BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Após quatro meses de resultados positivos, os saques em caderneta de poupança superaram os depósitos em R$ 5,46 bilhões em agosto. O dado foi divulgado pelo BC (Banco Central) nesta segunda-feira (6).
Este é o primeiro resultado negativo desde o retorno do auxílio emergencial, em abril.
Em julho, a poupança teve entrada líquida de R$ 6,37 bilhões.
Nos três primeiros meses de 2021, quando ainda não haviam começado os pagamentos da nova rodada do benefício, os números vieram negativos em R$ 27,5 bilhões. A partir de abril, a captação da caderneta voltou a ser positiva, com R$ 3,8 bilhões.
Em maio, a entrada líquida foi mais baixa, de R$ 72,6 milhões, mas permaneceu positiva. Em junho, a poupança registrou a maior captação do ano, com R$ 7 bilhões.
Em agosto, os brasileiros depositaram R$ 295,9 bilhões na poupança e sacaram R$ 301,3 bilhões, segunda maior retirada do ano.
Mesmo com o resultado negativo, o saldo, que é todo o montante investido na modalidade, permaneceu superior a R$ 1 trilhão no mês. O estoque alcançou a marca pela primeira vez na história em setembro do ano passado com o aumento expressivo da captação líquida -diferença entre entradas e saídas.
Desde o início da pandemia, os resultados da caderneta são impactados pelo pagamento do auxílio emergencial.
Os valores são pagos por meio de conta-poupança digital da Caixa Econômica Federal, o que ajudou a explicar o movimento de forte alta na captação líquida ao longo de 2020, que bateu recorde com R$ 166,3 de entradas líquidas.
Após a chegada do vírus ao país, em março do ano passado, a caderneta registrou valores elevados em captação líquida nos meses seguintes, em comparação ao restante da série.
No ápice da crise, em abril de 2020, a captação da poupança bateu recorde, com R$ 30,4 bilhões. O resultado foi superado em maio daquele ano, com R$ 37,2 bilhões, o maior da série histórica até agora.
Em agosto, no entanto, mesmo com o pagamento do benefício, que manteve o nível de depósitos elevado, os brasileiros sacaram mais recursos da modalidade.
A caderneta rende a TR (Taxa Referencial), hoje zerada, mais 70% da Selic, que está em 5,25% ao ano.
A regra prevê que, quando a taxa básica de juros estiver acima de 8,5% ao ano, o rendimento da poupança seja de 0,50% ao mês, mais a TR. Caso a taxa Selic esteja menor ou igual a 8,5% ao ano, o investimento é remunerado a 70% da Selic, acrescida da TR.
O economista Marcelo Neri, diretor do centro de estudos FGV Social, atribuiu o resultado negativo da poupança em agosto à inflação, que corrói o poder de compra, ao desemprego e a perda de renda do trabalhador nos últimos meses.
Com o orçamento mais apertado, os brasileiros precisaram recorrer à poupança para conseguir pagar as contas.
"São perdas e as pessoas precisam recorrer aos fundos que possuem. A maior parte recorre a amigos e parentes. 61% dos mais pobres dizem que essa é a principal forma de lidar com incertezas, mas como todos passam por dificuldade, um não consegue ajudar o outro e é preciso sacar das reservas. A poupança continua sendo o ativo mais popular", ressaltou.
Neri pontuou que a perda média de renda na pandemia foi de 9,4%.
"Os indicadores são ainda piores nas classes de renda mais baixa. A taxa de desemprego entre os mais pobres chega a 35% e a perda de renda a 21%, em relação ao começo da pandemia [de Covid-19]", explica.
O economista lembrou ainda que a primeira rodada do auxílio, paga entre abril e dezembro do ano passado, tinha valor maior e permitiu que alguns guardassem dinheiro para fazer frente a dificuldades financeiras no futuro.
"Passamos por uma situação de extrema incerteza, a taxa de pobreza foi multiplicada por três de agosto de 2020, no auge do auxílio, para março de 2021, quando foi interrompido. Essa montanha russa implicou na necessidade das pessoas pouparem recursos e a poupança teve captação recorde no ano passado", disse Neri.
A nova rodada do auxílio, que começou a ser paga em abril deste ano e vai até outubro, tem valor menor que a primeira versão, inicialmente de R$ 600 e depois reduzido para R$ 300. Dessa vez, o benefício tem valor médio de R$ 250, mas pode ser de R$ 150 ou R$ 375, dependendo do tamanho da família de quem recebe.
Arnaldo Lima, economista e diretor de estratégias públicas do MAG (Mongeral Aegon Group), ponderou que o rendimento da poupança é menos atrativo que de outros investimentos, o que pode ter incentivado os saques.
"Desde 2012 a rentabilidade da poupança está atrelada à 70% da Selic quando está abaixo de 8,5%, o que não deve mudar até o ano que vem. Nesse último ano a rentabilidade foi negativa, porque a taxa de juros ficou baixa e a inflação não permitiu que houvesse ganho real", disse.