Política

Mesmo em crise financeira, Assembleia gasta R$ 3,8 milhões com gasolina

Uma das maiores discrepâncias apontadas pelo Ministério Público de Contas (MPC) ao avaliar as contas anuais de 2015 da Assembleia Legislativa de Mato Grosso refere-se ao consumo astronômico de combustível. Foram gastos 1,1 milhão de litros ao longo do ano, o que corresponde R$ 3.866.952,31. Essa gasolina teria sido consumida por 87 veículos locados e 222 credenciados à disposição dos gabinetes parlamentares.

De acordo com os técnicos do MPC, o consumo anual de 1.1 milhão de litros de gasolina com uma média regular de 8 km por litro representa 9.301.232 Km rodados, que correspondem a mais de 232 voltas na Terra, considerando o valor do perímetro equatorial de 40.075,02 quilômetros.

A prestação de contas da Assembleia Legislativa, no entanto, não comprovou que esses veículos à disposição da Assembleia tiveram como única finalidade a atividade parlamentar. “Portanto, a prestação de contas deficiente aliada ao gasto excessivo de combustível, incompatível com o regular exercício da atividade parlamentar, acarreta a presunção de dano ao erário conforme entendimento do Tribunal de Contas da União”, conclui o procurador-geral de Contas, Gustavo Coelho Deschamps.

Segundo Gustavo Deschamps, a não comprovação da lisura no trato de recursos públicos recebidos autoriza, a seu ver, a presunção de irregularidade na sua aplicação, ressaltando que o ônus da prova da idoneidade no emprego dos recursos, no âmbito administrativo, recai sobre o gestor, obrigando-se este a comprovar que os mesmos foram regularmente aplicados quando da realização do interesse público.

“Aliás, a jurisprudência deste Tribunal consolidou tal entendimento no Enunciado de Decisão 176 ‘compete ao gestor comprovar a boa e regular aplicação dos recursos públicos, cabendo-lhe o ônus da prova’”, reforçou.

Esta não é a primeira vez que o TCE identifica abusos nos gastos com combustíveis por parte dos deputados. Em 2011, foi determinado para o parlamento que o sistema de tíquetes fosse substituído por um modo informatizado, com mais domínio sobre a despesa. Entretanto, a mudança só aconteceu no fim do ano passado.

Caso as contas sejam julgadas irregulares, os gestores do parlamento terão que devolver o dinheiro aos cofres públicos, e poderão pagar multa.

Frota dos deputados

O relatório do MPC mostra que o deputado Wancley Carvalho (PV), cujo colégio eleitoral é em Pontes e Lacerda,  foi o parlamentar com maior números de veículos da Casa em 2015 quando 24 veículos estavam à sua disposição, sendo quatro locados e 20 credenciados.

O segundo parlamentar com maior número de veículos, tem sete carros a menos que Carvalho. São 17 carros do deputado Sebastião Rezende (PSC), sendo oito locados e nove credenciados.

Os dois parlamentares juntos ocupavam no ano passado 13% da frota total de 300 veículos. Transformando em valores, o deputado Carvalho gastou com os veículos R$93 mil no ano de 2015, e o deputado Rezende R$65 mil.

Dispensas de licitação sem justificativas

O Ministério Público de Contas (MPC) também constatou falhas graves da Assembleia Legislativa de Mato Grosso na contratação de serviços por dispensa de licitação no valor aproximado de R$ 9 milhões ao consultar o sistema Aplic.

Uma delas é a Dispensa nº 005/2015, cujo valor é de R$ 5.999,00, aberta no dia 26 de junho de 2015 e homologada em 15 de julho do mesmo ano. Neste item, o MPC constatou divergência entre o valor da dispensa, que é de R$ 1.033.500,00, e o valor registrado junto ao Aplic que é de R$ 5.999,00.

Outro caso é o pregão Presencial nº 005/15, para contratação de empresa de locação de veículos diversos no valor de R$ 5.333.878,00, com data de abertura no dia 15 de junho de 2015 e homologação em 05 de outubro de 2015.

“O gestor sabia que os contratos de locação iriam vencer, tanto que instaurou o processo de dispensa antes do fim daqueles, inexistindo situação de emergência. Falta de planejamento do administrador não é capaz de justificar a contratação emergencial”, observa o procurador-geral de Contas, Gustavo Coelho Deschamps.

– Dispensa nº 006/2015, no valor de R$ 530.000,00, aberta no dia 03.08.15 e homologada e adjudicada em 04.11.15.

– Pregão Presencial nº 016/2015, para contratação de empresa especializada em locação de veículos tipo micro-ônibus, vans e caminhonete, no valor de R$ 3.017.362,50, com data de abertura em 11.12.15 e homologada e adjudicada em 27.01.2016.

Comparando os documentos exigidos pela lei e os juntados pela defesa, o MPC constatou várias falhas que incluem a ausência de razão da escolha do fornecedor ou justificativa do preço, não comprovou a eficácia do serviço previsto e nem mesmo apresentou a publicação da dispensa de licitação na imprensa oficial. “Ademais, resta evidente a ausência de situação de calamidade ou urgência”, diz o relatório.

Diferença de R$ 2 milhões nas cotas de capital

Outra falha grave apontada pelo Ministério Público de Contas refere-se à divergência entre as informações enviadas por meio físico ou eletrônico e as constatadas pela equipe técnica, especialmente em relação às cotas de capital e corrente no valor de R$ 2 milhões. O levantamento também apontou diferença no valor do duodécimo.

A Assembleia Legislativa se defendeu afirmando não ter vislumbrado nenhuma diferença nos valores repassados em 2015 pelo Governo do Estado ao rever os lançamentos contábeis e manteve os argumentos de que as transferências, a título de duodécimo, caracterizam-se apenas como cotas financeiras relativas a créditos orçamentários.

Em que pese as alegações apresentadas pela Assembleia Legislativa, o MPC manteve a ocorrência da irregularidade, tendo em vista que, na visão do procurador-geral, não houve esclarecimento quanto às divergências na contabilização das receitas, especialmente entre as cotas de capital e corrente.

Tomada de contas verificará danos ao erário

O conselheiro José Carlos Noveli , relator das contas de gestão da Assembleia Legislativa, pediu a instauração de Tomada de Contas Ordinária a fim de averiguar a existência de dano ao erário no consumo excessivo de combustíveis no ano de 2015 e para o acompanhamento simultâneo do consumo para análise das contas anuais de 2017.

O prazo para a tomada de contas é de 30 dias e de 120 dias para uma nova prestação de contas referente aos gastos. Neste caso, os responsáveis são o presidente da Assembleia, Guilherme Maluf (PSDB), e Oldanir Bortolini (PSD).

A reportagem entrou em contato com a assessoria de imprensa para um posicionamento do presidente da Casa, contudo foi informada de que não se pronunciará até a publicação do acordão por parte do TCE.

“A Assembleia Legislativa está aguardando a publicação do acórdão para saber quais são as determinações e recomendações do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Apenas depois da publicação é que o Poder Legislativo vai se manifestar sobre o assunto”.

“Viagens são para garantir a presença dos deputados nas bases”

O procurador-geral adjunto da Assembleia Legislativa, Grhegory Maia, justifica que o gasto excessivo com combustível se dá pelas viagens aos seus redutos eleitorais. “O Poder Legislativo se difere de todos os outros, uma vez que o exercício parlamentar exige a presença dos deputados e de seus assessores em suas bases. É uma atividade complexa”, definiu Maia.

“A ALMT tem buscado melhorar o seu sistema de controle e atendeu, sim, a uma decisão do Tribunal de Contas, mas não podemos deixar também de analisar um eventual gasto excessivo na sistemática anterior”, declarou

Grhegory Maia, que fez parte da sessão de análises de contas no TCE, argumentou que a prestação de contas ainda não está totalmente incluída no Fiplan por questões técnicas e de segurança. “Diante disso, o Poder Executivo só repassa as receitas correntes, ignorando as receitas de capital, que incluem os custeios da Casa”, pontuou.

Ainda foi questionada a não realização de concurso público para o cargo de auditor interno, que está suspenso temporariamente, segundo Grhegory Maia, devido à crise econômica que acomete o país. “Apesar disso, atualmente ocupa a Secretaria de Controle Interno um profissional concursado para o cargo de técnico legislativo de nível superior com formação em contabilidade, conforme recomendação do Ministério Público”.

Maluf e Nininho são apontados por improbidade

Os deputados estaduais Janaina Riva (PMDB) e Zeca Viana (PDT) representaram no Ministério Público Estadual (MPE), nesta terça-feira (6), contra o presidente da Assembleia Legislativa, deputados Guilherme Maluf (PSDB), e o primeiro-secretário Oldanir Bortolini (PSD), o Nininho.

Os parlamentares da oposição pedem para que seja instaurada uma ação civil pública por improbidade administrativa contra os membros da Mesa Diretora da ALMT, a quem eles acusam de não cobrar o atraso, por parte do governo do estado, no repasse do duodécimo à Casa de Leis, resultando no atraso do pagamento dos salários dos servidores. 

Conforme Zeca Viana e Janaina Riva, a Mesa Diretora da Casa não obedeceu aos dispositivos previstos na lei orçamentária e não respondeu aos requerimentos para que apresentasse o extrato do saldo bancário da AL, o que incorre em descumprimento da Lei de Acesso à Informação.

Os parlamentares da oposição criticam, no requerimento feito ao MP, o fato de a Mesa Diretora não ter tomado a medida judicial cabível contra o governador do estado, Pedro Taques (PSDB), a fim de evitar eventuais atrasos no repasse, bem como pela suposta omissão quando do descumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado pelo governador com os demais poderes em que o chefe do Executivo se comprometia a realizar os repasses no dia 30 de novembro.

Zeca e Janaina argumentam, ainda, que no mês de novembro o governo repassou mais de R$ 35,7 milhões à ALMT, a título de duodécimo, além de outros R$ 5,1 milhões por meio de decreto orçamentário, o que não justificaria o não pagamento da folha salarial no dia 30.

Outro lado

Por meio de nota, o deputado Guilherme Maluf negou que a Mesa Diretora esteja sendo omissa com relação aos atrasos no duodécimo e que a AL tem por objetivo resolver o problema. Maluf afirmou que tem promovido diálogos constantes com os outros poderes, além do MPE e TCE, mas que não vai se furtar, caso seja necessário, de tomar outras medidas para garantir o repasse do duodécimo. Ele ressaltou, ainda, que o TAC firmado entre o governo e os podres não foi cumprido pelo estado por uma questão financeira, mas que já é uma ação da Mesa Diretora para garantir os repasses.

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Sandra Carvalho

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