De acordo com o Index Mundi, banco de dados que recolhe informação demográfica por país, 44% da população tem menos de 14 anos e a média de idade no país é de 17, uma das mais baixas do mundo.
"A razão imediata é que a taxa de fertilidade é muito alta em Gaza e tem sido assim há muito tempo. Então a verdadeira questão é: por que as famílias em Gaza têm tantos filhos?", disse à BBC Jon Pedersen, pesquisador do Instituto de Estudos Demográficos da Noruega, conhecido como Fafo.
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A taxa média de filhos por família em Gaza é de 5,5, bastante elevada, mesmo se comparada com países da região: a taxa da Jordânia é 3,3; na Síria, 2,5; e no Líbano, 2,8.
Esta tendência mantém-se mesmo no caso de mulheres com altos níveis de educação, contrariando o que ocorre em todo o mundo.
Mulheres em casa
Um fator que contribui para este elevado número de crianças é que Gaza é também o lugar do mundo onde as mulheres trabalham menos. Apenas 5% das mulheres estão no mercado de trabalho, de acordo com Pedersen.
"É verdade que os países árabes têm tradicionalmente baixa participação das mulheres no mercado de trabalho. A Jordânia, por exemplo, tem 16%, o que é mais comum. Gaza é realmente um caso extremo."
Apesar do conflito com Israel, as famílias sobrevivem com um salário e as mulheres não têm de lutar com a dupla jornada. Com menos aspirações profissionais, a família torna-se o foco da vida delas.
Um estudo realizado pela Universidade de Roma, intitulado "Intifada, fertilidade e a educação das mulheres palestinas", observa que "apesar dos níveis relativamente altos de educação das mulheres em Gaza, poucas optam por ter uma carreira."
A alta taxa de fertilidade ocorre mesmo com acesso a métodos contraceptivos.
"Quando elas decidem parar de ter filhos, elas fazem usos desses métodos, mas quando chegam a esse ponto é porque elas já têm vários filhos", disse o pesquisador norueguês.
Mais crianças durante a intifada
A pesquisa da Universidade de Roma observa ainda que durante os anos da intifada, na década de 90, o número de casamentos e nascimentos chegou ao nível mais alto.
O estudo explica que, durante o levante, as mulheres estavam até mais propensas a casar com homens de níveis educacionais mais baixos. A taxa de natalidade subiu para oito crianças por família e, apesar de estar em queda desde então, ainda permanece entre as mais altas do mundo.
Por outro lado, as famílias têm filhos seguidamente, com uma diferença de idade muito pequena entre um e outro. Uma das hipóteses pela grande quantidade de filhos é que, no fundo, acham haver um grande risco de algum deles morrer no conflito com Israel.
"Ter mais filhos quando se sabe que há uma forte possibilidade de que algum morra pode com certeza ser um senso instintivo de sobrevivência", disse Pedersen.
Mas até que ponto a decisão de ter filhos é em resposta à ocupação israelense?
Pedersen observa que esta é uma outra hipótese que está sendo avaliada. "Embora os dados não permitam concluir isso com certeza absoluta, é possível que as pessoas queiram ter mais filhos para superar os israelenses em números populacionais."
O estudo de 2006 sobre a fertilidade durante a intifada também levanta essa possibilidade.
"Se os altos níveis de fecundidade registrados em Gaza durante os anos da intifada são uma resposta à opressão política, isso não pode ser inferido a partir dos dados, mas é um cenário provável", disse.
E também aponta que a reprodução é uma das poucas liberdades que sobraram aos palestinos.
As crianças mortas e desabrigadas pelo conflito em Gaza mostram, sem dúvida, um dos aspectos mais devastadores do conflito em Gaza. Mas, de acordo com estes especialistas, poderia também ser um indicativo de seu instinto de sobrevivência como povo.
"Em uma situação onde impotência, baixa taxa de emprego e marginalização deixa poucas oportunidades para expressar a identidade, a reprodução é uma das poucas liberdades que eles têm e também contribui para aumentar a população palestina", conclui o estudo da Universidade de Roma.
IG