Agência Brasil
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, se reuniu na sexta-feira (26) com as coordenadorias estaduais dos Tribunais de Justiça para discutir ações de enfrentamento à violência contra a mulher. A reunião, fechada para a imprensa, foi uma iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também presidido pela ministra.
No encontro, Cármen Lúcia expressou um posicionamento favorável à Justiça Restaurativa, que consiste em uma técnica que busca absorver os anseios das vítimas e dos agressores. Ela defendeu, ainda, a ampliação da dedicação das varas voltadas ao atendimento a mulheres. Atualmente, há apenas 115 unidades. A maioria dos juizados e varas especializados foi criada após a promulgação da Lei Maria da Penha, em 2006, como aponta diagnóstico do Senado.
A desembargadora do Paraná Lenice Bodstein reconheceu o progresso levado aos tribunais pela Lei Maria da Penha e evocou, como aceno da “mudança de mentalidade”, a portaria que instituiu, no Dia Internacional da Mulher deste ano, a política judiciária nacional de combate a crimes dessa natureza. O dispositivo traria “elementos para que se repense, se crie novos mecanismos, novas ferramentas de concretização dos objetivos da Lei da Maria da Penha”.
Suporte às vítimas
Lenice avaliou como oportuno o debate sobre a necessidade de incrementar o suporte às vítimas com elementos que ultrapassam a assistência judicial. O zelo extra consistiria em uma “restauração familiar posterior aos eventos de punição. Somente a judicialização dessas questões não resolve, porque, como explicitou a própria lei, ela depende de políticas públicas de cumprimento, da integração de vários agentes do Legislativo, do Executivo, de políticas privadas e, mais, esse coibir não é somente coibir e penalizar, é também atender ao agressor, atender à vítima”, afirmou.
A desembargadora defendeu o reforço de procedimentos direcionados aos agressores, já que, segundo ela, 99% deles foram alvo de violência doméstica. Adicionalmente, ela alertou para uma importante interpretação das medidas protetivas “que são objeto de muita preocupação, não só no número de processos, mas porque demonstram uma repetição de atos. Então, para resolver, precisamos implementar a questão psicossocial mesmo. Precisamos de equipes multidisciplinares, conselhos da comunidade, projetos intraestatais e não só a execução da pena”, esclareceu.
A atitude da polícia é de extrema relevância para o desfecho de casos de violações dos direitos da mulher. Os agentes representam, muitas vezes, o primeiro contato da ruptura do ciclo de violência, que envolve períodos de agressão alternados pelos de perdão e culpa da vítima. O comportamento da estrutura policial pode tanto encorajar como desanimar a vítima a oficializar a queixa.
O quadro é frequentemente acentuado pelo vínculo afetivo da vítima com o ofensor, que é, em 80% dos episódios, seu parceiro, como indica levantamento da Fundação Perseu Abramo e do Serviço Social do Comércio (Sesc).
Medida protetiva
Atenta a esse aspecto, a representante do Pará na reunião, Diracy Alves, afirmou que após insucesso na preparação de policiais desde 2011, ela tem recorrido à aceleração da medida protetiva, que passou a ser garantida pela equipe de plantão. O plano é fortificar as orientações de conduta através da multiplicação de conhecimento por comandantes das 12 divisões locais. “A gente tá cansada de falar. A gente tem que ter ações para pôr em prática”, disse.
O Pará, que foi o primeiro estado a ter o Tribunal de Justiça presidido por uma mulher, registrou, em 2016, 5.107 medidas protetivas e concluiu 10.421 processos.
Iniciativas do Judiciário
Com a Portaria nº 15/2017, o CNJ implementou a campanha Paz em Casa. No período de 21 a 25 de agosto, a intenção é de quantificar os resultados, por meio do cálculo de audiências, despachos e sentenças provenientes em todos os estados. Os dados serão coletados por um questionário.
O conselho também realiza, anualmente, desde 2007, a Jornada de Trabalhos sobre a Lei Maria da Penha. Ao final de cada encontro, é redigida uma carta contendo princípios que os tribunais devem adotar. Em 2016, entre as várias recomendações está a criação de um banco de dados de jurisprudência nacional e internacional sobre a temática.
Estatísticas
No ano passado, mais de 500 mulheres sofreram agressões físicas a cada hora e pelo menos 66% dos brasileiros testemunharam agressões a mulheres. Os dados foram exibidos na pesquisa Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil, elaborada pelo Instituto DataFolha, Instituto Avon e Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Ontem (25), por ocasião do Dia Laranja Pelo Fim da Violência contra as Mulheres, a ONU divulgou um relatório que revela que o custo da violência contra as mulheres equivale a 2% do Produto Interno Bruto mundial, ou seja, US$ 1,5 trilhão. Em 2017, a data adota o lema “Não deixe ninguém para trás: acabe com a violência contra as mulheres e as meninas”.