Foto: Ahmad Jarrah/CMT
A juíza Selma Arruda, da Vara Contra o Crime Organizado da Capital, declarou como “inidônea” o imóvel apresentado como fiança pelo empresário Walter Dias Magalhães Júnior, presidente do Grupo Soy, que está preso no Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC), desde agosto do ano passado.
Em decisão proferida nesta terça-feira (14), a magistrada declarou que a documentação do imóvel rural denominado “Fazenda Santa Rita” – localizada no município de Jaciara – apresenta “fortes indícios” de irregularidades.
Walter Magalhães está preso em decorrência da Operação Castelo de Areia, sob a acusação de praticar estelionato e liderar organização criminosa que atraía investidores com falsas promessas, gerando prejuízo de mais de R$ 50 milhões.
A manifestação de Selma foi dada após o desembargador Orlando Perri, da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), cobrar esclarecimentos da juíza, quanto ao não cumprimento da decisão proferida em novembro do ano passado, que determinou a substituição da prisão preventiva por medidas cautelares, entre elas o pagamento de uma fiança no valor de R$ 6,1 milhões.
No despacho proferido na segunda-feira (13), Perri afirmou que Selma “afrontou” decisão do TJ-MT, pois não determinou a soltura de Walter Dias, mesmo com a solução das irregularidades apontadas pela juíza, quando não aceitou o imóvel como garantia do pagamento de fiança – o imóvel está no nome de Denisson Seabra, suposto amigo de longa data de Magalhães.
No entanto, em sua explicação ao desembargador, Selma afirmou que novas irregularidades foram constatadas, que apontam até para o envolvimento de Denisson em “eventual fraude”, envolvendo a prestação da fiança.
Fazenda não existe
Em sua decisão, Selma Arruda explicou que inicialmente, após analisar por duas vezes o imóvel, ela verificou a “inconsistência” dos documentos apresentados pela defesa do empresário.
“A primeira dizia respeito à procuração outorgada por Denisson Seabra para Regiane Cristina Souza Granja, que não possuía os requisitos do Art. 661, §1º, do Código Civil (fls. 1087); a segunda, que dizia respeito à nulidade da Escritura Pública de Declaração de Vontade firmada pelo Sr. Denisson Seabra, que foi lavrada por quem não detinha atribuição para tanto (fls. 1092/1093vº)”, declarou Selma, garantindo que a 1ª Câmara Criminal teve conhecimento das duas irregularidades.
A magistrada ainda declarou que a defesa de Walter Dias foi intimada do indeferimento do recebimento do imóvel como pagamento de fiança em dezembro de 2016. No entanto, só teria se manifestado 45 dias após sua decisão.
“De forma que eventual demora não pode ser atribuída ao Juízo, tampouco a esta magistrada”, disse.
De acordo com a juíza, as irregularidades apontadas por ela só foram sanadas no recurso interposto no TJ-MT.
“Registro que, pelo que se extrai da decisão proferida pelo relator do Habeas Corpus na data de ontem, tal dúvida parece ter sido sanada em 2ª Instância, com a juntada de documentos pela defesa, tais como um Ofício do 1º Serviço de Registro de Imóveis e de Títulos de Documentos de Jaciara e de cópia atualizada da matrícula n. 49.900, do Cartório do 5º Ofício desta Comarca, documentos que não foram trazidos para estes autos”, afirmou.
Ainda em sua decisão, Selma disse que determinou a avaliação judicial do imóvel, logo que as inconformidades anteriormente constatadas foram sanadas. Segundo a magistrada, tal avaliação trouxe um novo cenário.
Selma declarou que o laudo elaborado pelo oficial de Justiça Josias Melo de Almeida diz que a área está toda utilizada com plantação de cana, de propriedade de Denisson Seabra.
No entanto, de acordo com a juíza, a informação prestada pelo oficial não é verdadeira.
“Essa informação prestada pelo Oficial de Justiça parece não ser verídica, eis que, em consulta ao Sistema Integrado de Informações sobre Operações Interestaduais com Mercadorias e Serviços – Sintegra – Sefaz/MT , ao lançar o CPF do Sr. Denisson Seabra (345.698.551-72), têm-se a informação de que referida pessoa ‘não é produtor rural’”, disse.
A juíza também relatou que membros do Ministério Público Estadual (MPE) estiveram na área e constataram que a fazenda denominada “Santa Fé” não existe.
Além disso, o relatório do MPE também apontou que Denisson não é conhecido na região.
“A área ofertada em garantia seria sobreposta às áreas de propriedade e que são cultivadas pela Usina Porto Seguro”, diz trecho do relatório do MPE.
Por fim, Selma Arruda declarou que age no “estrito cumprimento” da lei, visando evitar que o próprio Poder Judiciário se transforme e “mais uma vítima” das fraudes atribuídas a Walter Dias.
“Eis que, não obstante o arbitramento da fiança seja superior a R$ 6 milhões, a garantia parece não passar de um pedaço de papel sem qualquer valor. Agir de forma açodada, sim, certamente causaria dano ao erário, eis que nenhuma garantia efetiva foi prestada pelo réu até o momento”, pontuou.
Castelo de Areia
Deflagrada pela Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO) e o Núcleo de Inteligência da Delegacia Regional de Cuiabá, unidades da Polícia Judiciária Civil, a operação Castelo de Areia levou a prisão de cinco membros de uma suposta organização criminosa que lucrou mais de R$ 50 milhões, por meio de crimes de estelionatos operados pela empresa Soy Group, com sedes em Cuiabá e Várzea Grande.
Em um dos golpes, uma vítima afirma que o vice-presidente da empresa Soy Group, o advogado João Emanuel, teria utilizado um falso chinês para convencê-lo em um suposto investimento com parceria com a China, fazendo com que o investidor emitisse 40 folhas de cheque, que juntas somam o valor de R$ 50 milhões. O ex-vereador fingiu ser intérprete e falar mandarim.
O Ministério Público ofereceu denúncia contra oito pessoas, por constituição de organização criminosa e estelionato.
Na ação, além de Emanuel, também são réus: o irmão do ex-vereador, o advogado Lázaro Roberto Moreira Lima; o pai dos dois, o juiz aposentado Irênio Lima; os empresários Walter Dias Magalhães Júnior, sua mulher Shirlei Aparecida Matsouka Arrabal, e Marcelo de Melo Costa; o contador Evandro José Goulart; e o comerciante Mauro Chen Guo Quin.
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