolsa Família e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). A revisão no BPC é uma das medidas estudadas pela equipe econômica.

“Se esse pacote prometido pelo governo, que o mercado já vê com muita desconfiança, frustrar as expectativas, podemos ter novamente um dólar bem perto de R$ 5,90. Talvez o governo se veja obrigado a tomar medidas que descontentem sua própria base”, afirma o economista-chefe da Frente Corretora, Fabrizio Velloni, para quem hoje o ambiente externo dominado pela decepção com o pacote chinês e a perspectiva de volta a guerra comercial com a presidência Trump prejudicou as divisas emergentes.

Ibovespa

Passadas duas semanas desde o segundo turno das eleições municipais, o mercado segue à espera – em prazo ainda indefinido – de que o governo corrija a trajetória das contas públicas para que o arcabouço fiscal venha a ser cumprido. E a falta de novidades ao fim de mais uma semana sem anúncio de cortes de gastos manteve os ativos brasileiros na defensiva, tanto na Bolsa como também no câmbio e na curva de juros doméstica. Assim, o Ibovespa seguiu em baixa pelo terceiro dia, e em grau superior ao das duas sessões anteriores. Hoje, caiu 1,43%, aos 127.829,80 pontos, cedendo a linha dos 127 mil na mínima do dia, aos 126.972,83, o que o fez convergir, no intradia como no fechamento, para níveis do começo de agosto.

Em porcentual, foi a maior perda diária para o Ibovespa desde 20 de setembro (-1,55%). No pior momento da sessão, quando caía pouco mais de 2%, estava a caminho de seu maior tombo desde 21 de setembro de 2023, quando havia cedido 2,15% naquele fechamento. Na semana que ora chega ao fim, o Ibovespa recuou 0,23%, após perdas de 1,36% e de 0,46% nos intervalos precedentes. No mês, o índice da B3 cai 1,45%, colocando a perda do ano a 4,74%. O giro desta sexta-feira se manteve reforçado como nas últimas sessões, chegando hoje a R$ 30,0 bilhões.

Na B3, as perdas de Vale ON, a ação de maior peso no Ibovespa, foram a 4,61% no fechamento, tendo chegado a ceder mais de 5% durante a sessão, devolvendo o ganho em torno de 3,5% do dia anterior. O ajuste do índice foi relativamente contido em direção ao encerramento, com a melhora, do meio para o fim da tarde, observada em Petrobras (ON +1,82%, PN +1,89%), no dia seguinte ao balanço do terceiro trimestre e ao anúncio da distribuição de dividendos ordinários.

Dessa forma, o desempenho da estatal foi o ponto favorável, entre as ações de maior liquidez e peso no Ibovespa, em sessão marcada também por pressão no setor financeiro, com a perda em Itaú PN a 1,57% e em Bradesco a 1,07% (ON) e a 1,10% (PN) no fechamento. Na ponta perdedora do Ibovespa, destaque nesta sexta-feira para Alpargatas (-7,90%), Lojas Renner (-6,14%) e Usiminas (-6,02%). No lado oposto, Embraer (+7,47%) após o balanço trimestral, à frente de Natura (+2,90%) e de PetroReconcavo (+2,62%) no encerramento do dia.

Ainda mais do que os desdobramentos externos que não contribuem para emergentes como o Brasil – como a recente eleição do protecionista Donald Trump para mais um mandato na Casa Branca -, a atenção dos investidores segue concentrada em quanto ficará o pacote de cortes de gastos, e quando será anunciado – após a frustração de que algo emergisse tão logo passasse o segundo turno das eleições municipais. Frustrado o prazo de espera, o foco está no valor dos cortes, e qualquer anúncio abaixo de R$ 30 bilhões tende a decepcionar.

Nesta sexta-feira, o relato do ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deseja compreender “a redação de cada medida” do plano de corte de gastos proposto pela equipe econômica indica que o anúncio da decisão não esteja tão próximo. E pela rede social X, aguçando os ruídos, a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), fez uma série de críticas ao mercado financeiro, argumentando que não é “cortando benefícios do povo” para “pagar a conta” do aumento da taxa de juros que a inflação será combatida. Gleisi pediu que o Banco Central intervenha no mercado de câmbio.

“Está errada essa ciranda, e o presidente Lula tem toda razão em criticar e agir com cautela e responsabilidade diante de toda essa pressão. Foi eleito pelo povo e não pelo mercado”, acrescentou a presidente do PT. Durante a sessão, o dólar à vista foi negociado na máxima do dia a R$ 5,7908 e, no fechamento, mostrava alta de 1,07%, a R$ 5,7359. O dia foi de avanço também para a curva do DI.

Por outro lado, o ministro dos Transportes, Renan Filho, afirmou hoje, em entrevista à CNN Brasil, que o presidente Lula tomará a decisão sobre as áreas em que realizará cortes levando em consideração o que o ministro da Fazenda diz.

“Mais um dia difícil para a Bolsa brasileira, na contramão das bolsas americanas, que andaram hoje. E a contramão reflete novo adiamento desse pacote fiscal, que está virando uma grande novela mexicana”, diz Larissa Quaresma, analista da Empiricus Research. Em Nova York, os ganhos na sessão desta sexta-feira ficaram em 0,09% (Nasdaq), 0,38% (S&P 500) e 0,59% (Dow Jones), índices que avançaram entre 4,61% (Dow Jones) e 5,74% (Nasdaq) na semana, e sobem até 6,59% (Nasdaq) no mês.

“Cada bate-boca noticiado pela imprensa, cada ida e volta, tem gerado estresse, o que resulta em diminuição de posições em Bolsa”, acrescenta a analista, referindo-se indiretamente ao relato de que os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Trabalho, Luiz Marinho, teriam se desentendido em uma das reuniões de discussão sobre os cortes, diante do presidente Lula. Como fator externo, ela menciona certa decepção quanto ao pacote de estímulos na China, o que prensou as ações da Vale nesta última sessão da semana.

“O fraco estímulo chinês gerou uma queda nas commodities metálicas, que pressionou o Ibovespa abaixo”, destaca também Christian Iarussi, sócio da The Hill Capital, mencionando que o pacote de estímulos à maior economia asiática, mercado fundamental para a demanda global por matérias primas como o minério de ferro, ficou “aquém das expectativas”.

Para Bruna Centeno, advisor da Blue3 Investimentos, os dois fatores definidores da sessão também foram a decepção com a envergadura dos estímulos na China e, por aqui, a expectativa para o anúncio do pacote fiscal que “mais uma vez tomou o dia”, contribuindo para a alta do dólar e a abertura da curva de juros nesta sexta-feira. “Ânimos ainda não se acalmaram, e continuam a penalizar os papéis.”

Ainda assim, o mercado financeiro se mostra mais otimista quanto ao desempenho das ações no curtíssimo prazo, indica o Termômetro Broadcast Bolsa desta sexta-feira. Nenhum dos participantes disse esperar queda para o Ibovespa na próxima semana, enquanto para 83,33% o índice terá ganho. Os que preveem estabilidade são 16,67%. Na pesquisa anterior, a expectativa de alta tinha fatia de 62,50%; a de variação neutra, de 25,00%; e a de queda, de 12,50%.

Juros

Os juros futuros subiram nesta sexta-feira, refletindo reação ao IPCA de outubro e a espera pelo pacote de corte de gastos que já dura semanas. Os agentes têm lido a demora como mau presságio sobre o arranjo, o escopo e o ajuste em termos financeiros que o governo será capaz de fazer, tendo de convencer o presidente Lula e o Congresso.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2026 encerrou em 13,06%, de 13,01% ontem no ajuste, e a do DI para janeiro de 2027 subiu de 13,04% para 13,09%. O DI para janeiro de 2029 fechou com taxa de 12,92% (de 12,90%).

O dia hoje já começou com o pacote da China frustrando o mercado, seguido pelo IPCA de outubro, que superou a mediana das estimativas e rompeu com folga a banda superior da meta de inflação de 4,5%, o que, em outras circunstâncias, até poderia ser digerido ao longo do dia. Mas num clima de pessimismo sobre o pacote fiscal formou-se um combo a incutir cautela nos ativos. O efeito China bateu nas commodities e no câmbio, levando o dólar a voltar para perto de R$ 5,75, o que preocupa do ponto de vista da inflação e da política monetária.

O economista da MAG Investimentos Felipe Rodrigo de Oliveira diz que “a abertura ruim do IPCA hoje mostra que o trabalho do BC para trazer a inflação para a meta será bem difícil”, contribuindo para a abertura da curva. A inflação de 0,56% não somente veio acima da mediana das estimativas (0,54%), como em 12 meses a taxa de 4,76% superou em larga margem o teto da meta de 4,5%.

Mas ele considera que o ajuste na curva do DI não foi tão pesado quanto nos demais ativos. “Em comparação aos demais mercados, os juros parecem bem comportados. O mercado já aposta num ciclo de alta até 14% aproximadamente, com um cenário de inflação ao redor de 4% no médio prazo”, argumenta, lembrando que nesse cenário o juro real ex ante é de 10%. “Parece exagerado até para Brasil, mesmo considerando a grande incerteza fiscal que temos.”

“O IPCA de outubro foi ruim”, resumiu Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, citando o acumulado em 12 meses e a “aceleração com relação ao mês anterior em todos os dados qualitativos”. “Reforça a ideia de que o BC vai ter que elevar os juros mais do que esperávamos anteriormente. Ou seja, juntando a eleição de Donald Trump nos EUA, o comunicado mais duro do Copom e esse IPCA, só estamos esperando para ver se vem algo de bom neste pacote fiscal do governo, para revisar a nossa previsão atual de uma Selic de final de período em 12,50% e de 11,50% ao final de 2025”, disse.

O atraso no anúncio do pacote tem trazido angústia e pessimismo sobre o que será entregue de fato. “Um montante de R$ 40 bilhões, R$ 50 bilhões seria o mínimo para frear essa pressão”, afirma Eduardo Velho, economista-chefe e sócio da Equador Investimentos.

A reunião entre Lula e os ministros para discutir o corte de gastos foi retomada nesta tarde. O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, afirmou à CNN Brasil que o presidente quer compreender “a redação de cada medida” do plano e ele não é refratário ao compromisso fiscal, mas não deseja que a conta recaia para a população mais vulnerável.

Também para a CNN Brasil, o ministro dos Transportes, Renan Filho, afirmou que Lula deverá tomar a decisão levando em consideração o que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, diz. Segundo o ministro, Lula se esforça para “garantir o equilíbrio das contas públicas”, além de reiterar que o governo é “a favor do equilíbrio fiscal”.

Estadão Conteudo

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