Entre Aspas

Cesáreas podem ter feito bebês ficarem grandes para o parto

Existe um velho enigma evolutivo. Em comparação com outros primatas, o parto humano é mais difícil. Isso porque o bebê humano é proporcionalmente grande, e o canal pélvico materno, estreito. Foi importante para a evolução humana que fosse assim. Desenvolvemos um cérebro grande que nos dá inteligência. E nos tornamos bípedes, sendo a pelve estreita fator de maior destreza.

Contudo, essas características resultam em dificuldades no parto. Um trabalho estatístico publicado nesta segunda-feira (5) na revista Pnas mostra que, se a evolução da humanidade já era acompanhada por possíveis fatores de complicação na hora do bebê nascer, a desproporção entre o tamanho do bebê e do canal pélvico feminino aumentou entre 10% e 20% nos últimos anos, e isso pode ter relação com a adoção de cesarianas.

O estudo realiza uma previsão da influência da cesárea na evolução humana recente com base em um modelo matemático. "O uso regular de cesarianas se acentuou nas décadas de 1950 e 1960 em países industrializados e disseminou-se pelo mundo", diz o estudo liderado por Philipp Mitteroecker, biólogo da Universidade de Viena.

De acordo com os dados estatísticos, a cesariana contribuiu para um aumento na taxa de desproporção entre o tamanho do feto e o canal pélvico. Isso porque, ao reduzir a mortalidade materna e do bebê, o procedimento tem funcionado como fator de seleção natural das dimensões incompatíveis de mãe e feto.

Mitteroecker e sua equipe explica no artigo que o trabalho de parto ideal ocorre quando há um bom encaixe entre o tamanho do feto e a abertura pélvica da mulher. Assim, desde que a abertura pélvica suporte o tamanho do bebê, quanto maior o feto, mais eficaz é o parto. Contudo, há um limite além do qual o parto natural torna-se impossível. A disseminação das cesáreas contribui para a seleção de bebês grandes, de mulheres com canal pélvico estreito ou de ambos.

O tamanho do feto e do canal pélvico varia de forma independente. Para cada uma dessas características, há influência de fatores genéticos (com os genes do pai pesando no desequilíbrio entre dimensões da mãe e do bebê), morfológicos (relacionados ao corpo e à idade da mulher) e ambientais. A variação da compatibilidade entre o tamanho do feto e do canal pélvico da mãe é grande. E apesar da maioria dos partos ocorrerem com dimensões compatíveis, há uma margem de incompatibilidade que tende a aumentar com as cesarianas.

Evolução contraditória
Segundo a pesquisa, na evolução da humanidade, foi vantajoso que um bebê nascesse grande e que a mulher tivesse um canal pélvico estreito. Contudo, essas características são contraditórias. "É intrigante pensar por que o canal pélvico não evoluiu para ser mais amplo e reduzir as taxas de obstrução de trabalho de parto", dizem os pesquisadores no artigo.

A explicação dessa contradição está no acaso da evolução. O andar bípede surgiu entre 4 e 5 milhões de anos atrás, "muito antes do tamanho do cérebro começar a aumentar, há 2 milhões de anos", segundo o artigo. Além de conferir maior destreza, a cavidade pélvica estreita é vantajosa por suportar melhor o peso de órgãos e do bebê na postura bípede. Entre quadrúpedes, não ocorre essa pressão sobre a pelve.

"O prolapso e outros problemas são comuns durante a gravidez, sugerindo um sistema muito sensível a perturbações. Uma cavidade pélvica larga aumentaria a probabilidade de problemas", dizem os pesquisadores.

"Bebês com maior cérebro possuem maior tamanho, o que estava fortemente associado a maior taxa de sobrevivência infantil e a maior resistência a doenças diversas". Dessa forma, os bebês maiores passaram a nascer por um canal pélvico adaptado ao andar bípede.

Incompatibilidade gera complicações no parto
Essa contradição inerente à morfologia do corpo humano leva à morte materna ou do bebê ou a problemas graves após o parto. "A incidência de trabalho de parto obstruído em seres humanos é surpreendentemente alta, na faixa de 3% a 6% em todo o mundo", dizem os pesquisadores. Na maioria das vezes, a desproporção está relacionada ao tamanho da cabeça e dos ombros do recém-nascido e as dimensões pélvicas da mãe.

Os pesquisadores mostram que a desproporção varia bastante na população. "Estimativas mostram que na África, as taxas de desproporção cefalopélvica variam entre 1,4% a 8,5%. Já estatísticas dos EUA sugerem taxas de desproporção de 2,3% para bebês com peso de 3,9 kg ao nascer e 5,8% para os que pesam 4,0 kg ou mais", afirmam.

Fonte: UOL

Redação

About Author

Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

Você também pode se interessar

Entre Aspas

Primeiro smartphone ‘em Braille’ do mundo será lançado este ano

Em vez de fazer uso da conversão de texto em voz, o aparelho de Sumit Dagar recorrerá a uma tecnologia
Entre Aspas

CRÉDITO IMOBILIÁRIO