"Mas o Wesley ainda está preso?", indaga Justin Teitalbeum, motorista de uma empresa de serviço de transporte, ao ser questionado sobre o impacto da prisão dos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS, para a comunidade local.
A dúvida do motorista se repetiu em conversas da reportagem com criadores de gado, funcionários da empresa e outros moradores da pequena Greeley, cidade de 104 mil habitantes no Colorado, região Meio-Oeste dos Estados Unidos. É nessa pacata localidade que está a sede americana do grupo JBS.
Alguns chegam a duvidar que Wesley -que morou na região por quatro anos, entre 2007 e 2011- seja culpado das acusações. Ele está preso preventivamente por suspeita de "insider trading": comprar dólar no mercado e lucrar com a alta da moeda quando a delação da JBS veio à tona.
"Deixem que resolvam seus problemas na América do Sul, mas dou a ele [Wesley] o benefício da dúvida. Não sei o que realmente aconteceu. O que eu sei é que continuam pagando aos pecuaristas em dia e comprando milho", diz William Hammerich, diretor-executivo da Associação de Pecuária do Estado do Colorado.
DESINFORMAÇÃO
Os americanos têm pouco conhecimento sobre o escândalo. Sabem que os irmãos fizeram um acordo de delação com a Justiça, confessando pagamento de propina a políticos, e que existem algumas gravações com altas autoridades -mas, em geral, não ouviram os diálogos e desconhecem seu conteúdo.
Também colabora para a desinformação o fato de que poucos conhecem Joesley, que fazia a ponte com Brasília e que gravou o presidente Michel Temer. Mesmo os funcionários da empresa só se lembram de ver o irmão caçula do clã em uma ou outra reunião. O relacionamento deles sempre foi com Wesley.
"Para mim, essa situação toda é bizarra, porque não tem nada a ver com o CEO [presidente da empresa] que eu conheço: ético, exigente e justo", diz Chris Gaddis, chefe de recursos humanos da JBS nos Estados Unidos, referindo-se a Wesley. Ele conta que ficou sabendo da delação por meio das redes sociais, lendo notícias traduzidas pelas agências internacionais.
Wesley esteve em Greeley pela última vez em julho do ano passado, depois de a delação vir a público, mas antes de ser preso, no dia 13 de setembro. Ele participou das comemorações dos dez anos da subsidiária americana em um churrasco no gramado da sede, com direito a caipirinha. Aproveitou para dar explicações a alguns funcionários e ouviu manifestações de apoio da equipe.
ISOLAMENTO
Os Batista vêm fazendo um esforço para isolar suas operações nos Estados Unidos, no Canadá e na Austrália do escândalo que acontece no Brasil. Apenas o confinamento Five Rivers entrou no feirão de venda de ativos promovido pelos irmãos para acalmar os bancos credores.
A estratégia faz sentido. Hoje as unidades fora do Brasil, boa parte adquirida com ajuda do BNDES, respondem por 87% do faturamento da JBS. Só nos Estados Unidos, chega a 52%. E os negócios lá fora vão muito bem: "2017 foi, de longe, o melhor ano da nossa história", disse André Nogueira, presidente da empesa no país, onde é chamada de JBS USA.
Graças ao crescimento da economia americana, as receitas obtidas pela Pillgrim's Pride (frango) e pela JBS USA pork (carne suína) atingiram, respectivamente, US$ 2,79 bilhões e US$ 1,69 bilhão no terceiro trimestre de 2017, um crescimento de 12% e 25% em relação ao igual período de 2016. Na JBS USA Beef (carne bovina), o avanço foi menos expressivo, mas ainda assim positivo: alta de 3,2%, para US$ 5,53 bilhões.
DÚVIDAS
Quando a delação veio à tona, os executivos locais tiveram que responder a dúvidas de fornecedores, clientes e bancos, mas, com o passar dos meses, contam que o assunto ficou para trás. A JBS USA vem até atraindo talentos de outras empresas.
Na semana passada, contratou o executivo Thomas Lopez para presidir a Plumrose USA, que atua com produtos preparados a base de carne. Lopez era presidente da divisão de bebidas e snacks da gigante Kraft-Heinz, que possui entre seus sócios o bilionário brasileiro Jorge Paulo Lemann.
Em agosto de 2017, foi a vez de Alfred "Al" Almanza assumir a direção global de segurança de alimentos e garantia de qualidade. Almanza era secretário de Segurança Alimentar dos EUA e trabalhou durante quase 40 anos no Departamento de Agricultura do Estados Unidos (Usda).
Os executivos se juntaram à JBS USA, apesar das incertezas geradas pelo acordo que vem sendo negociado entre a J&F, holding que congrega os negócios dos Batista, e o Departamento de Justiça (DoJ). Os Estados Unidos têm uma lei severa para punir empresas que corrompem políticos em outros países.
Dependendo das negociações, os Batista podem ser condenados a pagar uma multa. A punição, no entanto, deve ficar com a holding, já que a subsidiária americana colabora com informações, mas não vem sendo investigada. Se não houver novas revelações, o império dos Batista nos Estados Unidos pode escapar praticamente intacto.