Cemitério Araçá recebe tour gratuito sobre figura central do filme “Ainda Estou Aqui” neste domingo (16)
O túmulo da advogada Eunice Paiva, retratada no filme “Ainda Estou Aqui”, que concorre em três categorias do Oscar 2025, virou ponto turístico em São Paulo. Isso porque o projeto Araçá e Suas Vozes, da historiadora Viviane Comunale e do pesquisador Thiago de Souza, promove uma visita ao local, no Cemitério Araçá, neste domingo (16), a partir das 10h15. A iniciativa também é parceira da concessionária Cartel SP.
A ideia do passeio é contar a história do Brasil por meio do legado de personalidades renomadas. “O passeio é um exercício para contar as histórias do Cemitério Araçá a partir das histórias que ele guarda”, conta Thiago de Souza, idealizador do projeto O Que Te Assombra?, que aborda as histórias misteriosas acerca do centro de São Paulo.
No caso de Eunice, que morreu em 13 de dezembro de 2018, é sobre o símbolo que ela se tornou contra a ditadura militar e pela defesa dos direitos humanos. Em nota, ele diz ser importante revisitar a história da advogada para entender a formação do Brasil.
“Eunice foi mais uma das milhares de pessoas que sofreu por não ter, sequer, o direito de sepultar seu companheiro, além de toda a violência e de tudo o que tinham para viver após o desaparecimento de Rubens Paiva”, fala Thiago.
Fundado em 1887, o cemitério fica entre os bairros do Pacaembu e Pinheiros, em São Paulo. O local também abriga obras de artistas como Victor Brecheret, Eugênio Prate e Gildo Zampol. Além disso, os túmulos das atrizes Cacilda Becker e Nair Belo e do empresário da comunicação Assis Chateaubriant ficam lá.
O passeio mediado é gratuito, mas é necessário realizar inscrição com antecedência. A organização ainda pede arrecadação voluntária de alimentos para instituições assistenciais.
Quem foi Eunice Paiva?
O filme “Ainda Estou Aqui” é uma adaptação do livro homônimo escrito por Marcelo Rubens Paiva. A história se passa na década de 1970, no período mais intenso da ditadura militar no Brasil, e acompanha a trajetória da família Paiva, composta por Rubens (Selton Mello), Eunice (Fernanda Torres) e seus filhos.
Eunice Paiva nasceu em São Paulo e cresceu no bairro do Brás, segundo informações do dossiê Memórias da Ditadura, reunido pelo Instituto Vladimir Herzog.
Eunice se casou com Rubens Paiva e os dois tiveram cinco filhos: Marcelo Rubens Paiva, Vera Paiva, Maria Eliana Paiva, Ana Lúcia Paiva e Maria Beatriz Paiva.
A família morava no Rio de Janeiro quando, em janeiro de 1971, os militares levaram ela, o marido e a filha Eliana ao Destacamento de Operações e Informações (DOI) do Exército. Eliana ficou presa por 24 horas, enquanto Eunice permaneceu por 12 dias, submetida a interrogatório.
Após ser liberada pelos militares, Eunice Paiva começou a busca pelo paradeiro do marido, que nunca mais foi visto.
Ela começou a cursar direito em 1973 e se tornou advogada com forte atuação nas políticas indígenas do país. Paiva também atuou como uma das pessoas que pressionaram o governo para a promulgação da Lei nº 9.140, instituída pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso em 1995, que determinou que as pessoas desaparecidas pela Ditadura Militar fossem consideradas mortas e fosse possível, finalmente, que as certidões de óbito fossem emitidas.
Após 25 anos, ela conseguiu apenas em 1996 que o país emitisse o atestado de óbito de Rubens Paiva.
Ainda segundo o Instituto Vladimir Herzog, Eunice Paiva fundou o Instituto de Antropologia e Meio Ambiente (IAMA), em prol da defesa e autonomia dos povos indígenas, em 1987. Em 1988, foi consultora da Assembleia Nacional Constituinte, que promulgou a Constituição Federal Brasileira.
A Comissão Nacional da Verdade, órgão criado para apurar os crimes da Ditadura Militar no país, foi criada em 2012 e, após pesquisa e depoimentos colhidos, elaborou um relatório que buscava responder às famílias dos desaparecidos.
Segundo informações da Comissão da Verdade, Rubens Paiva foi torturado de forma “extremamente violenta”, que “pode ter sido a causa principal da morte”. Isso só se tornou público e a resposta só foi dada à família de Rubens Paiva em 2014.
Eunice Paiva morreu em 13 de dezembro de 2018, aos 86 anos — apenas quatro anos após ter recebido a resposta oficial do que aconteceu com o marido. Coincidentemente, ela também morreu na data que marcou os 50 anos desde a promulgação do Ato Institucional de Número 5 (AI-5), considerado o mais violento da Ditadura Militar e que foi utilizado para legalizar a tortura durante o regime.
Eunice Paiva lutou contra a doença de Alzheimer nos seus últimos 14 anos de vida.
*Com informações de Giovanna Bronze e Mariana Grasso, da CNN
Foto Capa: Divulgação/Thiago de Souza