Apesar do crime ter acontecido no fim de semana, só agora elas resolveram falar. Na madrugada de domingo, Vanessa já havia desabafado em seu perfil no Facebook e afirmado que não faria registro na polícia.
“Não vou porque eles também não se importam. Não vou fazer exame de corpo de delito, nem na delegacia, nem no médico. Eles estão do outro lado, amigos. Ontem à noite eu me senti minoria. E que ninguém além dos meus pode ser comigo. Nós estamos sós. Não dói”, havia escrito a jovem. A mensagem teve mais de 800 compartilhamentos e o caso ganhou repercussão entre os internautas.
No início desta semana, no entanto, o casal procurou o Centro de Cidadania LGBT, do programa Rio Sem Homofobia, onde recebeu atendimento jurídico e psicológico. O advogado que as atendeu orientou que fizessem a denúncia. Um registro de ocorrência foi feito no próprio Centro e será encaminhado para a Polícia Civil.
Ainda em casa por conta dos machucados, Vanessa conta que agora, mais que a dor, ficou a mágoa. Além de não haver policiamento na Rua Luis de Camões, atrás do Teatro João Cateano, onde aconteceu a agressão, ela conta que as pessoas em volta assistiram ao ataque sem manifestar ajuda.
– Tinham muitas, muitas pessoas perto. O lugar era iluminado, tinha música, etc. O segurança do teatro estava por perto. A Leide perguntou pra ele como ele não fez nada e ele respondeu apenas "não tenho nada com isso. Trabalho para o teatro”. Não sei o que foi pior, as pancadas ou o descaso nítido. As pessoas não se importam.
Apenas um homem tentou ajudar Vanessa, impedindo que os agressores continuassem a espancá-la. Um deles correu e o outro ainda parou para roubar o celular da jovem. Uma senhora, ao ver a cena, também teria gritado por socorro, mas não teve sucesso.
– Você e sua namorada chegam totalmente agredidas e humilhadas em casa e acham mesmo que não existe violência ou machismo. Estava com muita raiva, nem doía nada na hora – contou.
“É a ponta do iceberg”
O coordenador do programa Rio Sem Homofobia, Cláudio Nascimento, conta que o caso das jovens, infelizmente, é mais um entre tantos que ocorrem constantemente. Apenas este ano, ele cita um ativista assassinado em São Gonçalo e agressões a homossexuais no Aterro do Flamengo como outros exemplos da violência diária sofrida por gays, lésbicas, travestis e transexuais.
– Ano passado, tivemos pelo menos 20 homicídios por motivo homofóbico no Rio. Há uma preocupação nossa com o aumento da violência contra a população LGBT. Por mais que tenha avançado o debate, tem havido também uma onda fundamentalista e religiosa, que insiste em invocar valores de rejeição, preconceito e agressão. É um momento de alerta – afirmou.
– Quarenta por cento das pessoas que procuraram os serviços do Rio Sem Homofobia em 2012 foram por denúncias de discriminação. Dá pra ter uma dimensão de como essa violência permanece em patamares muito altos. Esses dados são a ponta do iceberg. Precisaos trabalhar, além da segurança pública, também o respeito. Sinto que há ainda uma banalização desse tipo de crime. É fundamental que todo mundo reaja. A atitude do cidadão que ajudou a Vanessa fez a diferença. Elas poderiam estar mortas – alerta Nascimento.
Quem precisar de ajuda do Rio Sem Homofobia, pode entrar em contato com o Disque Cidadania LGBT, no telefone 0800-0234567. O serviço é 24 horas e os atendentes são treinados para realizar a orientação. É possível ainda buscar ajuda nos quatro Centros de Cidadania LGBT existentes no estado, na Central do Brasil, no Rio; em Niterói, em Duque de Caxias e em Nova Friburgo.
Este ano, mais cinco centros devem ser inaugurados no estado, em Nova Iguaçu, Queimados, Macaé, Volta Redonda e Cabo Frio. No Carnaval, os centros vão funcionar todos os dias, de 28 de fevereiro a 9 de março, entre 9h e 18h. Haverá ainda policiamento especial em áreas onde haverá blocos e festas gays, além de campanha informativa para conscientização e prevenção à violência.
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