Josiane Dalmagro – Da Redação
Uma prática comum em Mato Grosso, os fundos criados pelo Estado são inconstitucionais e mostram, de forma clara e até escandalosa, o quanto o Poder Judiciário acaba se tornando refém de leis, decretos e leis complementares criadas pelo Executivo e o Legislativo.
A afirmação é do especialista em direito tributário Victor Maizmann, que critica duramente a forma como os fundos são criados e geridos. “Não conheço nenhum fundo correto, todos são inconstitucionais”, pontua ele, explicando ainda que, além dos desvios de finalidade, os fundos ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição brasileira.
Criada em 2003, ainda no governo Maggi, mas sancionada apenas em 2011, já com seu sucessor Silval Barbosa, a Lei Complementar (LC 144), do Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza, é um grande exemplo da falta de transparência e lisura dos gestores estaduais.
Criar uma Lei Complementar que ignora a Constituição brasileira e, não obstante, alterar seu texto até que ela atenda a interesses políticos pontuais, é prova disso.
Em seu texto original, a LC 144/2003 diz que “é vedada a utilização dos recursos do fundo para remuneração de pessoal e encargos sociais”, porém, além da alteração do texto dizendo exatamente o contrário, ainda foi criada mais uma Lei Complementar (481 de 27 de dezembro de 2012), que “altera as Leis Complementares dos Fundos Especiais”, em que contraditoriamente há desvio de finalidade quando colocam que “os recursos financeiros arrecadados pelo Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza poderão ser aplicados para pagamento de pessoal, encargos sociais e demais despesas de custeio de atividade finalística”, ou seja, essa mudança avaliza o uso do recurso que deveria ser destinado para combater e erradicar a pobreza no Estado para qualquer outra coisa, em detrimento da finalidade primeira.
No mesmo dia foi sancionada, com efeitos retroativos a 2009, a Lei 9859/2012, que “altera as Leis dos Fundos Especiais e dá outras providências”, pela qual a Assembleia Legislativa de Mato Grosso tenta legitimar todas as alterações na legislação dos fundos e revoga as disposições em contrário.
Exatamente um ano depois de sancionada a LC 481, foi a vez da LC 521, de 27 de dezembro de 2013, que acaba de escrachar os desmandos “legais” colocando que o respectivo recurso poderá ser usado para qualquer outra coisa, diferente do motivo pelo qual foi criado.
Essa Lei Complementar altera mais uma vez, entre outras leis, as Leis de Fundos Especiais e em seu artigo 1º acrescenta a seguinte redação: “Na forma e valor fixado na Lei Orçamentária Anual ou sua programação financeira, no exercício financeiro de 2014, poderá o recurso financeiro a que se refere o caput deste artigo ser desvinculado da aplicação estatuída na respectiva lei da receita".
O que é possível perceber com tantas alterações é a maestria com que Legislativo e Executivo brincam com as leis em prol do que lhes convém ou precisam.
Maizmann explica que a União permite a criação dos fundos, mas não especifica os critérios, levando os estados a legislarem de acordo com suas necessidades e interesses.