Economia

Relatório do governo omite R$ 2,4 bi em previsões de gastos 2014

O relatório do quarto bimestre — no qual o governo informa os ajustes que fará nas contas públicas até o fim do ano para garantir a realização do superávit fiscal primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) — omite pelo menos R$ 2,4 bilhões em despesas que precisam ser pagas este ano, segundo análise de técnicos da Consultoria de Orçamento da Câmara. Além disso, o relatório subestima o déficit da Previdência Social, como informou o GLOBO esta semana.

A avaliação de receitas e despesas da União no relatório, na visão desses técnicos, é uma verdadeira peça de ficção. Nos gastos “esquecidos”, eles apontam R$ 1,9 bilhão relativo ao repasse que a União faz aos estados como compensação da Lei Kandir, que isenta de ICMS as exportações de produtos primário e semi-industrializados. Já outros R$ 500 milhões são parte do pagamento que o Tesouro Nacional deveria fazer ao FGTS pelo recolhimento da multa de 10% que é paga pelas empresas em casos de demissão sem justa causa.

Segundo os técnicos, a equipe econômica adiou de 2013 para 2014 uma parte dos R$ 3,9 bilhões que são pagos anualmente pela Lei Kandir. No ano passado, só foram ressarcidos R$ 2 bilhões. No entanto, a proposta orçamentária deste ano só prevê o pagamento dos R$ 3,9 bilhões do ano de 2014.

— O total de R$ 1,9 bilhão que restou de 2013 não está na projeção. Isso significa que a despesa deste ano será maior ou que o governo vai novamente adiar parte do pagamento para 2015 — explicou um integrante da consultoria.

Quanto ao FGTS, o Tesouro fez um acordo com o Conselho Curador do Fundo para pagar valores referentes à multa de 10% que estavam atrasados. O total acertado para 2014 era de R$ 900 milhões, mas o Orçamento só prevê R$ 400 milhões.

Outro problema, apontam os técnicos, está nas despesas com abono e seguro-desemprego, projetadas em R$ 43 bilhões para 2014. Ele lembram que, no ano passado, esse gasto somou R$ 44 bilhões.

— Se houve aumento do salário mínimo este ano, como é que o governo vai gastar menos em 2014? Isso é muito difícil — questionou o técnico.

Algo semelhante ocorre com a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cujas despesas previstas para o ano foram reduzidas em R$ 4 bilhões, de R$ 13 bilhões para R$ 9 bilhões, no relatório bimestral. Os técnicos destacam que os desembolsos com a CDE, que subsidia a desoneração das contas de luz e o uso de energia térmica no país, devem atingir R$ 9 bilhões antes do fim do ano, mas o quadro do setor elétrico continua difícil em função da falta de chuvas. Por isso, é pouco provável que a despesa com esse subsídio se limite a R$ 9 bilhões.

Receitas superestimadas

Também há problemas na estimativa de receitas, pois algumas dificilmente devem se confirmar. Um exemplo está na rubrica operações com ativos (que inclui a venda de imóveis da União), estimada em R$ 3,2 bilhões. Essas operações entram na projeção de arrecadação desde 2005, mas só rendem valores residuais.

Os especialistas apontam ainda uma superestimativa nas receitas com royalties do petróleo. Isso porque, segundo levantamento feito junto ao Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), a arrecadação com royalties e compensações financeiras até agosto foi de R$ 27,8 bilhões, sendo que a estimativa do governo é de que esse número chegue a R$ 47,9 bilhões até o fim do ano.

— Teria que conseguir arrecadar R$ 20 bilhões em quatro meses. O calendário de pagamento de royalties muda pouco ao longo do ano. É pouco provável que se consiga isso. Essa arrecadação está superestimada em cerca de R$ 5 bilhões — disse o integrante da consultoria da Câmara.

O governo vem enfrentando dificuldades para fechar as contas devido ao fraco desempenho da economia, o que prejudicou a arrecadação. Ao mesmo tempo, as despesas estão elevadas e o governo evita fazer cortes, especialmente em 2014, que é um ano eleitoral. O compromisso da equipe econômica é realizar um superávit primário de R$ 99 bilhões, ou 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país). No entanto, até julho essa poupança está em apenas R$ 24,7 bilhões. O Tesouro foi procurado para comentar o assunto, mas não se manifestou.

O Globo

Redação

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