Ciclovia na Cruz Cabugá é mais utilizada como calçada (Foto: Thays Estarque/ G1)
No Dia Nacional do Trânsito, celebrado nesta sexta-feira (25), vêm à tona todas as discussões em torno das possíveis soluções para o atual quadro caótico que as grandes metrópoles enfrentam, com muitos congestionamentos e poluição. O uso de bicicletas é uma delas. Mas na Região Metropolitana do Recife, essa solução está longe de se tornar realidade. O maior disparate é que nenhuma das poucas coclovias existentes cruza as grandes vias.
De acordo com o governo estadual, a Região Metropolitana do Recife tem apenas 50 quilometros de ciclovias e ciclofaixas, quando o Plano Diretor Cicloviário (PDC) do Estado prevê 546 quilômetros. O projeto, criado em 2013, foi transferido da Secretaria das Cidades para a pasta de Turismo e atualmente segue estagnado. Enquanto isso, os ciclistas enfrentam diariamente a falta de estrutura e segurança.
Grandes vias como a Avenida Caxangá, na Zona Oeste; a Avenida Mascarenhas de Morais, na Zona Sul; e a Avenida Presidente Kennedy, em Olinda, não contam com nenhum espaço reservado para a circulação de ciclistas. Em contraponto, há vias quase sem movimento que têm ciclovias, como a paralela da Estrada de Belém, na Zona Norte, a Avenida Cruz Cabugá, próximo ao Cemitério dos Ingleses; e a paralela da Mascarenhas de Morais.
O coordenador geral da Associação Metropolitana de Ciclistas do Grande Recife (Ameciclo), Daniel Valença, comentou que o governo optou por construir essas ciclovias em ruas calmas e com poucos automóveis. “Já trocaram o PDC de uma pasta destinada a estruturação de uma cidade para uma secretaria que trata de lazer. A impressão que dá é que não querem incomodar quem tem carro”.
Valença ainda comenta que a Região Metropolitana é propícia para a cultura da bicicleta, pois é bem arborizada e com um relevo plano, porém, o que falta é a vontade política para colocar em prática. “Nem uma contagem de ciclistas o governo estadual fez. Como vai elaborar um projeto sem o conhecimento do cenário?”, questionou.
Ciclistas
Uma contagem realizada pela Ameclico no dia 9 de setembro deste ano, no período das 6h às 20h, constatou que mais de 3 mil ciclistas passam pela Avenida Caxangá diariamente. Desses, 20% utilizam a faixa exclusiva dos BRTs para se locomover. Um desses usuários é o engenheiro de software Rudiney Barboza, de 32 anos.
Barboza contou que essa é a solução encontrada pelos ciclistas, já o que poder público ainda não enxergou a problemática da situação. “Esse improviso é uma resposta à clara falta de interesse e investimento do governo. Não adianta fazer propaganda para o cidadão pedalar nos finais de semana sem proporcionar uma real estrutura para tornar essa prática cotidiana”, concluiu.
Entregador ou "bikeboy", como se define, desde 2011, Cláudio Santos, de 33 anos, roda cerca de 50 quilômetros por dia. Ele trabalha com entrega e assinatura de documentos e passa por vários bairros do Recife como Ilha do Leite, Boa Vista, Centro, Recife Antigo, Santo Amaro e Afogados. “Você conta nos dedos os locais que têm estrutura para receber o ciclista. É falta de espaço, é falta de educação no trânsito, é falta de respeito mesmo”, desabafou.
Santos contou também que já se acostumou com o pique de pedalar pela cidade, mas que ainda tem um pouco de medo, principalmente quando cruza a Avenida Sul, por causa da velocidade dos carros. “Vira uma rotina, é algo inevitável, mas quando me perguntam como é, eu digo: uma selva”, completou. “Queria trabalhar tranquilo e com menos ameaças de carro. Queria poder incentivar as pessoas a aderirem a ideia sem me sentir culpado”.
A Secretaria de Turismo destacou que precisa de outros projetos para poder executar o que está no papel. “A gente já está tendo reuniões para avaliar e analisar os projetos tanto do corredor Norte-Sul como do Leste-Oeste, e toda a rede cicloviária que faz parte do estado, que seriam 249 quilômetros de ciclovia metropolitana”, explicou Rosaly Almeida, que é gerente de ciclomobilidade da Secretaria de Turismo, Esporte e Lazer de Pernambuco. Segundo ela, o projeto conceitual está sendo elaborado para ser apresentado ao governo e às prefeituras.
Problemas
Na PE-15, em Olinda, há uma ciclofaixa improvisada, às margens da rodovia, mas nem parece que é um espaço destinado às bicicletas. Há carros estacionados, lixo espalhado e até um trecho de uma passarela que nunca foi instalada. “Às vezes tem muito buraco e a gente tem que ir para a pista”, reclamou o técnico em refrigeração Carlos Henrique da Silva.
Os motoristas também reclamam do perigo de ter que dividir o mesmo espaço com os ciclistas. “Deveria ter uma faixa separada para eles, mas não tem”, disse o representante comercial Rafael Monteiro. O autônomo Edvaldo Lourenço, que depende da bicicleta para trabalhar, concorda. “Tem que ter muita atenção, porque com qualquer vacilo pode acontecer um desastre”, disse.
Em Afogados, na Zona Oeste do Recife, há uma ciclofaixa na Rua Cosme Viana, mas não há sinalização. Mais à frente, o asfalto está sinalizado, mas carros, motos e até uma ambulância invadem a faixa.
A Prefeitura do Recife informou que tem equipes fazendo rondas para fiscalizar as ciclofaixas. A multa para quem for flagrado passando de carro ou moto pela faixa é de R$ 191,54, além de sete pontos na carteira de habilitação. A infração é gravíssima.
Segurança
Quem anda de bicicleta, seja na ciclofaixa ou na pista, dividindo espaço com os carros, precisa prestar muita atenção. O coordenador do Pedal Clube, Odilon Dias, explica que é preciso manter o fluxo, circulando no mesmo sentido dos carros. O Pedal Clube, que foi fundado há 28 anos, promove passeios de bicicleta.
“[É preciso] procurar andar na direita, nunca na esquerda, porque é contramão. Parar nos sinais vermelhos, não andar de bicicleta utilizando o celular. Se for usar fone de ouvido, use só um lado, para poder ouvir melhor o trânsito e se defender”, orienta Dias. Ele lembra também que o ciclista que for atravessar a faixa de pedestres deve descer da bicicleta.
A sinalização também é importante para os ciclistas. “Ele deve sinalizar com os braços. Se vai entrar à direita, levanta a mão esquerda, se vai entrar à esquerda, é só esticar, alongar o braço. Esses pequenos avisos evitam acidentes”, pontua Odilon.
Fonte: G1