O texto autoriza, porém, a polícia e a Justiça a usarem como provas em inquéritos os dados das caixas-pretas, como as transcrições das conversas da cabine, mas não permite o uso processual de dados dos sistemas de notificação voluntária de ocorrências, como reportes de erros e problemas, e das análises e conclusões do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), da Aeronáutica, responsável por apurar tragédias aéreas no país.
Todas as informações dadas à Aeronáutica serão espontâneas e baseadas na garantia legal de seu uso exclusivo para prevenção, diz o texto. Segundo o artigo 88-J,as fontes e informações que tiverem seu uso permitido em inquérito ou em processo judicial ou procedimento administrativo estarão protegidas pelo sigilo processual. O repasse dos dados só ocorrerá mediante solicitação judicial.
A lei 12.970 foi proposta pelos militares durante tratativas com a CPI da Crise Aérea, em 2006, após o acidentes da Gol, que deixou 154 mortos em 2006, e foi aperfeiçoada no Congresso após as tragédias da TAM, que culminou com 199 mortes em junho de 2007, e da Air France, quando um Airbus caiu no Oceano Atlântico deixando 228 mortos em 2009.
O objetivo é proteger denúncias, depoimentos e as análises ainda em andamento dos casos. Pela legislação em vigor, a apuração de tragédias aéreas no país cabe ao Sistema de Investigação Sistema de Investigação e Prevenção (Sipaer), cujo órgão central é o Cenipa.
Esta lei vai de encontro ao que a Organização Internacional da Aviação Civil (ICAO) – do qual o Brasil é signatário – preconiza em relação à proteção das informações, em especial às que consideramos voluntárias e que são essenciais para investigação. O relatório final, com as conclusões do Cenipa, continua sendo público e ostensivo, diz o brigadeiro Dilton José Schuck, atual chefe do órgão.
Queríamos a proteção destas informações, porque nossa apuração é baseada em hipóteses e não segue o ritmo de um processo judicial ou de um inquérito, em que há direito ao contraditório. Na nossa análise, o direito a defesa nem sempre existe. Nossa investigação tem como objetivo a prevenção, busca fatos, informações, dados que podem ajudar a entender o que aconteceu, explica o brigadeiro.
Dados sob sigilo
Conforme o texto, são tratados como fontes da investigação do Sipaer:I – gravações das comunicações entre os órgãos de controle de tráfego aéreo e suas transcrições; II – gravações das conversas na cabine de pilotagem e suas transcrições; III – dados dos sistemas de notificação voluntária de ocorrências; gravações das comunicações entre os órgãos de controle de tráfego aéreo e suas transcrições; II – gravações das conversas na cabine de pilotagem e suas transcrições; III – dados dos sistemas de notificação voluntária de ocorrências; V – gravações das comunicações entre a aeronave e os órgãos de controle de tráfego aéreo e suas transcrições; V – gravações dos dados de voo e os gráficos e parâmetros deles extraídos ou transcritos ou extraídos e transcritos; VI – dados dos sistemas automáticos e manuais de coleta de dados; e VII – demais registros usados nas atividades Sipaer, incluindo os de investigação.
Os dados de notificação voluntária, como denúncias e relatos de perigo, dentre outros, além de análises e as conclusões do Cenipa sobre as tragédias não serão utilizadas para fins probatórios nos processos judiciais e procedimentos administrativos e somente serão fornecidas mediante requisição judicial.
Familiares de vítimas do acidente da TAM, porém, viram a sanção como um passo para trás na transparência de investigações.
Infelizmente, acho que estamos andando pra trás nesta questão de prevenção e este é mais um elemento que só dificulta a transparência de um processo que já é tão penoso para os familiares, diz o professor Dario Scott, que perdeu a única filha, de 14 anos, no acidente da TAM JJ3054, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, em 2007.Isso não deveria ocorrer sob sigilo, é um direito nosso acompanhar de perto.
Já o ex-chefe do Cenipa, o brigadeiro Jorge Kersul Filho, que investigou os acidentes da Gol, da TAM e da Air France, que deixou 228 mortos ao cair no Oceano Atlântico em 2009, vê a aprovação como uma evolução.É um passo importante para o país ter esta legislação. É muito difícil investigar algo se as pessoas não se voluntariarem a dizer para o Cenipa e queríamos proteger estas informações", diz ele.
G1