Fux é amigo íntimo do advogado e sua filha, Marianna Fux, trabalha no escritório.
O processo sob relatoria do ministro trata-se de um recurso sobre cobrança dupla do imposto estadual ICMS nas compras feitas pela internet. O caso em questão envolve, de um lado, o Estado de Sergipe e, do outro, a empresa B2W (que reúne sites como Americanas.com, Submarino e Shoptime), representada por Bermudes.
Em novembro do ano passado, Fux proferiu um voto no sistema interno do tribunal reconhecendo a repercussão geral do caso, transformando-o em um recurso que, apesar de tratar de um caso específico de Sergipe, terá efeitos genéricos para todo o Judiciário.
"A meu juízo, o recurso merece ter reconhecida a repercussão geral, haja vista que o tema constitucional versado nestes autos é questão relevante do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, e ultrapassa os interesses subjetivos da causa, uma vez que as vendas via comércio eletrônico repercutem na economia pelo volume de operações e impacta financeiramente o orçamento dos entes federados", disse Fux em seu voto. O reconhecimento dessa repercussão foi aprovado por unanimidade pelos ministros do Supremo.
O reconhecimento desse mecanismo, porém, não significa qualquer juízo de valor sobre a causa.
A polêmica ocorre pois as empresas precisam pagar ICMS em seu Estado de origem e depois são cobradas também na unidade federativa para onde o produto foi enviado. Em alguns Estados, inclusive, a encomenda é retida em um galpão do governo local e o comprador só consegue liberar sua compra se ele próprio pagar o imposto também pago na origem.
O tema está em debate no Congresso Nacional e já existem algumas ações de inconstitucionalidade no próprio Supremo que contestam essa prática.
IMPEDIMENTO
Assim que tomou posse como ministro, Fux enviou à Secretaria do tribunal um documento, comunicando formalmente seu impedimento, "por motivo de foro íntimo", para julgar os processos do escritório de Sérgio Bermudes, entre outros.
Mas, como a distribuição de processos ocorre de forma eletrônica, foi avisado que o próprio gabinete deveria se declarar impedido nos casos que julgar necessário. Na maioria dos processos isso ocorre, mas neste específico, não aconteceu.
Em fevereiro deste ano, Fux enviou o caso para que o procurador-geral da República se manifestasse, o que não ocorreu até o momento.
Questionado pela Folha, o gabinete informou, por meio da assessoria do tribunal, disse que, quando a repercussão geral foi concedida "não foi observado naquele momento que se tratava de um caso de impedimento do ministro Luiz Fux", mas disse que agora o processo será encaminhado à presidência da Corte para que a relatoria seja transferida. "Dessa forma, o processo será redistribuído, passando a ser relatado por outro ministro", diz o gabinete.
Também esclarece que "a decisão proferida não representa um posicionamento do ministro quanto à questão de fundo".
Na edição desta quarta-feira, o jornal "O Estado de S. Paulo" publicou outros casos envolvendo o escritório de Bermudes em que Fux atuou ou relatou ao longo dos últimos anos. Tratavam-se de julgamentos ocorridos na 2ª Turma do tribunal ou decisões monocráticas, uma delas que o ministro votou contrariamente aos interesses de seu amigo.
'ERRO OPERACIONAL'
Nesta quarta-feira, o STF divulgou uma nota, dizendo que "a eventual participação do ministro Fux em processos patrocinados pelo Escritório Sérgio Bermudes decorreu de falha no sistema de verificação que não indicou o impedimento comunicado. Trata-se de falha operacional que será prontamente solucionada com a adoção de novos mecanismos de controle".
A relação de Fux e Bermudes ganhou destaque na semana passada, após a coluna Mônica Bergamo, da Folha, revelar que o advogado ofereceria uma festa para comemorar os 60 anos do ministro. Após a revelação, a festa foi cancelada.
ADVOGADO
Bermudes afirmou que o seu escritório possui centenas de casos em tribunais superiores e os magistrados recebem anualmente milhares de processos, também com milhares de páginas. "O juiz muitas vezes, no dia a dia, não se atenta ao fato e deixa passar. Só o Supremo recebe por ano mais de 80 mil processos."
Ele explicou que Fux, ao enviar um ofício para evitar o recebimento de processos da sua filha, acabou generalizando o impedimento a todo o escritório de Bermudes. Ele, no entanto, defende que a amizade não seja motivo para gerar impedimento ou suspeição. "Quantos acórdãos na Justiça dizem que a amizade entre juiz e advogado não gera a suspeição e o impedimento. Isso porque são profissionais que convivem num mesmo ambiente", afirmou.
Fonte: Folha de São Paulo