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Awá-guajás estabelecem contato com índios isolados de reserva maranhense

Após décadas resistindo ao contato com outras pessoas, inclusive de sua própria etnia, três índios awá-guajás que viviam isolados no interior da Terra Indígena Caru, na região oeste do Maranhão, aceitaram a aproximação de outros awá-guajás e seguiram com eles até aldeias onde vivem índios há tempos habituados ao contato com não índios.

Segundo o coordenador regional da Funai no Maranhão, Daniel Cunha de Carvalho, trata-se de duas mulheres e de um adolescente da mesma família (mãe, filho e avó) que moravam sozinhos. No último domingo (28), um grupo aldeado de awá-guajás avistou a família enquanto procurava alimentos nas proximidades da aldeia Tiracambu. As circunstâncias do encontro ainda não estão claras, mas é possível que ao aceitarem a aproximação do grupo aldeado, as duas mulheres tenham identificado algum laço de parentesco com os aldeados, aceitando, assim, acompanhá-los até a aldeia.

O fato é tão incomum que a Funai interrompeu as férias do responsável pela Coordenação-Geral de Índios Isolados e Recém Contatados, Carlos Travassos, que viajou às pressas de Brasília para o Maranhão. Servidora da coordenadoria regional da fundação que também estava de férias teve que voltar ao trabalho e foi enviada à reserva indígena nessa segunda-feira (29) a fim de verificar a situação da jovem.

“Isso é um fato raro, já que há várias décadas esses grupos que vivem isolados têm resistido a fazer contato até mesmo com outros awás-guajás. Inicialmente, chegamos a imaginar que pudesse ter acontecido algo grave – como um problema de saúde ou reflexo da presença de madeireiros que atuam ilegalmente na terra indígena – e que se tratasse de uma tentativa de pedir ajuda”, disse Travassos.

De acordo com Carvalho, as duas mulheres e o adolescente passam bem. A Funai acionou o plano de contingência e pôs em prática as medidas necessárias à proteção dos índios isolados – suscetíveis a contrair alguma eventual doença contra a qual não tem proteção imunológica. O coordenador garante que uma equipe da Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, inclusive já foi deslocada para o local.

Habituada aos hábitos awá-guajás, com quem trabalha há quase 25 anos, a missionária do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Rosana de Jesus Diniz disse ter ficado “muito surpresa” com o fato. Segundo ela, há tempos os índios aldeados relatam encontrar vestígios da presença dos grupos isolados. Esta, no entanto, é a segunda vez em ao menos uma década que um contato entre grupos foi estabelecido espontaneamente.

O outro caso aconteceu há aproximadamente dez anos, quando awá-guajás de uma aldeia da Terra Indígena Awá encontraram mulher e filho, hoje um adolescente, sozinhos em uma espécie de cabana. Os dois hoje vivem na aldeia, mas, segundo Rosana, a mulher se mantém arredia e de pouca conversa.

Daniel e Rosana acreditam que a curiosidade natural dos awá-guajás não explicaria que qualquer índio isolado deixasse sua comunidade e se aproximasse sozinho de outro grupo. Para ambos, a degradação florestal causada pela ação de madeireiros e a consequente desorganização da coesão interna dos agrupamentos indígenas podem ajudar a entender o desfecho do encontro do último domingo.

“Até hoje, todos os contatos entre grupos se estabeleceram em virtude da destruição do território pela ação de não índios”, comentou Rosana. “Toda a região vem sofrendo com o desmatamento. Como, culturalmente, cada grupo awá-guajá delimita seu território de caça e coleta, a pressão que a presença de madeireiros e o desmatamento exerce pode estar contribuindo para que os grupos isolados percam a referência territorial e, sem outros meios de sobreviver, se aproximem cada vez mais uns dos outros e de grupos aldeados”, completou o coordenador regional da Funai.

O Estado brasileiro reconhece as terras indígenas awá-guajás há décadas. Mesmo assim, a extração ilegal de madeira continua e é objeto constante das denúncias de organizações ambientalistas e indigenistas e pelo Ministério Público (MP). Em janeiro, a pedido do MP, a Justiça Federal condenou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a União a instalarem postos de fiscalização guarnecidos para impedir a extração ilegal de madeira no interior das três terras indígenas contíguas existentes na região (Alto Turiaçu, Awá Guajá e Caru). O juiz chegou a estabelecer prazo de 120 dias para que os órgãos públicos federais comprovassem ter adotado as necessárias medidas para garantir a efetiva proteção das áreas. Segundo o MP, as determinações não foram cumpridas.

Das três reservas indígenas, a Caru é a mais desprotegida. Em razão disso, é a que mais tem atraído madeireiros. Ela foi reconhecida pela Funai em 1980, a partir do desmembramento da Reserva Florestal do Gurupi, que deu origem também à Terra Indígena Alto Turiaçu. Interligadas, as duas reservas (Caru e Turiaçu) formam, junto com a Terra Indígena Awá, homologada pelo governo federal em 2005, um complexo de áreas indígenas ocupadas principalmente pelos awas-guajás, mas também por índios ka’apor e guajajara.

Fonte: Agência Brasil

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