A homenagem à Galera foi realizada no morro onde o piloto realizou o seu primeiro voo. Ninguém falava em tristeza, só em saudade e na paixão que ele tinha pela modalidade. “Era um amor tão grande que contagiou todos nós”, comentou uma das irmãs, Marlene Galera. Ela, sua mãe e sua filha, sobrinha de Galera, chegaram a voar por insistência do piloto. “A minha mãe foi a primeira e adorou. Em seguida fui eu, mesmo com medo de altura. E minha filha, quando viu a gente, se sentiu na obrigação de ir também”, contou.
De acordo com os amigos do homenageado, Galera foi apresentado ao esporte que marcou sua vida em 1994, quando estava na faculdade. Ele foi convidado pelos colegas do curso de Engenharia Elétrica a ir até o Morro do Voturuá, e lá se apaixonou pelo voo livre. “Ele fez um voo duplo, que é quando uma pessoa voa com um piloto. Depois começou a frequentar o curso e se tornou instrutor. Sabia muito do esporte, mas também do clima e da direção do vento”, explicou Samir Akl, um dos amigos do piloto.
Por causa da profissão, Galera viajou para vários lugares do mundo. Levava os equipamentos na mala, e quando estava de folga do trabalho, aproveitava o tempo voando. Mas, também participou de vários campeonatos nacionais e internacionais. Segundo Marlene, foi em uma dessas viagens que a luta contra o câncer começou. “Ele estava na Alemanha participando de um campeonato e começou a tossir. Uma tosse muito forte, e amigos dele viram que saía sangue. Então, insistiram para que o Galera fosse ao médico”, lembrou. Ainda no país, o piloto passou por exames que constataram a suspeita de câncer no pulmão. Em seguida, ele retornou ao Brasil.
Já em casa, a primeira reação do piloto foi telefonar para a mãe. “Ele ligou e contou o que estava acontecendo. Minha mãe é uma pessoa forte e reagiu de forma tranquila”, explicou Marlene, que soube do problema pela própria mãe. A família de Galera mora em Cajati, no Vale do Ribeira, interior de São Paulo, cidade onde ele nasceu. Já Marlene mora em Uberaba (MG). O piloto vivia sozinho em São Vicente, cidade que adotou quando começou a faculdade, e se recusou a voltar para perto dos pais quando confirmou a doença. “Ele foi corajoso, encarou numa boa e nunca desistiu. Era uma pessoa esclarecida, procurava os tratamentos sozinho”, afirmou a irmã. Além disso, Galera parou imediatamente de fumar, já que o cigarro foi apontado como a provável causa do câncer.
A luta contra a doença durou três anos e seis meses. Galera passou por várias cirurgias e sessões de quimioterapia. Um dos primeiros alunos e amigo do piloto, Samuel Santana, conta que ele foi campeão paulista depois de passar por uma das sessões. “Mesmo passando mal, sentindo dores, ele participou do campeonato paulista de parapente e venceu. Era um excelente instrutor”, diz o amigo.
Também doente, ele conheceu Alessandra Oliveira em um fórum sobre voo livre, na internet. Em Capixaba de Linhares (ES), ela e Galera se tornaram mais do que amigos, confidentes. O piloto estava em um relacionamento e ficou noivo no último Revéillon, mas a namorada faleceu quatro dias depois. “Ele sentiu a perda dela, e a nossa família ficou chocada. Estavam de casamento marcado”, contou Marlene. Foi quando Alessandra ‘caiu de paraquedas’. “Ela foi uma luz na vida dele, e nós somos gratos porque ela cuidou dele por nós”, acrescentou a irmã.
O piloto conversava com Alessandra todos os dias, e a amizade dos dois foi se transformando em amor. Então, ela deixou a vida em Linhares e veio cuidar do homem que amava. A capixaba passou a morar com Galera e acompanhá-lo em todos os tratamentos. Poucas pessoas sabiam do discreto relacionamento. “Uma moça fazia faxina uma vez por semana no apartamento do meu irmão e também me dava notícias dele. Assim, eu não ficava tão preocupada com ele aqui sozinho. Certo dia, ela encontrou o apartamento todo arrumado e não entendeu. Foi quando soubemos da Alessandra”, explicou Marlene.
Os últimos momentos de Galera foram vividos ao lado de Alessandra. O casal, que fez planos para o futuro, foi separado quando o câncer se multiplicou pelo corpo do piloto, que não conseguiu mais lutar. “Ele era tão forte que foram precisos cinco focos da doença para derrubá-lo”, disse a namorada. Ela prometeu ao piloto que ele seria cremado, e teria suas cinzas espalhadas durante um voo, exatamente como ele queria.
Enquanto tentava se curar, Galera compartilhava suas conquistas e aflições nas redes sociais, e também escrevia um livro sobre sua vida. A irmã comentou que a família ainda não teve acesso ao conteúdo, mas pretende divulgar a história do irmão. “É uma trajetória que merece ser contada para inspirar muitas pessoas, porque ele era uma grande inspiração”, completou.
G1