As maiores operadoras de planos de saúde do Brasil inauguraram nesta quarta-feira (7), em parceria com o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), uma sala no Fórum João Mendes Júnior, o maior do País, para oferecer acordo aos clientes que as processam em busca de atendimento de urgência. A seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) vê risco aos consumidores, questionará os servidores responsáveis pela iniciativa e não descarta ir à Justiça para bloqueá-la.
O Núcleo de Apoio Técnico e Mediação (NAT), como é chamado, começou a funcionar sem a presença de um profissional da área da saúde para auxiliar os juízes sobre as ações, como estava previsto. Esse serviço depende de um acordo com a USP e a Unifesp que ainda não tem data para ser fechado.
Com isso, o órgão é composto por duas funcionárias bancadas pela Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge) e a Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde), representantes das gigantes do setor como Amil, Allianz, Bradesco Saúde e SulAmérica.
O papel dessas funcionárias é, ao serem comunicadas por servidores do setor de conciliação do TJ-SP, informar as operadoras de que há um processo com pedido de liminar – decisão provisória de urgência – contra essas empresas.
Os advogados das operadoras poderão, então, consultar o processo pela internet e apresentar uma proposta de acordo que, se aceita pelo cliente, extingue o ação. Se não houver conciliação, o pedido liminar será julgada pelo juiz. A negociação, que será mediada pela equipe de conciliação do Tribunal, deve ser feita em 24 horas, no máximo.
"Tudo o que está na lei nós somos obrigados a dar e damos. Nós não somos contra. Agora, aquilo que a pessoa não tem direito, não pode requerer", argumenta Pedro Ramos, da Abramge. "A ideia é aproximdar [as empresas dos clientes]."
Mudança
Esse sistema difere do que está previsto no termo de cooperação de criação do NAT, firmado por TJ-SP, Abramge e Fenasaúde, em 13 de abril, após uma tramitação em regime de urgência.
Tal texto prevê que o núcleo faça a proposta de acordo "por parte da operadora" alvo do processo, o que disparou críticas de associações de juízes, advogados, pacientes, além da OAB e de um promotor do Ministério Público de São Paulo (MP-SP). Todos apoiaram um abaixo-assinado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) que reuniu 2,5 mil assinaturas.
Juíza-assessora da presidência do TJ-SP, Deborah Ciocci argumenta que há "alguns ajustes" em andamento e que um novo termo de cooperação vai ser assinado, possivelmente nesta semana. Ela nega favorecimento às operadoras e alega que o núcleo é necessário para agilizar o contato com as empresas.
"[Os funcionários do NAT] não vão palpitar no processo. Foi isso que as pessoas não entenderam direito e nos atacaram, dizendo que a gente estava com funcionários bancados pelas associações. Não é real", diz, ao iG. "Os conciliadores são nossos, são pessoas habilitadas que fizeram curso de conciliação. Eles [do NAT] estão aqui para viabilizar um contato rápido com a operadora."
Presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-SP, Marco Antonio Araujo Junior diz não ver "efetividade" e "necessidade" do NAT como um mero sistema de agilização de contatos.
"Isso não é mediação", diz o advogado. "A OAB tem interesse que haja o NAT [mas] vamos oficiar os responsáveis pelo núcleo para que possa entender melhor. Se notarmos que não avançamos, vamos analisar o cabimento de alguma medida judicial."
Ator de um estudo sobre NATs dedicados a ações contra o Sistema Único de Saúde (SUS) e professor assistente da Universidade Federal de Juiz de Fora, Siddartha Legale Ferreira acredita que, sem a possibilidade de propor acordo – como esta previsto no documento de criaçao do orgão -, o núcleo criado no TJ-SP tem um formato adequado.
"Ficou mais interessante, gera um ambiente mais propício para se chegar a um acordo de forma consensual, de forma mais cooperativa", diz.
Sem técnicos
Ferreira afirma que todos os NATs que conhece têm ao menos um profissional da área da saúde, dedicado a auxiliar o juiz em questões técnicas sobre o tratamento ou remédio exigido pelo cliente e negado pela operadora.
O TJ-SP, entretanto, não conseguiu encontrar um profissional para desempenhar essa função – prevista no termo de criação do NAT. Por isso, a função de apoio técnico não será desempenhada por enquanto.
"Tivemos uma dificuldade muito grande de localizar um funcionário do Tribunal de Justiça que soubesse de todas as áreas [da medicina]", afirma o juiz Ricardo Pereira Júnior, responsável pelo centro de conciliação ao qual o NAT está vinculado. A função, argumenta o juiz, será desempenhada à distância por representantes da Unifesp e do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.
Em nota, a Unifesp informou que existe "um protocolo de intenções para cooperação entre as duas instituições, porém com objetivo muito mais amplo do que a simples emissão de pareceres sobre planos de saúde", e que nao há data prevista para a assinatura.
A USP nao se pronunciou.
Fonte: iG