Depois de mais de dois anos de investigação, o Ministério Público do Rio (MP-RJ) denunciou nesta segunda-feira ao Tribunal de Justiça do Rio o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e Fabrício Queiroz, subtenente da reserva da Polícia Militar e assessor do senador no período em que foi deputado estadual no Rio.
Flávio foi apontado como líder da organização criminosa, e Queiroz, como o operador do esquema de corrupção que funcionava no antigo gabinete na Assembleia Legislativa. Ambos foram acusados pelos crimes de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A denúncia possui cerca de 300 páginas.
A partir dos dados das quebras de sigilo bancário e fiscal, os promotores apontam que o senador usou, pelo menos, 2,7 milhões de reais em dinheiro vivo do esquema das rachadinhas. Os valores somam os três métodos pelo qual o filho do presidente Jair Bolsonaro “lavou” o dinheiro em espécie.
Em junho, Queiroz foi preso na casa do advogado Frederick Wassef, em Atibaia, no interior de São Paulo. Wassef era advogado de Flávio na investigação até aquele momento. Ele foi trazido ao Rio para cumprir a prisão em Bangu, mas um habeas corpus do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), permitiu que ele fosse para prisão domiciliar em seu apartamento na Taquara, na zona oeste do Rio.
A investigação do MP-RJ teve início em julho de 2018, depois que um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) identificou a movimentação atípica de 1,2 milhão de reais na conta de Queiroz. Além disso, foi apontado no documento que oito assessores de Flávio faziam repasses para Queiroz, além de estar assinalada a participação de integrantes da família do ex-assessor. Foram identificadas transferências e depósitos de Márcia Aguiar, Nathália e Evelyn Queiroz, mulher e filhas do subtenente.
Quando o MP-RJ avançou nas investigações, após a quebra de sigilo bancário e fiscal de 106 pessoas e empresas em abril de 2019, verificou provas de um esquema no qual assessores eram nomeados e tinham de devolver a maior parte de seus salários para Fabrício Queiroz. Muitos, inclusive, não atuavam efetivamente e eram “funcionários fantasmas”.
O dinheiro era repassado por transferências, depósitos, mas também em espécie. Depois, segundo a investigação, o dinheiro era lavado e voltava para Flávio por meio de transações imobiliárias, na loja de chocolates e também no pagamento de despesas pessoais com dinheiro vivo, o que oculta a origem.
São 23 os ex-assessores citados em relatórios do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc) do MP-RJ. Eles são divididos em três grupos. O primeiro, composto de 13 ex-funcionários, é o núcleo ligado a Queiroz, formado por seus familiares, além de vizinhos e amigos indicados por ele para o gabinete. Esses 13 ex-assessores depositaram, ao longo dos 11 anos, 2,06 milhões de reais na conta bancária de Queiroz (69% do valor em dinheiro vivo). Além disso, esse grupo sacou 2,9 milhões de reais em espécie ao longo desse período.
No segundo grupo, constam ainda Danielle Nóbrega e Raimunda Veras Magalhães, ex-mulher e mãe de Adriano Nóbrega, ex-capitão do Bope e líder de uma milícia de Rio das Pedras, que foi morto em fevereiro. Elas repassaram juntas para Queiroz um total de 200.000 reais. Já as pizzarias de Raimunda ainda repassaram outros 200.000 reais para Queiroz.
O terceiro grupo descrito pelo MP contém dez ex-assessores residentes em Resende, a cidade onde membros da família Bolsonaro viveram, no sul fluminense. Nove deles têm parentesco com Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher e mãe do filho mais novo do presidente Jair Bolsonaro. Dos dez ex-funcionários do núcleo de Resende, seis sacaram em espécie mais de 90% dos salários recebidos, e outros três acima de 70%. Foi um total de 4 milhões de reais.
O MP-RJ também aponta que alguns desses funcionários não davam expediente, de fato, no gabinete de Flávio ou atuavam como assessores. Nos autos, os promotores citaram reportagem de O Globo, de junho do ano passado, que apontou quatro dessas pessoas que constaram como funcionários, mas nunca exerceram os cargos de fato na Alerj. Francisco Siqueira Diniz, cursava faculdade em tempo integral em Barra Mansa, e jamais teve crachá da Alerj. Também é apontada a situação de Andrea Siqueira Valle, fisiculturista, que constou como assessora de Flávio por dez anos. Os aposentados José Procópio Valle e Maria José Siqueira Silva, que sempre moraram em Resende, também foram apontados.
Ao todo os promotores apontam, nos autos, seis grupos da organização criminosa. Além dos assessores, outros três grupos mencionam os envolvidos na lavagem de dinheiro: o núcleo com Alexandre Santini, sócio de Flávio na loja de chocolates, outro com Glenn Dillard e sua empresa Linear Enterprises Consultoria Imobiliária e um último com o policial militar Diego Ambrósio e sua empresa de vigilância, Santa Clara Serviços.