O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve concluir nas próximas semanas a negociação para reajustar os salários de servidores federais até abril de 2023.
O aumento pode ser de até 9%, mas o valor final ainda depende de uma decisão sobre ajustar ou não o auxílio-alimentação -medida que beneficia mais os servidores com menor remuneração.
Em qualquer cenário, porém, o percentual ficará abaixo dos 35% calculados por parte das categorias como o necessário para compensar a defasagem acumulada na gestão de Jair Bolsonaro (PL), que condicionou mais gastos sociais na pandemia à contenção de despesas com o funcionalismo.
Em sua primeira entrevista no cargo, a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, reconhece que dificilmente o governo conseguirá repor todo esse impacto. "Os servidores merecem algum reajuste, mas dificilmente será para compensar toda essa perda", afirma à reportagem.
Qualquer combinação de medidas terá de caber na verba de R$ 11,2 bilhões já prevista no Orçamento deste ano. Para a ministra, a discussão também precisará observar a necessidade de novas contratações, após os gastos caírem para o menor patamar em 26 anos no governo Bolsonaro.
Dweck também defende uma reforma administrativa que promova a adequação dos instrumentos de seleção, progressão e avaliação de servidores, mas é taxativa sobre a manutenção da estabilidade do funcionalismo. Ela afirma que o teto remuneratório precisa ser respeitado e que o governo vai avaliar se é preciso adotar alguma norma adicional para impedir ganhos acima do limite.
"A lógica é que todo mundo estivesse [ganhando] dentro do teto. Se alguém não está, tem alguma coisa errada na regulamentação dessa lei", diz.
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PERGUNTA – O governo reabriu a mesa de negociação com servidores. As carreiras vão ter um reajuste ainda este ano? Vai ter reajuste escalonado para os próximos anos?
ESTHER DWECK – Em primeiro lugar, para 2023 existe já um orçamento definido, que é R$ 11,2 bilhões, e esse valor será utilizado. É o que está no Orçamento e está mantido.
Tem dois valores lá, os R$ 11,2 bilhões é o que pode ser gasto neste ano. E pode ter um valor anualizado de até R$ 16 bilhões -ou seja, o impacto que ele gera para o ano seguinte.
P – Esse impacto máximo de R$ 16 bilhões dá um reajuste de quanto?
ED – Dá em torno de 9%.
P – Seria com um reajuste linear para todas as carreiras do Executivo?
ED – Seria para todas as carreiras do Executivo. Até a entrega do Orçamento de 2024, a gente está pensando em fazer uma discussão mais ampla para os próximos anos. Ainda não tem uma diretriz clara, se será só para 2024, se será plurianual. Estamos mais focados na emergência de 2023. Depois, precisa definir a nova regra [fiscal], definir qual vai ser o espaço fiscal que existirá para isso.
P – Carreiras da base do funcionalismo estão com o salário congelado desde 2017, enquanto carreiras de Estado tiveram o último reajuste em 2019. Pode haver alguma diferenciação para compensar?
ED – Estamos avaliando. É mais possível que a gente faça alguma coisa mais linear em 2023. Uma questão importante que a gente está avaliando para 2023 é o reajuste de benefícios, principalmente alimentação, porque há uma defasagem gigantesca entre o Executivo e os demais Poderes [o valor do auxílio do Executivo é R$ 458 mensais, enquanto o do Judiciário foi reajustado neste ano para R$ 1.182,74]. Isso é um valor que acaba beneficiando mais as carreiras baixas. Ainda não tem uma decisão, mas talvez fosse uma maneira de compensar os salários mais baixos.
P – Até quando se prevê mandar um projeto de lei? Tem possibilidade de ser feito por medida provisória?
ED – Existe a possibilidade, aconteceu em outros anos, e a gente está avaliando para poder acelerar o impacto [para os servidores]. Mas isso é uma decisão da Casa Civil com o presidente da República. Se a gente está com um bom relacionamento com o Congresso, um projeto de lei também pode ser aprovado de forma célere.
P – Tem uma data como objetivo?
ED – A gente queria tentar fechar essa proposta até o final de fevereiro, início de março. Vamos ver se a oferta para os servidores vai ser aceita.
P – O reajuste de 9% seria o máximo possível neste ano?
ED – Vai depender do mês [de aplicação]. Se for desde março, acho que não dá. Teria que ser um pouco mais para frente, para dar os 9% [de reajuste] dentro dos R$ 11,2 bilhões [previstos para 2023]. Não tenho certeza absoluta, acho que seria abril, mas de novo, é [preciso] uma avaliação, se só [contempla servidor] civil ou não.
P – Então em fevereiro e março seria concluir o acordo e anunciar.
ED – Isso, exatamente. E, eventualmente, definir: vai ser projeto de lei, vai ser medida provisória para acelerar a aplicação. Para começar a valer em março ou em abril.
P – Parte dos servidores tem uma demanda bem forte em termos percentuais pela falta de reajuste nos últimos anos [a defasagem para algumas carreiras é de 35%]. É possível repor tudo isso ou parte vai ficar para trás?
ED – É muito difícil repor todo o passivo. É mais um dos passivos que ficaram do governo anterior. Os servidores merecem algum reajuste, mas dificilmente será para compensar toda essa perda. Estamos olhando mais para frente e pensando em fazer uma coisa que seja combinada com a necessidade de contratação. Não adianta forçar, repor todo o salário, e não conseguir contratar ninguém. As carreiras estão defasadas. A partir de 2017, o saldo [de contratações] passa a ser negativo todos os anos. Isso comprometeu muitas áreas, então é mais importante olhar o todo.