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O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, que em depoimento à Polícia Federal afirmou ter recebido pressão do presidente Michel Temer para liberar um empreendimento imobiliário em Salvador (leia aqui a íntegra), disse aos investigadores ter gravado conversas sobre o assunto. Foram alvo do "grampo" de Calero o próprio presidente, o ministro da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, e o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha.
Para que as gravações sejam periciadas e analisadas pela Polícia Federal é preciso que o Supremo Tribunal Federal autorize a abertura de investigação.
No depoimento à PF, Calero narrou ter recebido pressão de vários ministros para que convencesse o Instituto do Patrimônio Histório Nacional (Iphan) a voltar atrás na decisão de barrar o empreendimento La Vue, onde Geddel diz ter adquirido um apartamento, nos arredores de uma área tombada de Salvador.
O ex-ministro disse que, após receber pressão de Geddel, procurou Temer para tratar do caso, mas o presidente o “enquadrou” para tentar buscar uma saída para o impasse na liberação do empreendimento.
A conversa com Temer ocorreu no Planalto no dia 17, véspera do pedido de demissão de Calero. Ainda segundo o ex-ministro, o presidente o “convocou” e lhe disse que a chefe da AGU, Grace Mendonça, teria uma “solução” para o caso da obra embargada pelo Iphan. No fim do diálogo, o presidente ainda teria tentado amenizar a situação, dizendo que a “política tinha dessas coisas, esse tipo de pressão”.
“Que na quinta, 17, o depoente foi convocado pelo presidente Michel Temer a comparecer no Palácio do Planalto; que nesta reunião o presidente disse ao depoente que a decisão do Iphan havia criado ‘dificuldades operacionais’ em seu gabinete, posto que o ministro Geddel encontrava-se bastante irritado; Que então o presidente disse ao depoente para que construísse uma saída para que o processo fosse encaminhado à AGU, porque a ministra Grace Mendonça teria uma solução”, diz a transcrição do depoimento.
Em nota divulgada ontem, Grace diz que jamais recebeu orientações para direcionamento nas manifestações do órgão e que tampouco aceitaria qualquer tipo de interferência.
"Pressão". Na semana passada, ao deixar o cargo, Calero acusou Geddel de “pressioná-lo” para que o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) liberasse a construção.
Em 6 de novembro, Calero afirmou ter recebido “a mais contundente das ligações” de Geddel. No telefonema, o ministro da Secretaria de Governo deixou claro “que não gostaria de ser surpreendido com qualquer decisão que pudesse contrariar seus interesses”. Na versão do ex-ministro da Cultura, Geddel disse, “de maneira muito arrogante”, que, se fosse preciso, “pediria a cabeça” da presidente do Iphan, Katia Bogéa, e falaria até mesmo com Temer.
Calero contou à PF que tanto Padilha quanto Temer insistiram para que ele levasse o processo sobre o prédio à Advocacia-Geral da União. Relatou ainda sua contrariedade com as pressões e desabafou com Nara de Deus, chefe de gabinete de Temer, que teria ficado “estupefata”.
Segundo Calero, a decisão de deixar o governo veio depois da conversa com Temer e quando o secretário de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo Rocha, telefonou para ele demonstrando a “insistência do presidente” em fazer com que ele interferisse “indevidamente” no processo, enviando os autos para a AGU.
O depoimento de Calero foi encaminhado pelo Supremo Tribunal Federal à Procuradoria-Geral da República e a tendência é que seja aberta uma investigação formal sobre o caso. No despacho em que trata das declarações, a PF pede a abertura de inquérito.
O Estado não localizou o ex-ministro nesta quinta-feira.
Porta voz. O presidente Michel Temer escalou o porta-voz Alexandre Parola para responder e rechaçar as acusações feitas pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero. Segundo Parola, o presidente “conversou duas vezes” com Calero para “solucionar impasse na sua equipe e evitar conflitos entre seus ministros”. Disse ainda que “jamais induziu algum deles a tomar decisão que ferisse normas internas ou suas convicções”.
Falando em nome de Temer, o porta-voz afirmou ainda ter ficado “surpreso” com “boatos” de “ supostas gravações” de Calero de conversas com o presidente. “Surpreendem o presidente da República boatos de que o ex-ministro teria solicitado uma segunda audiência, na quinta-feira (17), somente com o intuito de gravar clandestinamente conversa com o presidente da República para posterior divulgação”, declarou Parola. No mesmo dia 17, Calero já havia se encontrado com Temer para relatar a suposta pressão de Geddel.
Segundo o porta-voz, Temer conversou duas vezes com o então titular da Cultura para solucionar impasse na sua equipe e evitar conflitos entre seus ministros. Parola disse ainda que Temer “sempre endossou caminhos técnicos para solução de licenças em obras ou ações de governo” e que reiterou essa mesma postura ao novo ministro da Cultura, Roberto Freire, “que recebeu instruções explícitas para manter os pareceres técnicos, que, reitere-se, foram mantidos”.
A mensagem – escrita agora à noite, depois de uma reunião de emergência com sua equipe de comunicação – diz ainda que o presidente buscou resolver o conflito entre Calero e Geddel “sugerindo a avaliação jurídica da Advocacia Geral da União, que tem competência legal para solucionar eventuais dúvidas entre órgãos da administração pública”.
Mesmo sem ter sido citado nas matérias supostas gravações de Calero, o porta-voz disse ainda que o presidente ficou surpreso com “surpreendem o presidente da República boatos de que o ex-ministro teria solicitado uma segunda audiência, na quinta-feira (17), somente com o intuito de gravar clandestinamente conversa com o presidente da República para posterior divulgação”, disse Parola.
Fonte: Estadão