O uso de Meritocracia pode ser relacionado com Dr. Jekyll e Mr. Hyde. É uma ferramenta poderosa, eficaz e de rápido retorno. Mas também é traiçoeira e ilusória.
Meritocracia tem que ser muito bem montada para não se voltar contra você. E também tem que ter um limite para que não dê um resultado mais eficiente do que você suporta.
Isso tem muito à ver com minha trajetória como empresário. Quando assumi o controle e a presidência do Grupo Carlos Elias em 2006, tínhamos 11 lojas, 1 unidade fabril, com faturamento de R$ 90 MM e 265 funcionários espalhados em MT, RO e AC. Éramos gente grande, mas nos portávamos como boteco.
Ao criar um ambiente Meritocrático, você tem que estar preparado para ambos os lados. Há de ser muito bem pensado para que a Meritocracia não se volte contra você. Não é apenas colocar a cenourinha na frente do cavalo. Você pode criar mercenários ao invés de colaboradores comprometidos. E mais, você corre o risco de alcançar resultados que sua empresa não aguenta.
Meritocracia # Campanha de vendas
Uma confusão que muita gente faz é que meritocracia é campanha de vendas. Meritocracia é um conceito muito mais amplo. Para se atingir meritocracia na venda, é preciso que toda a empresa respire o conceito. Desde a tia do café até a contabilidade. Tudo é interligado.
No Grupo Carlos Elias começamos timidamente com Meritocracia lançando campanhas de vendas internas. Fomos para onde o resultado vinha mais rápido: Vendedores. Tínhamos uma estrutura tão ajustada e azeitada que recorrentemente enquanto dirigia para casa à noite após um dia de trabalho me vinha à cabeça: Estamos com estoque alto de motosserras, roçadeiras, tratores cortadores de grama, atomizadores, sopradores, peças de reposição, etc – algo em torno de R$ 2 MM em motores, que é com categorizávamos esta linha de produtos.
Eu ligava do carro para nossa gerente de Marketing, um talento sem igual, e falava:
– Nathália, vamos lançar uma campanha para desovar estoque de motores. E o prêmio além do ganho meritocrático terá um iPhone para quem pontuar mais.
Estava tudo pronto. Tínhamos um banco de dados de desenhos de campanhas meritocráticas para cada categoria de produto, com amarrações: Qualidade da venda – à vista, à prazo, tipo de cliente de acordo com seu Credit Scoring, valor agregado e margem praticada na venda. Tudo isso criava pontuações que, ao final do período da campanha (que graças à uma TI avançadíssima poderia ser de um dia, uma semana, um mês…) chegava-se ao vencedor.
O prazo para lançar a campanha era de apenas 24 horas. No dia seguinte o Marketing alinhava com a TI os produtos e qual campanha seria lançada. Durante o dia disparávamos Teasers no email dos vendedores que vinha coisa boa. Estamos falando de 2008 à 2012, não existia WhatsApp, mas existia Smartphones. Todos os vendedores tinha Smartphones com pacote de dados, contas de email e acessavam a Intranet para ver suas pontuações o dia todo. Eu mesmo tinha um painel de 4 TVS de Led de 50”, onde via em tempo real o desempenho por loja, vendedor, gerente, etc.
As margens subiam, as vendas subiam, o inventário caia, o contas a receber aumentava. Estava tudo perfeito, como queríamos.
Nossas vendas e margem comportaram-se assim de 2008 à 2012, em percentual de crescimento:
Em 2011 tivemos crescimento zero devido ao incêndio de nossa principal planta industrial. Investimos mais ainda em Meritocracia e foco em vendas de produtos com valor agregado a partir daí. Em 2011 e 2012 conseguimos duas linhas de distribuição que tiveram um enorme impacto em nossas vendas.
Com a cultura de meritocracia estabelecida por toda a empresa, em todos os departamentos, fizemos downsizing na área administrativa e aumentamos a equipe de vendas. No ocaso do GCE estávamos com R$ 300 MM de vendas anuais e 650 colaboradores, sendo que destes quase 500 eram da equipe de vendas. Meritocracia pura. Crescimento, crescimento, crescimento.
O lado MR Hyde de nossa meritocracia foi justamente o crescimento à taxas alucinantes, alavancados e dependendo de capital de banco, com taxas de inadimplência altas. Fizemos um excelente trabalho de vendas, pensando que o fluxo de dinheiro externo nunca acabaria.
Coloque tudo no liquidificador e terá descasamento de caixa. E meu pai, o Carlos Elias, me ensinou e eu não quis aprender: Empresa que não dá lucro mas tem caixa, sobrevive. Empresa que dá lucro, mas não tem caixa morre. Aprendi quando O GCE morreu no final de 2012.
Moral da história: Analise em 360º.