Protagonistas no mercado, Botafogo, Palmeiras e Flamengo movimentaram juntos mais de R$ 1,3 bilhão em reforços nesta temporada, contando as duas janelas de transferências do ano. A primeira foi encerrada em fevereiro e a segunda será fechada em 2 de setembro, o que leva a crer que mais alguns milhões serão movimentados.
Como desmontou seu elenco campeão brasileiro e da Libertadores em 2014, o Botafogo, cujo SAF é comandada pelo excêntrico magnata americano John Textor, contratou mais de um time neste ano.
São 15 atletas novos que, juntos, custaram R$ 629,4 milhões, sem levar em conta os jogadores que vieram sem custo de transferência, apenas pagamento de bônus e luvas, caso, por exemplo, do atacante argentino Joaquín Correa, que veio da Inter de Milão. O clube alvinegro puxa a lista dos que mais contrataram, tanto em número de atletas, como em valores.
O Palmeiras é o segundo que mais investiu em reforços neste ano, superando meio bilhão. São R$ 534 milhões desembolsados para adquirir sete atletas – Bruno Fuchs veio por empréstimo e não entra na lista.
O valor supera as receitas de 11 clubes da Série A do Brasileirão em 2024. E o aporte será maior até o fechamento da janela porque o clube anunciou nesta segunda a contratação do lateral-direito Khellven, do CSKA, e procura um novo meio-campista para substituir Richard Ríos, vendido ao Benfica por R$ 195 milhões.
Se ninguém gastou mais que o Botafogo, nenhum clube pagou mais que o Palmeiras por um único atleta. Vitor Roque é o jogador mais caro da história do futebol brasileiro. O clube paulista investiu R$ 154 milhões para repatriar o ‘Tigrinho’, que marcou quatro gols desde que retornou ao Brasil. Para se reforçar com Paulinho, o segundo mais caro, teve de pagar R$ 114 milhões ao Atlético-MG.
Já o Flamengo resolveu fazer “contratações europeias” ao buscar o ponta Samuel Lino, atleta mais caro da história do clube, comprado por cerca de R$ 143 milhões, o atacante colombiano Jorge Carrascal, o lateral-direito Emerson Royal, e os meio-campistas Jorginho e Saúl Ñíguez. Todos vieram da Europa e custaram, junto do atacante Juninho, adquirido no início do ano, R$ 315 milhões.
Mas de onde vem tanto dinheiro para bancar contratações milionárias, superando até mesmo investimentos de alguns clubes europeus? A resposta está nos modelos de gestão e fontes de receita distintas nos casos de Flamengo e Palmeiras, que são os clubes que mais arrecadaram no País em 2024: R$ 1,3 bilhão e R$ 1,2 bilhão, respectivamente.
A invejável capacidade financeira e de investimentos de Flamengo e Palmeiras foi construída ao longo de mais de uma década. Ambos reestruturaram suas finanças a partir de 2013 e 2014, respectivamente, e colhem há quase uma década frutos que permite serem financeiramente mais sustentáveis que seus rivais, constata o economista Cesar Grafietti.
“Não tem segredo: dívidas controladas e equilíbrio entre receitas e custos”, resume o economista, um dos mais importantes estudiosos da gestão e finanças do esporte.
Alavancaram, e muito, a receita do Palmeiras a bilheteria do Allianz Parque, o programa de sócio-torcedor Avanti e, principalmente, a venda de jovens atletas. Somente Estêvão e Endrick renderam mais de R$ 700 milhões ao clube. No Flamengo, clube de maior torcida do País, destacam-se as ações de marketing e o dinheiro referente à venda de direitos de televisão (R$ 292 milhões em 2024, sendo R$ 197 milhões provenientes do pay-per-view).
“Alguns desenvolvimentos importantes, como a chegada do Allianz Parque e a reformulação profunda das categorias de base para o Palmeiras, e o reforço das ações comerciais no Flamengo. Essa soma de fatores garantiram desempenho ao longo do tempo, e isso se reverteu em mais dinheiro, culminando com a participação no Mundial de Clubes”, completa Grafietti.
No caso do Botafogo, trata-se de um “novo rico”, endinheirado assim que se tornou SAF e foi comprado pelo magnata John Textor em 2022 por R$ 400 milhões.
Ele é proprietário da Eagle Football Holdings, um conglomerado de clubes a nível mundial que conta com participações majoritárias, além do Botafogo, no Lyon, da França, e no RWD Molenbeek, da Bélgica. O grupo passa por um processo de reestruturação, e o empresário se afastou do comando do time francês. Sua ideia é separar o clube carioca de seus outros empreendimentos.
“Não podemos limitar a análise a dinheiro, porque há evoluções importantes na gestão comercial e de atletas, mas é inegável que um modelo complexo de relacionamento entre os clubes da Eagle favoreceu o processo, com atletas transitando entre clubes, assim como o dinheiro”, analisa Grafietti.
Existe, para o especialista, uma diferença importante entre a origem de investimento de Flamengo e Palmeiras em comparação com a do Botafogo.
“Enquanto Flamengo e Palmeiras cresceram de forma paulatina e sustentável, o Botafogo é fruto de uma gestão que se beneficiava da falta de regulamentação no Brasil e da tentativa de forçar as regras de outros países, especialmente a França com o Lyon. Agora, com restrições, será importante entender como se comportará a equipe”, diz.
“As instituições que fazem um planejamento a longo prazo e o seguem à risca, com certeza terão sucesso comprovado. Não importa se é associação, clube empresa ou SAF, o princípio básico de qualquer negócio é gastar menos do que arrecada, se os clubes começassem por esse ponto já seria um ponto simples que valeria muito”, aponta Renê Salviano, especialista em gestão esportiva.