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PORTO SEGURO – Relator do processo que pode levar à cassação do presidente Michel Temer e à convocação de uma nova eleição, o ministro Herman Benjamin, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), disse que ficou impressionado com o que ouviu até agora de testemunhas de acusação no âmbito da ação que apura, entre outras coisas, se a chapa encabeçada por Dilma Rousseff em 2014 recebeu dinheiro desviado dos cofres da Petrobrás. O ministro considera os valores desviados "espantosos" e ficou impressionado com a forma com que o esquema era visto com naturalidade pelos seus agentes – algo que define como "normalidade da corrupção".
"Os valores são espantosos, às vezes, eu repetia a pergunta (nos depoimentos) pra saber se eu estava entendendo bem, pra saber se eram bilhões ou milhões. A dimensão é enorme. São valores estratosféricos. Nós, seres humanos normais, não temos condição de avaliar o que se pode comprar com aquilo", afirmou Benjamin a jornalistas, depois de se reunir com o juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato na primeira instância. Os dois participaram do VI Encontro Nacional de Juízes Estaduais (Enaje), em Porto Seguro.
"Vocês conhecem a expressão de Hannah Arendt, a 'banalidade do mal' (expressão usada pela filósofa alemã para analisar o comportamento de agentes nazistas no extermínio de judeus). Aqui era a 'normalidade da corrupção'. Já vi casos graves de corrupção, mas nada nesse patamar de volume", completou Benjamin, ressaltando que o assombro se refere não apenas à Petrobrás, mas também às supostas irregularidades na construção da usina hidrelétrica de Belo Monte e de Angra 3. Também chamou a atenção do ministro os diferentes termos usados pelas testemunhas para se referir ao dinheiro da corrupção, definido como "comissão" e "taxa padrão".
Entre as 25 testemunhas de acusação já ouvidas pelo TSE estão ex-diretores da Petrobrás, executivos de empreiteiras e lobistas, muitos deles delatores da Operação Lava Jato. Nesta semana, serão ouvidas testemunhas de defesa de Dilma, como Edinho Silva e Giles Azevedo, respectivamente ex-tesoureiro da campanha de 2014 e ex-chefe de gabinete da petista.
"Este é o maior processo da história do TSE. Não é só o maior processo na minha história como juiz, mas sim de todos. O TSE nunca julgou uma cassação de uma chapa presidencial eleita. Mas em relação a maior ou menor rapidez, eu imprimo a este processo o ritmo que eu acho que o caso merece", comentou o ministro.
Se o processo for concluído ainda neste ano e o plenário do TSE decidir pela cassação da chapa Dilma/Temer, novas eleições diretas serão convocadas. Fontes que acompanham a investigação, no entanto, afirmaram ao Estado que o julgamento deve ficar para 2017, o que levaria, em caso de decisão pela cassação, à realização de eleições indiretas no Congresso Nacional para definir o sucessor de Temer.
"Será um julgamento técnico. O meu voto, qualquer que ele seja, será técnico e sem prejulgamentos. Sei que muita gente gostaria que o TSE se transformasse em um tribunal político… a Justiça Eleitoral brasileira é um dos principais suportes da nossa democracia e os juízes eleitorais não podem se transformar em juízes de exceção", disse Benjamin.
"Isto aqui não é um processo de impeachment do Congresso Nacional, em que há um componente jurídico, mas também há um componente político."
Indagado se seria possível dividir o processo, estabelecendo diferentes penalidades para Dilma e Temer, o ministro desconversou: "Você vai ter que aguardar pelo meu voto. Não vou responder a essa pergunta. Não adianto voto de jeito nenhum."
Segundo o ministro, que determinou a quebra do sigilo de três gráficas contratadas pela chapa Dilma/Temer, a colaboração com a Receita Federal, Polícia Federal e o Banco Central está sendo "excepcional". "Eu não enfrentei até agora, nenhum obstáculo neste caso do TSE. A equipe inteira do TSE está trabalhando por determinação do próprio presidente (ministro Gilmar Mendes)", disse Benjamin.
Otimismo. Apesar do espanto com as cifras envolvidas nos depoimentos, o ministro demonstra otimismo com os rumos do País. "Imaginávamos estar fundando o Estado de direito com a Constituição de 1988 e hoje vejo que em 1988 gestamos o Estado democrático de Direito. Estamos fundando o Estado de direito agora, com a crise política pela qual estamos vivendo e as investigações, punições e o fato de não haver uma única gota de sangue derramada", concluiu Benjamin, que dispensou a sugestão da Polícia Federal de ter um guarda-costas. "Nunca tive nenhuma situação de medo, vou a qualquer lugar", afirmou. Questionado sobre os seus hábitos do dia a dia, o ministro explicou: "Vocês sabem que não frequento restaurantes, nada disso, quando falo qualquer lugar é o supermercado."
Fonte: Estadão