O Postalis, fundo de pensão dos funcionários dos Correios, desperdiçou pelo menos R$ 7,6 milhões de reais com taxas de empresas gestoras de recursos.
“Erros (gestão ineficiente)'' e “fraude'' estão entre as causas apontadas por uma auditoria interna dos Correios para os prejuízos do Postalis, que somaram R$ 2,56 bilhões em 1 ano e 8 meses (de jan.2013 a ago.2014).
Clique aqui para ler a íntegra do relatório de auditoria.
Em um dos casos, o Postalis pagou R$ 3,063 milhões em uma taxa cujo percentual não estava definido em contrato. Em outro, gastou R$ 4,567 milhões para que uma empresa privada administrasse “debêntures” de uma empresa, ao mesmo tempo em que o Postalis já administrava diretamente debêntures da mesma companhia.
[Contexto: debêntures são papéis de dívida de longo prazo de uma empresa. O comprador se torna “credor” daquela empresa, recebendo rendimentos e o valor principal ao fim do contrato.]
As informações são do repórter do UOL André Shalders.
No 1º caso, o valor foi gasto de janeiro de 2005 a agosto do ano passado. No 2º, de janeiro de 2013 a julho de 2014. Os achados são de uma auditoria interna dos Correios sobre o Postalis, obtida pelo Blog. O documento foi enviado ao fundo de pensão em 30.mar.2015.
Administrado por indicados políticos do PMDB e, mais recentemente, do PT, o Postalis passa por dificuldades financeiras há anos. 26,3 mil pessoas dependem dos benefícios pagos pelo fundo, segundo os últimos dados.
Os 2 repasses foram feitos a fundos de investimento geridos pelo banco BNY Mellon, de Nova York. No 1º caso, as perdas foram com o fundo de investimentos Brasil Sovereign II Fidex. No 2º, envolvem debêntures da Canabrava, empresa que controla usinas de cana e de álcool. Os pagamentos foram a outro fundo gerido pelo BNY Mellon, o FIC FIM Serengeti.
Questionado sobre o 1º caso, o Postalis se recusou a informar onde estava definida alíquota de 10% da taxa de custódia, paga ao longo de 9 anos.
Eis o que diz a auditoria dos Correios sobre o Brasil Sovereign: “Constatou-se, também, que, embora o pagamento da taxa de custódia estivesse previsto no regulamento do fundo Brasil Sovereign II Fidex, sua alíquota e base de cálculo não estavam. Assim, mesmo sem previsão regulamentar, o Postalis pagou taxa de custódia à alíquota de 10% sobre a taxa de administração, totalizando R$ 3.063.388,00 no período de 2005 a agosto de 2014”. A informação está no item 2.3.2 do relatório.
A seguir, o trecho da auditoria que trata das perdas com o Serengeti: “Constatou-se que o fundo terceirizado de terceiro nível FIM ASM Carbono, pertencente ao FIC FIM Serengeti, administrava os mesmos investimentos da carteira própria do Postalis. Os investimentos eram as debêntures da Canabrava Agrícola e da Canabrava Energética. Este fundo, até julho de 2014, despendeu, com taxa de administração, R$ 2.020.710,54, conforme planilha de acompanhamento do próprio Postalis. No ano de 2013, foram pagos, pelo mesmo motivo, R$ 2.546.488,97”.
E mais adiante: “(…) o Postalis possuía conhecimento dos investimentos via sistema interno (…) e não fez nenhum tipo de gestão para a troca ou resgate dos títulos da carteira terceirizada para a carteira própria e assim deixar de despender tais valores”. Esses últimos 2 trechos estão no item 2.6.3 da auditoria.
Outros fundos de pensão também sofreram perdas ao investir na usinas do grupo Canabrava. Em depoimento recente à CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Fundos de Pensão da Câmara, o presidente do BNY Mellon para a América Latina admitiu ter havido fraude em contratos com o Postalis, mas eximiu o banco de responsabilidade.
Em nota ao Blog, o Postalis informou já ter ingressado com ações judiciais contra o BNY Mellon (veja “Outro Lado” ao fim deste post).
Além da CPI na Câmara, possíveis irregularidades na gestão do Postalis são investigadas também pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Polícia Federal.
PERDAS DE R$ 2,56 BILHÕES EM 1 ANO E 8 MESES
Ao todo, a auditoria identificou prejuízos que somam R$ 2.569.355.497,38 no fundo de pensão. O valor foi perdido em 1 ano e 8 meses, de 1.jan.2013 a 31.ago.2014, em 33 investimentos do Postalis.
A auditoria, enviada ao Postalis em 30.mar.2015, é um dos documentos que embasarão o relatório da CPI dos Fundos de Pensão da Câmara. A CPI investiga fraudes e tráfico de influência em fundos de pensão de empresas públicas.
Ao todo, a auditoria fez 45 “constatações” sobre a gestão do Postalis. No jargão, a “constatação” é a análise de um tópico que pode ou não evidenciar fraude.
“Os erros identificados, espelhados nas Constatações registradas por esta auditoria, não são fraudes, mas facilitam a sua ocorrência'', diz um trecho. A auditoria traz ainda um alerta sobre a má gestão do fundo: “o fato de não terem sido arroladas outras fraudes além da ocorrida no Fundo de Investimentos em Dívida Externa (FIDE), não significa que elas não ocorreram, mas que fragilidades de controle apontam para a possibilidade de sua existência, o que recomenda apurações mais aprofundadas”.
A fraude envolvendo o BNY Mellon já é alvo de ação na justiça brasileira, conforme diz o Postalis (veja “Outro Lado'' ao fim do texto).
O relatório traz também uma análise do desempenho do fundo de pensão nos últimos anos. E o resultado é inferior ao de outras instituições do tipo. Esse fato, segundo os auditores, “sugere que a conjuntura econômica pode não ser suficiente para explicar o baixo desempenho”.
“(…) constata-se que os investimentos do Postalis vinham apresentando, nos últimos anos, desempenho descolado, para baixo, do conjunto das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), o que sugere que a conjuntura econômica pode não ser suficiente para explicar o baixo desempenho”, diz um trecho.
OUTRO LADO
O Postalis enviou nota ao Blog sobre o assunto, em que afirma ter ingressado com ação judicial contra o BNY Mellon, e obtido 2 decisões favoráveis. O processo tramita na 29ª Vara Cível do Rio de Janeiro.
O Fundo também representou contra o BNY Mellon no Banco Central, “para apurar irregularidades na conduta do Mellon perante as regras do Sistema Financeiro Nacional”.
“O BNY Mellon era o administrador e controlador fiduciário contratado no período, cuja responsabilidade contratual é objetiva. Caso outros problemas sejam identificados, a convicção do Instituto será mantida em exigir daquela entidade reparações aos prejuízos causados, através da responsabilidade fiduciária estipulada no referido contrato”, diz um trecho da resposta.
“Quanto às causas financeiras para o déficit, todas as suas origens foram identificadas e os esclarecimentos publicados nos meios de comunicação do Instituto, dentre os quais o site institucional, em noticias”, diz o último trecho da nota.
Fonte: UOL