Os surdos são muito visuais. Nós usamos a linguagem de sinais e a leitura labial para nos comunicar e socializar. Por isso, a ideia de perder nossa visão é bastante intimidadora.
Um estudo feito por pesquisadores da Universidade Western Ontario e divulgado na publicação especializada Nature Neuroscience mostrou que os surdos podem ampliar sua visão periférica, compensando seus problemas de audição.
Mas há um grupo de surdos que convive com a certeza de que sua visão vai, cedo ou tarde, se perder. Os portadores da síndrome de Usher nascem surdos e, por conta de um problema chamado retinite pigmentosa, acabam perdendo a visão também.
Locais escuros
Dessa maneira, a visão periférica fica restrita, ver à noite se torna um problema e ao passar de um local escuro para outro iluminado (e vice e versa) é preciso muito mais tempo para se adaptar.
Mas o talvez o mais triste – e isolador – é ver chegar ao fim uma maneira fácil de se comunicar. Leitura labial se torna algo difícil, assim como entender linguagem de sinais.
Quando você tem uma visão limitada, pode ser cansativo concentrar em pequenos movimentos.
Há maneiras para que os surdos se comuniquem com os surdos-cegos facilmente, afirma Rebecca Atkinson, uma jornalista britânica que tem a síndrome de Usher.
Ela cita a linguagem de sinais, mas sugere também deixar o surdo-mudo colocar as mãos próximas às de quem está fazendo os sinais, para que ela possa sentir as formas.
Mas ela afirma que a pior coisa em se ter essa síndrome é a falta de motivação dos surdos em se comunicar com os que também têm problemas de visão.
"Os surdos sabem muito bem como é ser tratado com condescendência por pessoas que não têm problema de audição, em situações como ser chamado de corajoso por lidar com a surdez", conta Rebecca. "Mas, muitas vezes, é exatamente esse tratamento que os surdos que têm problema de visão recebem dos surdos, uma cruel ironia."
Sem esforço
Des Materson também está perdendo a visão e, assim como Rebecca, ele também percebeu problemas para se comunicar. Segundo ele, não é a doença que causa isso, e sim a maneira como os surdos o tratam agora, sendo que muitos não se esforçam mais para conversar com ele.
Ver o número de amigos e colegas diminuírem também é um problema enfrentado por Molly Watt.
Ela conta que, quando adolescente, frequentava uma escola para surdos. Na época, ela já tinha problemas de visão. Então, ela tinha de sentar na frente para ver melhor os professores e a lousa.
"Mas meus colegas estavam frequentemente questionando se minhas necessidades eram reais, o que fazia com que eu mesmo me questionasse", diz.
Cada pessoa que sofre com a síndrome de Usher tem problemas diferentes. Apesar de serem muitas vezes denominados surdos-mudos, alguns nascem com um problemas de audição leve, outros são totalmente surdos. Alguns perdem a visão rapidamente ao ponto de ficarem cegos na adolescência, enquanto outros conseguem enxergar até o fim da vida.
Menos barreiras
Muitos dos que sofrem com essa síndrome contam que nem tudo é complicado e triste e que a vida pode ser feliz e com amigos. Mas dizem que tudo seria mais fácil se as barreiras de comunicação não fossem tão grandes.
Há maneiras simples pelas quais tanto surdos e pessoas sem problemas de visão podem facilitar as conversas com surdos-mudos, afirma Rebecca.
Encontrar lugares iluminados é um bom exemplo, assim como falar a uma distância mais próxima, para que o surdo-mudo possa ver tanto o rosto (e ler os lábios) e as mãos (para ver os sinais).
Mas mais do que qualquer coisa, é uma comunicação que precisa de tempo, paciência ecompreensão.
É claro que é mais fácil não fazer nada, mas isso não ajuda.
Ou, como Molly diz: "Todo mundo quer conversar, ninguém quer ser deixado de lado, excluído."
Talvez o maior obstáculo para os surdos seja o medo. Ver uma pessoa surda com um cão-guia ou andando com uma bengala é uma materialização daquilo que os surdos mais temem: perder a visão.
Fonte: Agencia Brasil