As luzes das atrações o dia a dia do circo envolvem muito trabalho, não somente por conta do espetáculo como também por conta da própria manutenção do circo, como limpeza, pintura e solda. Logo pela manhã o picadeiro já estava a todo vapor. Ainda era cedo para o começo do espetáculo, mas os barulhos vindos de dentro entregavam uma manutenção. Sem contar os ensaios diários de alguns números que acontecem todos os dias.
A manutenção do circo se dá através dos próprios circenses, mas várias pessoas são contratadas temporariamente em cada cidade para realizar algumas tarefas. Segundo Robert Ramos, apresentador do espetáculo, o Circo Broadway tem 42 anos e gera de 20 a 30 empregos indiretos por temporada na cidade.
O circo foi criado por seu pai e avô — na época, o Broadway passou por diversos nomes para chegar ao atual. Apesar do tempo de fundação, a tradição circense está na família de Robert há mais de 100 anos; são quatro gerações apaixonadas por esta arte. Robert vive com o irmão Roger, filhos e cunhada no circo.
Diferente de Robert, que nasceu no Broadway, o palhaço Marcos Vinícius tem pouco tempo nele. “O artista de circo é como se fosse um jogador de futebol: hoje tá em um time, depois em outro”, explica. Entre idas e vindas, em 2005 ele retornou ao circo, permanecendo até o momento da publicação desta matéria. Segundo ele, o Broadway é o circo em que mais está passando tempo.
Com 43 anos de idade, Marcos começou aos 12 anos a trabalhar em circos. Ele explica que começou como palhaço, sendo cansativo a ponto de sua mãe tirar sua maquiagem após os espetáculos com ele deitado na cama, mas afirma que gostava. Anos mais tarde, se aventurou no trapézio, porém sofreu um acidente em junho de 1999, ficando com o rosto irreconhecível. Hoje atua somente como palhaço.
Marcos tem três filhos e uma neta. Separado da mãe das crianças, ele vive com sua atual esposa – que conheceu através de grupos de circo no WhatsApp – e sua filha Jade, que também trabalha no espetáculo. Por conta da rotina circense, que demanda viagens semanais ou mensais de cidade em cidade, ele até hoje não pôde conhecer pessoalmente sua neta com pouco mais de um ano. Também não vê os filhos Vinícius, de 14 anos, e Jéssica, de 23 anos.
Ao todo são seis famílias vivendo juntas – que se tornam uma grande e única família –, e existem os lados bom e ruim, como aponta Robert. “Não é fácil você morar onde trabalha, viver onde você trabalha. Então, ao mesmo tempo em que estamos trabalhando, a gente procura se divertir”, explica. “A gente tenta viver como uma família normal”, completa.
Particularmente, Robert conta que dias de folga para ele são complicados, por sempre estar atarefado, mas quando há um tempo livre, procura dedicá-lo ao lazer e à família. Em dias comuns, acorda cedo e busca cuidar do Facebook do circo, trabalhando em divulgação e respondendo dúvidas frequentes. Além do próprio espetáculo, corre atrás do que for necessário para a manutenção do circo.
Em dias de apresentação, Marcos acorda às 10h e cuida de seus afazeres como a manutenção das carretas, ônibus e trailers, envolvendo em sua maioria a pintura dos veículos. Por volta das 17h, quando geralmente terminam as obrigações do dia, toma banho e descansa para o show. Em contrapartida ao cansaço esperado, ele conta que dorme após às 3h da madrugada porque está “naquele embalo”, como diz, e acaba não dormindo ao ver filmes e conversar com esposa e filha.
Educação
Desmistificando a ideia de que os artistas circenses não têm uma real escolha quanto à profissão seguida, principalmente quando são criados desde o berço dentro do circo, Robert conta que já teve a oportunidade de escolha. Ele fala que chegou a ficar afastado do circo durante cinco anos, dedicando-se aos estudos, mas, acostumado com a rotina, ele confessa que quase entrou em depressão, se reencontrando somente ao voltar ao circo.
Aprovada pelo Ministério da Educação (MEC) em 2012, há uma resolução que garante vagas às crianças em situação de itinerância — aquelas que trabalham em circos ou pertencem a famílias ciganas, por exemplo. Não só a garantia de matrícula, mas a resolução também propõe que as escolas se adequem aos alunos devido à rotina incomum se comparada aos demais, para assim conseguir assegurar o acesso, permanência e conclusão de estudos. Caso não houver documentos que comprovem que a criança já tenha estudado, ela deve ser matriculada na série correspondente a sua idade e necessidades de aprendizagem.
Quando conversamos com os circenses, tivemos a oportunidade de falar com Roger e Renzo, filhos de Roger Ramos que haviam acabado de chegar da escola. Eles contam que gostam da rotina, mesmo com a troca constante de escolas, e explicam que o tratamento dado a eles é igual ao dos outros alunos.
Robert conta que as matrículas nas escolas são sempre um grande desafio. “O fato de a gente ser do circo às vezes gera algum preconceito em algumas pessoas. Não todas, têm pessoas que recebem a gente maravilhosamente bem, algumas escolas também. Mas tem muitas escolas que criam barreiras, não querem que as crianças de circo estudem ali, mas como a gente, geralmente, já leva a lei – quando vemos que temos barreiras – e a mostra, eles [a escola] voltam atrás”, explica.
Há seis anos, em Tocantins, as crianças do Circo Broadway tiveram uma enorme dificuldade para conseguir vagas nas escolas; das quatro tentativas iniciais, todas negaram. Roger conta que o padre responsável pela Escola Santa Cruz, ao saber da história, cuidou para que as matriculas acontecessem. Todas as crianças do circo conseguiram suas vagas.
O circo
Fundado em 1976, o circo já chegou a passar em 42 cidades durante um ano. Localizado no estacionamento do Pantanal Shopping, o Circo Broadway permanece em Cuiabá até o dia 25 de maio. De segunda a sexta, as sessões estão marcadas para às 20h30; nos finais de semana, são três horários: 16h, 18h e 20h30. Ao fim da temporada na cidade, o circo vai para Várzea Grande.