Números da Secretaria Estadual de Segurança Pública de Mato Grosso (Sesp-MT) confirmam uma triste realidade. O índice de casos de estupro de vulnerável no Estado cresceu 20% no último ano em relação a 2017. Porém, o problema não está relacionado apenas à estatística desse crime tão brutal, mas também a violência e crueldade empregada nas últimas situações registradas.
Em 2018, 1319 ocorrências foram realizadas – 268 a mais que no ano anterior. Neste ano, já foram computadas 659 (até junho) e se esse ritmo se mantiver, a tendência é que o índice de 2019 supere o do ano passado. E pelo menos mais três casos, ocorridos em julho, vão ser adicionados a esses números nada satisfatórios ao final do ano.

17 de julho – uma menina de apenas 8 anos foi estuprada e estrangulada por um vizinho, de 20 anos, em Sorriso (398 km de Cuiabá-MT). De acordo com informações da polícia, Natalya Bianca Lima Gonçalves, filha de pais separados, ficava todas as noites na casa do pai enquanto a mãe saía para o trabalho. No entanto, a garota teria pedido para ficar na casa da mãe para brincar com as crianças da vizinhança.
Por volta das 23h, a menina entrou para casa. Foi quando o Jonatan Nicolas Duarte aproveitou o momento em que a criança estava sozinha e entrou na residência. Ele a estuprou e a estrangulou e foi embora para casa. A mãe chegou por volta de 1h e se deparou com a filha desacordada. Natalya ainda foi levada até o Hospital Regional de Sorriso, mas já estava sem vida.
De acordo com o delegado André Ribeiro, responsável pelo caso, o exame de necropsia feito no Instituto Médico Legal (IML) confirmou que a vítima foi abusada sexualmente e teve o pescoço quebrado pelo assassino.
O criminoso confessou o crime bárbaro e admitiu ter usado drogas no dia. Por questões de segurança, ele foi transferido do Centro de Ressocialização de Sorriso (CRS) para a Penitenciária Osvaldo Florentino Leite, conhecida como “Ferrugem”, em Sinop (500 km da Capital).
Jonatan também é suspeito de cometer um estupro contra um vizinho, em 2013. A vítima, que tinha 9 anos na época, contou que brincava de esconde-esconde na rua com os amigos e foi abordado por três criminosos, que o levaram para um local afastado. Segundo a criança, ela foi segurada por dois abusadores enquanto Jonatan cometia a violência sexual.

22 de julho – um rapaz de 26 anos foi preso acusado de estuprar um adolescente de 16 anos, na Capital. A denúncia foi feita pela mãe do adolescente que, após notar um comportamento estranho do filho, descobriu que o jovem era vítima de abusos sexuais há, pelo menos, seis meses. O jovem chegou a tentar suicídio em duas oportunidades.
Segundo o adolescente, ele e o criminoso se conheceram por meio de uma rede social. O maníaco havia criado um perfil falso, se passando por uma mulher, para poder interagir, assediar e chantagear as vítimas. O criminoso ainda fazia diversas ameaças ao rapaz, dizendo que mataria a mãe e a irmã da vítima, caso fosse denunciado.
No entanto, ele foi levado para a delegacia, onde apenas prestou esclarecimentos e foi liberado. Como não houve uma situação de flagrante, a polícia julgou “não ter elementos suficientes” para pedir a prisão do suspeito.
Valdeir já possui passagens criminais por estupro, nas cidades de Cuiabá e Corumbá-MS.
Nesta terça-feira (24), a Polícia Civil recebeu uma nova denúncia de um menor de idade da região contra o abusador. A Delegacia Especializada de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Deddica) vai apurar se outros menores também foram molestados pelo acusado. Um inquérito foi instaurado e caso novas denúncias sejam registradas, a Polícia Civil deve pedir a prisão preventiva do suspeito junto ao Poder Judiciário.

23 de julho – um padrasto foi preso em flagrante pela Polícia Militar, após oferecer dinheiro para a enteada em troca de sexo. Ela rejeitou e foi abandonada no meio da estrada, na zona rural da Capital.
Uma testemunha acionou a Polícia Militar. A adolescente contou que foi chamada pelo padrasto para fazer um serviço em um determinado local. Mas que, ao entrar no carro do acusado, ele teria mudado o trajeto combinado. O homem ofereceu R$ 1.000 para a menor transar com ele. A jovem recusou a proposta e foi abandonada na pista.
O criminoso fugiu em alta velocidade, mas foi localizado pelos policiais que faziam rondas na região. Ele foi encaminhado para a Central de Flagrantes da Capital.
A enteada contou que essa não foi a primeira vez que foi assediada pelo padrasto. Segundo a jovem, na semana passada, ela foi obrigada a ingerir várias bebidas alcoólicas enquanto o violentador passava a mão nas suas partes íntimas. Ele ainda chegou a ejacular nos seios da vítima.
Esse, infelizmente, não é a única queixa contra o homem. Em 2009, ele foi flagrado com a filha, de 9 anos na época, em um motel no bairro Ouro Fino, na Capital. A denúncia foi feita por um taxista, que levou o criminoso e a vítima até o local. No estabelecimento, os policiais encontraram a menina chorando no banheiro. A vítima relatou que o pai a ameaçava constantemente e dizia que mataria a mãe da criança, caso ela contasse sobre o crime para alguém.
Ele foi encaminhado para o Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC). O estuprador foi condenado a 23 anos de reclusão. Porém, em 2017, o acusado conquistou o direito de progressão de pena para o regime semiaberto, monitorado por tornozeleira eletrônica.
Reincidentes
Os três casos citados apresentam uma semelhança: os agressores já haviam cometido crimes da mesma natureza no passado. De acordo com o delegado Cláudio Alvares, da Delegacia Especializada da Mulher, Criança e Idoso de Várzea Grande, o código penal brasileiro defasado é uma das principais razões que contribuem para a reincidência dos agressores.
“Precisamos alterar o nosso Código Penal, que é de 1940 e está completamente desatualizado. Além dele, também é necessário modificar o Código Processual Penal, que permite as progressões de regime e dá brechas para vários pedidos de recursos ao longo do trâmite processual contra os criminosos”.
Cláudio Alvares conta que, em média, de duas a três ocorrências de estupro de vulnerável são registradas diariamente em Várzea Grande. O delegado relata que, na maioria das vezes, os agressores são pessoas próximas do convívio das crianças. “90% dos casos denunciados envolvem padrastos, pais, tios, vizinhos e amigos próximos da família, que se aproveitam da relação de confiança com os responsáveis pelos menores e de determinadas situações para cometer os crimes”.
A abordagem a criança e ao adolescente que sofre abusos sexuais também segue um padrão estabelecido, visando garantir a integridade das vítimas. “Assim que o registro relatando o crime é realizado, a vítima é atendida por uma equipe de psicólogos da Polícia Civil, depois passa pelo Instituto Médico Legal (IML) para fazer exame de corpo de delito e, por último, instauramos o inquérito policial para investigar o caso”.
Para tentar reverter esse quadro alarmante, o delegado destaca que a Polícia Civil realiza eventos educacionais para conscientizar as crianças sobre situações que podem configurar algum tipo de abuso de cunho sexual.
“Para mudar o cenário, não basta criar medidas de repressão, somente. Não adianta apenas endurecer as penas porque ainda assim esses casos continuariam ocorrendo. É preciso criar mecanismos para prevenir esse tipo de ação criminosa. Por isso, realizamos, periodicamente, palestras nas escolas estaduais e municipais para alertá-los sobre esse risco tão frequente. Dessa forma, podemos mudar um pouco dessa cultura lamentável”, finaliza.