Hoje (31/8) o desembargador Paulo da Cunha completa a idade máxima para exercer o cargo de magistrado de acordo com a regra constitucional vigente, tendo atuado por 22 anos no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, sendo merecedor de todas as loas por ter sido um grande julgador sensível e preparado, na verdade um diamante lapidado pela prática da mais pura justiça, como um singelo agradecimento pelos serviços prestados a sociedade mato-grossense.
Formado em Direito nas Faculdades Metropolitanas Unidas de São Paulo (FMU) no ano de 1974, o desembargador Paulo da Cunha veio advogar no ano de 1975 na cidade de Cáceres e em 1979 foi aprovado no concurso de ingresso na carreira do Ministério Público de Mato Grosso, tomando posse como promotor de justiça na Comarca de Barra do Bugres no ano de 1980. Posteriormente foi promovido pelo critério de merecimento ao cargo de procurador de Justiça no ano de 1990.
No ano de 2002 Paulo da Cunha passou a integrar o Tribunal de Justiça de Mato Grosso como desembargador na vaga destinada ao quinto constitucional do Ministério Público, onde foi vice-presidente (2009/2011), diretor da Escola Superior da Magistratura do Estado de Mato Grosso (2011/ 2013) e presidente da Corte de Justiça (2015 a 2016).
Deve ser relembrado nesta oportunidade que Paulo da Cunha foi emérito professor de direito processual penal, referência para seus alunos do curso de direito, mostrando toda a qualidade de sua cátedra nas milhares de decisões que proferiu ao longo de mais de duas décadas no sodalício mato-grossense, conhecido por estar sempre na vanguarda da aplicação do direito penal.
Homem educado, lhano, fino, sensível, com fala mansa e sorriso sincero, detém uma autoridade moral invejável, sendo certo que a partir de agora o desembargador Paulo da Cunha vai deixar uma grande lacuna ao se despedir do exercício da judicatura, pois a toga lhe cairá bem por toda a existência. E como prova de todos esses predicados, basta ser lida a carta de despedida aos seus colegas do Poder Judiciário, que por todo simbolismo merece aqui ser reproduzida.
“Prezados colegas,
Na iminência da aposentadoria, sinto-me associado às palavras do apóstolo Paulo: ‘Combati o bom combate’. Na qualidade de magistrado, atuei por quase 22 anos. Ao longo desse tempo, soneguei significativas horas de convívio aos meus, sabedor de que o fiz em bem do melhor desempenho das funções a que fui convocado. Ouso dizer que, em tempo algum, me apequenei diante dos encargos que os pares a mim confiaram.
Por ditosa ventura, percorri esta estrada ladeado de homens e mulheres dignos, pessoas de erguido mérito intelectual e ético. Nesse caminhar, pude comprovar quão verdadeiros são os dizeres do filósofo Goethe: ‘Nós viajamos não apenas para chegar, mas para viver enquanto estamos viajando’.
A bem dizer, não nasci juiz. Fui-me tornando juiz no dia a dia, buscando me lapidar nos embates que a Magistratura nos impõe.
Nesse ínterim, empenhei-me por semear a boa semente. Chegada a noite, esta me apanhou ainda com as mãos cheias. Lançando os olhos para o passado, depreendo que o Senhor se contentou com o que pude semear, na tarefa de distribuir justiça.
Confesso-lhes que muito aprendi. Aprendi que, a um réu, é irreparável injustiça um dia de prisão indevida. Aprendi que o julgador não deve se bafejar com palavras incensadoras da imprensa. Aprendi, sobretudo, que cada processo hospeda uma vida, nela agasalhados seus projetos e seus sonhos. Daí a importância de que nosso julgar seja a primor.
Sempre tive comigo que, em verdade, a imparcialidade nos deve ser companheira, distinguindo o agir do magistrado. Fiz dela meu farol. Agradeço-lhes a todos.
Honrado por ter feito parte de Instituição tão nobre, manifesto minha gratidão aos magistrados de ontem e de hoje. Carrego comigo um leque das mais especiais recordações.
Deus seja louvado!
Cuiabá, agosto de 2024 “
Desembargador Paulo da Cunha, com certeza Vossa Excelência se fez admirável juiz a cada dia de exercício da magistratura, conforme definiu com precisão o eminente desembargador paulista Edgar de Moura Bittencourt no seu excelente livro “O Juiz”. Mais ainda quando proferiu as suas decisões dando vazão a máxima latina Fiat justitia, et pereat mundus, longe, muito longe, das tentações mundanas trazidas pela mídia, sempre carregadas de vaidade fugaz, e sempre próximo da boa e correta aplicação da justiça.
Mesmo que o tempo o tenha feito guardar a toga, desembargador Paulo da Cunha, é preciso lhe registrar as lições de Santo Agostinho neste momento de despedida, gravadas indelevelmente nas lições de suas “Confissões, XI”, onde se aprende com a profundidade necessária que “Não houve tempo nenhum em que não fizésseis alguma coisa, pois fazíeis o próprio tempo. (Confissões, XI.)”.
Agora é o seu tempo de aproveitar os louros da glória do exercício bom e fiel da função de julgador que lhe foi confiada durante todo esse período, continuando a seguir com confiança e obediência aos ensinamentos de Deus, sem temer mal algum, certo de ter combatido o bom combate, terminado a corrida, guardado a fé, estando-lhe agora reservada a proteção da coroa da justiça para Vossa Excelência e toda sua família.
Por aqui seus verdadeiros e sinceros colegas de magistratura ficarão saudosos, mas nunca esquecidos do seu grande exemplo de juiz. Receba, pois, o nosso carinhoso, justo e perfeito abraço fraterno. Seja muito feliz na nova caminhada.