Cálculos preliminares da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) indicam que os blocos das quatro faixas de frequências destinadas à telefonia 5G custarão, no máximo, R$ 35 bilhões.
As frequências são avenidas no ar por onde as teles fazem trafegar dados. Fora delas há interferências.
O leilão está previsto para junho deste ano e data foi mantida depois da votação das regras do edital pela agência nesta quinta-feira (25). No edital do 5G, as teles farão lances por blocos nas faixas de 700 MHz; 2,3 GHz; 3,5 GHz e 26 GHz.
Somente a frequência de 3,5 GHz, considerada a nata do 5G por permitir altíssimas velocidades, está avaliada em R$ 17 bilhões. Os valores ainda podem sofrer ajustes e só consideram as licenças de cada faixa.
De acordo com as regras aprovadas, cada bloco terá um conjunto de investimentos (contrapartidas) cujos valores serão descontados do preço dessas frequências. Técnicos da Anatel ainda não fecharam o cálculo das obrigações.
Estimativas, no entanto, indicam que devem empatar com os R$ 35 bilhões das frequências. Somente a cobertura das 14 mil localidades com serviços 4G deverá consumir R$ 13 bilhões.
Isso tornará o resultado do leilão praticamente nulo para o governo do ponto de vista de geração de caixa, considerando somente as contrapartidas definidas pela Anatel.
Nessa conta, não estão incluídas as obrigações definidas pelo Ministério das Comunicações e que foram incorporadas pela proposta de edital na Anatel –o investimento em conexão de internet por fibra óptica na região Norte, especialmente na Amazônia, e a construção de uma rede privativa para o governo federal.
Essa rede foi uma saída encontrada para que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não barrasse a participação da chinesa Huawei na construção das redes 5G no país.
A falta de detalhes sobre a dimensão dessa rede e os critérios de segurança a serem adotados tornam esse investimento "algo em aberto", podendo consumir desde R$ 500 milhões, se ficar restrito aos órgãos da administração pública federal em Brasília, até R$ 3 bilhões, se incorporar outros órgãos nos demais estados.
Nesta sexta-feira (26), durante entrevista coletiva que contou com a presença do ministro das Comunicações, Fábio Faria (PSD-RN), o presidente da Anatel, Leonardo de Moraes, afirmou que foi definido um teto de até R$ 1 bilhão em gastos com essa rede privativa. As contrapartidas na conexão da região Norte exigirão mais R$ 1,5 bilhão.
As operadoras –que se preparam para fazer os lances do leilão– já tinham se manifestado contrariamente às obrigações a serem impostas pelo governo.
Também criticaram alguns pontos específicos do edital, como a migração dos satélites que hoje operam em 3,5 GHz e a adoção de um padrão técnico das redes de 5G conhecidos como "stand-alone", o "5G puro", uma solução que exige a construção de uma rede totalmente nova e independente da atual.
As operadoras planejavam fazer melhorias na rede atual para obter velocidades compatíveis com o 5G, até cem vezes maiores que as de 4G.
Esses dois pontos controversos levaram o presidente da Anatel, Leonardo de Moraes, a pedir vista, paralisando a discussão do processo no início de fevereiro. No seu voto, apresentado na reunião do conselho desta quinta, ele acatou o pleito das teles, mas foi vencido.
Três dos cinco conselheiros acompanharam o relator, Carlos Baigorri, que não só exigiu uma rede totalmente nova de 5G, como incluiu a proposta de outro conselho de antecipar a implantação do serviço para julho de 2022 começando pelas capitais.
Batido o martelo nas regras do edital, a área técnica começa a calcular os valores das licenças –descontando as contrapartidas. A partir daí é que se definem os lances mínimos.
O leilão do 5G inova até na precificação das licenças. Nos leilões de 3G e 4G não houve grandes mudanças para o cálculo porque o modelo de negócios estava definido previamente –a prestação de serviço da operadora para o usuário final.
Com o 5G, as operadoras poderão vender conexão para empresas e oferecer soluções de automação industrial, linhas de negócio inovadoras e cujo potencial gerador de receita nunca foi mensurado pela Anatel.
Para isso, os técnicos passaram mais de um ano estudando os diversos mercados onde o 5G tem operação comercial. Por fim, desenvolveram um software próprio capaz de cruzar dados e processar todas as variáveis que influenciam no negócio para, ao final, definir o preço da licença.
Nas frequências de 700 MHz e 2,3 GHz, o modelo usará os padrões do 4G na definição do preço. Ou seja: por essas frequências, as empresas oferecerão serviços convencionais de telefonia e internet para os consumidores.
Nas frequências de 3,5 GHz e 26 GHz, foram considerados três mercados: a venda de chips para consumidores finais (serviços telefônicos e de internet por celular); a oferta de conexões com características de rede de fibra óptica (elevadas velocidades e estabilidade de conexão) pelas redes móveis, conhecido como FWA; e a conectividade para automação da economia (internet das coisas).
Em um primeiro momento, em razão do volume de investimento, cálculos preliminares apontam que as operadoras não deverão ter lucro com o negócio direto com consumidores.
A oferta de conexão fixa móvel poderá prejudicar a receita de operadoras que hoje vendem conexões de internet em alta velocidade pela fibra óptica ou por cabo, como a Vivo e a Claro.
A agência espera que, com a construção de redes independentes de 5G (Stand-Alone), as residências passem a usar sinal de celular (com baixa latência e altíssima velocidade) em vez de fibras –que se tornaram a infraestrutura de conexões entre centrais telefônicas e municípios.
As empresas avaliam que não terão receitas robustas desse serviço a tempo de evitar a canibalização do serviço de conexão por fibra óptica. A TV paga por cabos –que é adquirida por combos (TV, telefonia e internet) também sofreria danos.
Por fim, consideram ainda que não haverá demanda suficiente por ao menos cinco anos para automação industrial. Por esses motivos, preferem usar as redes atuais enquanto ganham fôlego para construírem as redes 5G puras.
Mas o governo e a Anatel recusaram a proposta. O ministro Fábio Faria (Comunicações) defendeu o "5G puro", especialmente depois de uma visita aos países onde ficam as sedes das fabricantes de equipamentos 5G.
Na Anatel, Baigorri disse que cabe à União, por meio da Anatel, definir qual será o padrão tecnológico a ser adotado.
Segundo ele, uma pesquisa recente feita pela GSMA, associação global das operadoras de celular, 85% dos operadores que já exploram o 5G comercialmente afirmam que se preparam para a adoção do stand-alone.
Para o conselheiro, não há motivos para o Brasil dar a largada do 5G com um passo atrás.